Entrega de honraria se torna palco de luta e resistência contra retrocessos de Temer

Entrega de honraria se torna palco de luta e resistência contra retrocessos de Temer

Foto: Agência SenadoRafael Noronha

24 de novembro de 2016 | 14h45 

Após 388 anos de escravidão, sofrimento e tortura e apenas 128 anos de abolição, no século 21, após um curto período de superação das desigualdades de 516 anos de Brasil, o Pais se deparou, após o golpe implementado contra a presidenta democraticamente eleita Dilma Rousseff, com um sistema oligárquico, conservador, patriarcal, machista e discriminatório, que oprime a população negra.

Contra a maior ameaça de retrocessos nas políticas sociais desde o período ditatorial, promovida pela gestão Temer, a palavra de ordem na entrega da comenda Abdias Nascimento foi: “Resistência”. Resistência contra as medidas que ameaçam todas as conquistas obtidas pelo povo negro na busca da redução das desigualdades.

Além da celebração pela entrega da maior honraria concedida pelo Poder Legislativo brasileiro àqueles que se destacaram na promoção da cultura afro-brasileira, o plenário do Senado, nesta quinta-feira (24), durante a entrega da comenda Abdias Nascimento, serviu para dar voz aos que sofrem diariamente com o alto número de jovens negros assassinados, a redução da importância da pasta responsável pelas políticas de promoção da igualdade racial e a PEC da Maldade, que ameaça reduzir a praticamente zero os investimentos em políticas afirmativas por parte do Executivo.  

Marivaldo de Castro Pereira, secretário Executivo de Assuntos Legislativos e de reforma do Judiciário do Ministério da Justiça – de 2014 a 2016 – lamentou que, no momento difícil que o País atravessa, os poucos espaços que haviam sido conquistados pela população negra nos últimos anos comecem a se fechar. Por isso, destaca, a entrega da comenda se tornou ainda mais importante por ser um dos poucos espaços que ainda permitem o debate das questões que afligem os negros do País.

“Hoje, no Executivo, nossa sub-representação talvez seja uma das maiores pós- período autoritário. Talvez, no período democrático, a população negra nunca tenha estado tão mal representada no Executivo como hoje”, disse.

A senadora Lídice da Mata (PSB-BA) disse que o movimento negro, como todos os outros movimentos sociais do País, vem sofrendo com as circunstâncias desfavoráveis da situação política e a mudança de curso traumático do governo brasileiro. Outro ponto de preocupação da senadora é a forma com que as manifestações de intolerância têm se alastrado, principalmente, em relação às religiões de matriz africana e seus adeptos.

“É impossível discutir-se um movimento popular neste momento sem levar em conta que houve uma ruptura de acordos, de programas, de políticas que estavam sendo desenvolvidas por um governo que foi eleito e que pactuou essas políticas públicas com a sociedade brasileira e com o movimento negro, que, neste momento, sofre um revés nessas conquistas; um revés que, às vezes, me assusta”, disse.

Jackeline Silva, representante do Instituto de Mulheres Negras de Mato Grosso (Imune-MT), agraciada pela comenda, também lamentou o momento político que o País atravessa em que emendas à Constituição – como a PEC da Maldade – são feitas em gabinetes, sem consulta popular e que segundo ela, são “atos injustificáveis, que atentam contra a Constituição Federal”.

“Em apenas três meses sofremos vários retrocessos, como a eliminação das instâncias responsáveis pelas políticas públicas de gênero, igualdade racial e direitos humanos. Tais fatos constituem ameaça a uma população que já se encontra desfavorecida social e economicamente”, lamentou.

Cida Abreu, presidenta da Fundação Palmares, afirmou que a PEC da Maldade representa e materializa sintomas de intolerância no momento em que ela incide no estrangulamento de políticas públicas afirmativas. “A PEC é uma organização de pensamento hierárquico, conservador a essas vitórias, a essas organizações, a essas pessoas negras e maioria do nosso País”, criticou.

A senadora Regina Sousa (PT-PI), que disse ter sido alvo de mais atos racistas após ter assumido o mandato, informou durante a sessão que a Comissão Mista de Orçamento (CMO) alterou a proposta orçamentária para o próximo ano, já prevendo a aprovação da PEC da Maldade. “Já disseram [os governistas] que o SUS não cabe no orçamento. Imagine se vai caber a organização de uma conferência nacional da população negra”, indagou.

Já o senador Paulo Paim (PT-RS), que presidiu a sessão, disse que além da celebração da Consciência Negra, o dia 20 de novembro deve ser lembrado por toda a sociedade brasileira. “A consciência negra tem como preceito básico a liberdade, que por sua vez tem o pré-requisito: políticas de igualdade. Liberdade e igualdade são os ideais da força predominante da trajetória do grande Zumbi. O maior líder de todos os tempos na história desse País”, destacou.

 

MULTIMÍDIA

Assista trecho da apresentação de Lazzo Matumbi:

Assista ao depoimento emocionado de Débora Maria da Silva, que teve o filho assassinado:

 

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