Fátima defende novo currículo, diálogo e menos repressão na reforma do ensino

Fátima defende novo currículo, diálogo e menos repressão na reforma do ensino

Fátima: é nossa obrigação reagir ao pedido de socorro dos estudantes que ocupam as escolas, não com repressão da polícia, mas com atualização dos currículos, que não preparam o aluno para a vida nem para o mercado de trabalho
Em artigo publicado no O Globo desta segunda-feira (26), sobre o congelamento que a PEC 247 pretende impor ao Brasil para os próximos 20 anos, a senadora Fátima Bezerra (PT-RN) contrapõe-se à opinião do jornal, que é favorável à PEC.
Vários dos argumentos utilizados pelo jornal sequer são citados pela senadora em seu artigo. No texto, Sem mágicas, ela defende a reforma do ensino médio – que é de responsabilidade dos governos estaduais, e não da União -, baseando-se, entre outros elementos, no êxito do programa de ensino técnico dos governos Lula e Dilma, hoje entre os mais procurados por jovens e adolescentes, e da necessidade da reforma ter sido precedida de amplo debate com a sociedade – e não por meio de medida provisória..

Leia o artigo da senadora, na íntegra:

Sem mágicas– Fátima Bezerra

Os dados do Ideb 2015 merecem mais atenção — e ação —, para que o levantamento tenha real serventia. Os números do levantamento mostram que, ao mesmo tempo em que o ensino fundamental vai bem, inclusive com superação de metas, o ensino médio está estagnado desde 2011.

Essas projeções cruzadas — de um lado, progresso; de outro, estagnação — mostram, em primeiro lugar, que a parceria entre União e municípios deu certo, principalmente por causa da complementação dos programas federais de inclusão social, em particular o Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa.

Em contrapartida, não avançamos no ensino médio, uma obrigação constitucional dos governos estaduais. A má qualidade do serviço prestado não precisaria do Ideb para ser constatada. Há pelo menos dois anos, adolescentes e jovens vêm ocupando escolas de todo o país nos alertando que o ensino médio faliu, seja na escola pública, seja na particular.

A necessidade de mudanças estruturais é gritante. Nossos jovens querem que as escolas secundárias entrem finalmente no século XXI, cobrando ação dos responsáveis, da classe política à sociedade, dos profissionais de educação às famílias. Eles pedem de todos nós o fim da paralisia, da desmotivação, da escassez de recursos, da falta de futuro que as escolas hoje lhes dão.

 

Eles estão certos: passou da hora para que novas práticas e novas metodologias sejam incorporadas aos currículos. É nossa obrigação reagir ao pedido de socorro, não com repressão da polícia, mas com atualização dos currículos, que não preparam o aluno para a vida nem para o mercado de trabalho. Para isso, o Congresso tem de garantir incentivos reais e não supressão de recursos. Os resultados do ensino básico, no entanto, mostram que não há necessidade de fórmulas mágicas para tirar o ensino médio da estagnação. Basta que sejam cumpridas as metas do novo Plano Nacional de Educação (PNE), reformular os currículos e dar condições dignas de trabalho e possibilidade de aperfeiçoamento na carreira aos professores, instituir escolas em tempo integral e estabelecer diálogo permanente entre todos os profissionais da educação com a comunidade e os estudantes. Tratar desse assunto com medida provisória, como fez o governo, é inadmissível.

O melhor exemplo disso é a revolução pela qual passou o ensino técnico nos últimos 13 anos, período em que o número de escolas saltou de 144 para mais de 600. Essas escolas vêm combinando um currículo que privilegia a formação da cidadania e o preparo para o mercado de trabalho. Deu certo: hoje elas são as instituições mais procuradas pelos jovens.

É preciso, principalmente, resistir às tentativas de cortes de recursos que ameaçam a concretização dessas mudanças, como a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241, que limita os gastos da União, esquecendo-se do essencial: educação não é gasto, é investimento.

 

Agora, veja a opinião do jornal: 

Ideia distorcida

 

 

Setores refratários a políticas realistas de investimentos públicos usam argumentos de forma deliberadamente distorcida para atribuir à destinação orçamentária de verba para a Educação, supostamente insatisfatória, o peso de uma das causas determinantes dos graves problemas dessa área no Brasil. Esse tipo de visão, que se fecha para aspectos como a otimização de recursos, gerenciamento e programas de metas, está na base do pensamento do lulopetismo — que fez, a partir de 2006, uma opção pela gastança irresponsável, da qual resultou uma das mais graves crises econômicas do país. Seus reflexos são bem visíveis.

 

Dois novos aspectos, distintos em si, mas parte de uma mesma crise, se juntam na atual conjuntura para ecoar esse discurso. A necessidade de uma correção de rota, via ajuste fiscal, com o qual o governo Temer se comprometeu, para colocar nos eixos a economia, e os decepcionantes resultados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, Ideb, de 2015 são o pano de fundo para mais investidas como essa, desconectadas da realidade.

 

Em relação aos efeitos do ajuste fiscal na Educação — e no setor público como um todo —, cujas linhas já foram anunciadas pelo governo, o lulopetismo e parceiros atacam-no a partir de uma premissa falsa. Não é verdade que o Planalto tenha se comprometido a cortar verbas para o setor ou qualquer outro. A proposta de reajustar a dotação orçamentária pela variação da inflação do exercício anterior não visa a secar o caixa de programas e instituições educacionais, mas a adequá-lo à realidade econômica do país.

De qualquer forma, os pífios indicadores decorrentes do modelo vigente sinalizam que, por si só, o inchaço orçamentário não resolve a questão de o Brasil não ter uma educação de qualidade. O Ideb do ano passado é um termômetro inequívoco. Por um lado, os números mostram uma preocupante estagnação do ensino médio em todo o país. Ao mesmo tempo, traz à luz exemplos de escolas de regiões mais modestas, que, com orçamento baixíssimo, obtiveram desempenho excelente. Fruto evidente de investimentos em gestão, comprometimento de professores e comunidade escolar com uma proposta de trabalho definida, cobrança de metas, envolvimento das famílias etc. São exemplos de que um bom gerenciamento leva a resultados positivos.

 

Também é falso que o país investe pouco em Educação. Pesquisa da OCDE, o grupo de nações mais desenvolvidas, mostra que o Brasil tem o maior crescimento proporcional em investimento na educação pública entre mais de 30 países. O negativo contraponto do Ideb só reforça a ideia de que abrir os canais de irrigação orçamentária não é tão determinante quanto atacar as reais causas da má formação dos estudantes, especialmente no ensino médio — questão que o governo Temer começa a enfrentar com as reformas da MP baixada na quinta-feira.

 

O ajuste fiscal é uma necessidade imperiosa do país, portanto irrecorrível. Por sua vez, o colapso educacional é uma outra ponta, distinta, das demandas do Brasil. Ele precisa ser equacionado dentro dos marcos da realidade.

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