Brasil não pode perder bons aproveitamentos energéticos, afirma Delcídio

“Não podemos perder o valor que a água
detém em projetos de hidroeletricidade
para garantir a segurança energética do
País”

O senador Delcídio do Amaral (PT-MS) fez um alerta hoje, para especialistas do setor elétrico e também ao secretário executivo do Ministério de Minas e Energia, Márcio Zimmermann, durante audiência pública conjunta das comissões de Infraestrutura e de Meio Ambiente, Fiscalização e Controle, CI e CMA, respectivamente, para a preocupação existente de o Brasil perder bons aproveitamentos energéticos ao adotar critérios de construção de novas usinas hidrelétricas somente a fio d´água (onde não há reservatórios) em detrimento às usinas com reservatórios capazes de regular a oferta de geração de energia e ainda contribuir para evitar a estiagem em determinadas regiões. “Não podemos perder o valor que a água detém em projetos de hidroeletricidade para garantir a segurança energética do País. O Senado está discutindo isso e esse tema avançou bastante na subcomissão que acompanha a construção da usina de Belo Monte”, afirmou.

A pressão nos últimos anos de algumas organizações não-governamentais contra os reservatórios, nas proximidades ou não das usinas, deram como resultado a opção por construir usinas a fio d´água, onde o represamento e o reservatório em si tem dimensões mínimas. Diante disso, para garantir a geração contínua de energia, deve-se construir termelétricas para garantir o fornecimento energético. “Quando se faz uma usina a fio d’água temos de ter usinas termelétricas como complemento, colocando na discussão da matriz energética as termelétricas a gás, flexíveis, que podem baratear o preço do gás, as nucleares, as eólicas, os painéis solares e termelétricas a carvão”, observou.

Segundo Delcídio, boa parte da energia produzida no mundo, em torno de 50%, vem das termelétricas a carvão mineral e o governo deve fazer um leilão específico para essa fonte de energia.

Jirau e Santo Antonio

A respeito de algumas reportagens sobre um eventual erro técnico que existiria no processo de interligação das usinas de Jirau e Santo Antônio, em Rondônia, Delcídio enfatizou que a notícia é um factoide. “Na verdade, quando o governo fez o leilão dessas usinas, os ganhadores assumiram a responsabilidade de calibrar e definir seus sistemas de proteção, seu sequencial de eventos dentro da lógica do sistema interligado. Nunca vi na história que uma turbina queimou como foi dito nas matérias”, disse ele.

O próprio secretário executivo do Ministério de Minas e Energia, Márcio Zimmermann, achou estranhas as matérias com uma conotação de denúncia de erro no projeto, principalmente porque os editais de licitação estabeleciam as responsabilidades e metas a serem cumpridas pelas empresas vencedoras. Na prática, disse ele, a empresa na execução das obras tem a liberdade de estabelecer quais equipamentos vai utilizar, seguindo o que está nos editais. Como Delcídio, Zimmermann afirmou nunca ter ouvido falar na possibilidade de uma turbina queimar, até porque numa usina hidrelétrica ela fica dentro da água. 

Manaus Energia

Delcídio criticou a estratégia da Manaus Energia que não se preparou para receber a energia despachada de Tucuruí até a capital do Amazonas. “O Governo Federal fez um esforço gigantesco para levar energia de Tucuruí até Manaus, tendo a possibilidade de parar o parque termelétrico que onera o consumidor, e agora não pode despachar a energia porque a subtransmissão não estava preparada para isso por causa da Manaus Energia. E isso não pode ocorrer em Macapá (AP)”, afirmou.

Na opinião do senador, o atraso da empresa foi prejudicial, porque quando a linha de transmissão começou a funcionar o sistema elétrico de Manaus deveria estar preparado. “O Brasil perde com isso. Você tem energia, usa apenas 100 megawatts e o restante vem de termelétrica, onde a energia gerada é mais cara. Isso foi uma bobeada tremenda e ficou claro que o sistema Manaus não acompanhou a construção da linha de transmissão, que foi um desafio maior. Em alguns pontos, as torres de transmissão têm mais de 290 metros de altura e estão acima das copas das árvores”, disse Delcídio.

Audiência

usina

A pressão contra os reservatórios, nas
proximidades ou não das usinas, deram
como resultado a opção por construir usinas
a fio d´água, onde o represamento e o
reservatório em si tem dimensões mínimas

Além da presença do secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia (MME), Márcio Zimmermann,  participaram da audiência pública para discutir as usinas hidrelétricas a fio d´água o ex-ministro de Minas e Energia, o professor da Universidade do Paraná, Francisco Gomide, o presidente do Ibama, Volney Zanardi Júnior e o professor da Unicamp, Sérgio Bajay, todos formuladores de planejamento energético.

O professor da Unicamp, Sérgio Bajay foi o primeiro expositor. Ele explicou que todas as usinas hidrelétricas têm reservatórios, mas no caso das usinas a fio d’água há um volume de água útil para geração e outro morto, onde as vazões são iguais à água que chega e a que sai. “Nas últimas duas décadas só foram construídas usinas a fio d’água. Os impactos ambientais são proporcionais à área alagada pelo reservatório. E como há forte oposição dentro do País, por ONGs estrangeiras, as empresas estatais criaram uma verdadeira cultura de só construírem hidrelétricas a fio d’água”, disse ele. O resultado é que se há impacto ambiental menor com uma usina deste tipo, ele aumenta por conta da necessidade de ter termelétricas.

