Dilma confessa aos senadores: “Hoje eu só temo a morte da democracia”

Dilma confessa aos senadores: “Hoje eu só temo a morte da democracia”

A presidenta Dilma Rousseff amealhou a fama de “durona” ao longo de sua trajetória profissional e política. Mas nesta segunda-feira (29), na reabertura da sessão que julga seu processo de impeachment, a lembrança do sucesso da Copa do Mundo e das Olimpíadas no Brasil fizeram sua voz embargar. Dilma também se emocionou ao lembrar que esteve diante da morte por duas vezes — quando foi torturada, durante a ditadura, e quando enfrentou o câncer. 

“Vi companheiros e companheiras sendo violentados e até assassinados. Na época eu era muito jovem. Tinha muito a esperar da vida, tinha medo da morte e as sequelas da tortura no corpo e alma, mas resisti à tempestade de terror que costumava a me engolir na escuridão dos tempos que vivia”, disse. “Não mudei de lado apesar da injustiça sobre os ombros. Lutei pela democracia”, emendou. Também mencionou o medo, quando precisou enfrentar o câncer. “Hoje, eu só temo a morte da democracia” 

Os dois momentos de voz embargada ao longo de 40 minutos de pronunciamento traíram a emoção, mas não expressaram fraqueza. Objetiva, firme e decidida, Dilma enfrentou as primeiras perguntas dos partidários do impeachment com clareza e precisão. Bem ao estilo Dilma. “Não luto pelo meu mandato por vaidade ou apelo ao poder, como é próprio dos que não têm caráter. Luto pelo povo do meu país, pelo seu bem estar”, declarou. 

Dilma aproveitou para alertar sobre as ameaças que pairam sobre as conquistas sociais obtidas durante os últimos governos. Lembrou que Michel Temer tem uma agenda conservadora e pretende limitar os gastos com saúde e educação. Por vinte anos. “Se eu tivesse me acumpliciado com a improbidade e com o que há de pior na política brasileira, eu não correria o risco de ser condenada injustamente. Quem se acumplicia ao imoral e ao ilícito, não tem respeitabilidade para governar o Brasil”, disparou.

Dilma não recuou, deu nome aos bois. Olhando nos olhos dos que querem derrubá-la, chamou de golpe o que é golpe: o impeachment sem crime de responsabilidade. “Há que provar que tem crime. Se não há provas, é golpe”, respondeu, categórica, logo no primeiro ataque, da senadora Ana Amélia (PR-RS). E acrescentou: “Eu quero que a democracia saia ilesa desse processo”. 

Primeira a fazer questionamentos, a senadora e ex-ministra da Agricultura, Katia Abreu, disse que chamar os atrasos nos repasses do Plano Safra de “pedaladas” é cinismo é listou as realizações do governo na área do agronegócio. “A história vai contar aos brasileiros o que está ocorrendo agora”, destacou. 

Aos ataques do senador José Medeiros (PDT-MT) sobre os créditos suplementares, lembrou que a própria peça acusatória a exime de responsabilidade, ao dizer que o Ministério Público Federal diz que ela não participou das chamadas “pedaladas”. Aliás, lembrou a presidenta, há um erro na elaboração da acusação, já que afirma que o que a torna responsável pelas pedaladas era Arno Augustin. O problema é que Augustin sequer era Secretário do Tesouro em 2015, recordou a presidenta. E é por atos supostamente cometidos em 2015 que ela está respondendo ao processo de impeachment. 

Simulacro de júri 

“O que estamos vivendo aqui é um simulacro de júri”, lamentou o senador Roberto Requião (PMDB-PR). Dizendo-se constrangido por participar de um julgamento que não era da presidenta, mas sim, da democracia, destacou que Dilma não cometeu qualquer crime capaz de justificar o impeachment.  O “crime” de que está sendo acusada, na verdade, é ferir os interesses do poder econômico e do capital especulativos. 

Os adversários do governo Dilma seguiram com o discurso que pretende condenar a presidenta pelo “conjunto da obra”, o que não é previsto nem permitido pela Constituição.  A presidenta lembrou a crise de 2008, que foi a maior já vivida pelo mundo desde o crack da Bolsa de Valores americana, em 1929. “Nós não inventamos a crise, ela vinha aí e nós evitamos a chegada dela com mais força, disse. 

Sobre os créditos suplementares que, segundo o relator da peça acusatória, Antônio Anastasia (PSDB-MG) seriam vedados, Dilma explicou, didática: “A Constituição proíbe e diz: “Lei vai prever a abertura.” A lei previu a abertura, e não é uma lei que transcorre anos, é uma lei anual. A cada ano ela é feita e é reiterada a autorização”. Sendo assim, foi aberto o crédito suplementar por decreto porque a Lei Orçamentária Anual assim autorizou, prosseguiu. 

Quando o tucano Aloysio Nunes (SP) insistiu em querer saber por que a presidenta se refere ao processo de impeachment como “golpe”, ela foi enfática. “O que eu estou dizendo, Senador, é que, se me julgarem sem crime de responsabilidade, é golpe. Eu não estou dizendo que é golpe agora. A hora que julgarem e condenarem uma Presidente inocente, sem crime de responsabilidade, é um rotundo golpe; é um golpe integral. Eu não recorro ao Supremo Tribunal Federal agora, porque não esgotei essa instância, não acabei de tratar o problema aqui”. 

Pelas regras estabelecidas para o julgamento, o senador que faz a pergunta tem cinco minutos. A presidenta pode falar pelo tempo que julgar necessário. A palavra só volta ao senador se o presidente da sessão, ministro Ricardo Lewandowski, entender que houve alguma ofensa direta. 

Giselle Chassot 

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