Segundo Bajay, atualmente o maior potencial hidrelétrico remanescente no Brasil se localiza na região Amazônica, cuja topografia não é, em geral, favorável à construção de grandes reservatórios. “Mas como não se tem construído usinas com reservatório de regularização, o uso da energia das termelétricas resulta no aumento dos preços da energia, o que é ruim”, observou.

Ele defendeu o uso de reservatórios de regulação porque causam um efeito positivo, onde se calibra a geração de energia de acordo com o nível do reservatório. Em algumas cidades, o reservatório foi associado aos projetos, tendo uso múltiplo, para lazer, pesca, turismo, criando uma nova vocação econômica na região. Segundo Bajay, a usina no Rio São Francisco fez com que a área irrigada crescesse em 320 mil hectares, justamente no polígono da seca. “A usina de Furnas, por exemplo, proporcionou a realização de projetos de uso múltiplo nos reservatórios”, disse.

Bajay afirmou que a partir de agora as discussões para a expansão do sistema elétrico acrescentará fontes à matriz energética, como a usina de álcool e açúcar no País gerar energia a partir do bagaço de cana; termelétricas movidas a carvão mineral, as usinas nucleares, a geração fotovoltaica e a eólica. A utilização melhor dos resíduos urbanos, hoje mal aproveitados, podem ser usados na geração de energia.

O ex-ministro de Minas e Energia, o professor da Universidade Federal do Paraná, Francisco Gomide, disse que nos últimos 30, 40 anos a formação de um consenso sobre preservação ambiental  é dos processos mais importantes, mas surgiram grupos alarmistas contra obras e barragens que alegam causar sérios e intoleráveis impactos ambientais. Esse consenso e a pressão exercida, segundo ele, provocaram numa drástica redução de apoio financeiro a projetos, até mesmo do Banco Mundial, tendo por estratégia criminalizar os reservatórios das usinas. “Esses grupos colocam a hidroeletricidade como não sendo limpa e há pressões de entidades no mundo inteiro. Em decorrência disto, o Brasil é vítima”, afirmou.

Mas Francisco Gomide voltou um pouco na história e lembrou que na China, há quatro mil anos, a barragem para acumulação de água era sinônimo de poder e ordem política. “O lobby contra os reservatórios no Banco Mundial foi muito forte, e esses grupos lançaram campanhas publicitárias com os seguintes dizeres em inglês ‘renewables Yes, big hydro no’, ou seja, renováveis sim, grandes usinas não”.

Segundo Gomide, há mais de 75 mil barragens nos Estados Unidos, com idades acima de 50 anos. No mundo, a reserva de água fresca corresponde a 104.620 quilômetros cúbicos. “Qual seria motivação para a reação irracional contra barragens e reservatórios. Como atacar reservatórios sem criticar os reservatórios naturais. Como enxergar mais riscos ambientais em hidrelétricas do que em termelétricas? São duas negações, porque para fazer frente hidrelétrica há a termelétrica nuclear ou a carvão”, observou, acrescentando que graças a essa oposição irracional às usinas hidrelétricas com reservatórios e barragens que o século vinte terminou com 850 milhões de pessoas sem acesso adequado a água.

Já o presidente do Ibama, Volney Zanardi Júnior, a resposta para evitar os impactos ambientais de uma obra de grande porte ou de uma pequena central hidrelétrica (PCH) deve estar contida no planejamento inicial. “Contra o senso comum, dizem que uma PCH produz menos impacto ambiental, mas isso pode não ocorrer na prática”, comentou. Volney afirmou que as dimensões dos impactos ambientais causados e potencializados devem estar previstos no planejamento energético e não deixar os ajustes para a fase do licenciamento ambiental. “Hoje a grande dificuldade no licenciamento é tratar de coisas que deveriam estar previstas anteriormente, na fase do planejamento. Todas as opções terão impacto, quem vai sofrer e quem vai ter benefício. Essa discussão deve ser no planejamento e não no licenciamento”, salientou.

Para o secretário Zimmermann, a hidrelétrica é o caminho natural da matriz energética, onde o Brasil é uma referência. “No final de 2012 nós tínhamos 40 usinas paradas por causa do licenciamento ambiental. Hoje estamos  construindo dez hidrelétricas no Amazonas”, disse.

Zimmermann lembrou que na década de 1980, a Eletrobras tinha inventariado cerca de 260 negócios e apontava um elevado potencial de aproveitamento na região Amazônica. Em 2004 havia uma rejeição porque o conceito mundial dizia que só era renovável a energia produzida pelas PCHs, só que na Alemanha a exploração dessa matriz era de 100%, na França 80% e nos Estados Unidos, 60%. O Brasil tinha explorado só 20%. Em Altamira (Belo Monte) tinha uma rua com a representação de diversas ONGs internacionais contra a obra. “Por isso comemoro que a hidrelétrica é a solução do País e o Brasil comemora implantar Belo Monte, Jirau e Santo Antonio”, disse.

Marcello Antunes

Fotos: Agência Senado e Foto: Carla Dildey / Divulgação

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