Ministro reafirma importância do multilateralismo das relações comerciais

Ministro reafirma importância do multilateralismo das relações comerciais

Ministro Mauro Vieira: “O Brasil é um ator global, negocia globalmente e precisa ter uma inserção ampla no mundo. Não pode se circunscrever a esse ou aquele bloco de parceiros”O Acordo Transpacífico de Associação Econômica (TPP) e o processo eleitoral na Venezuela foram os temas da audiência pública, desta terça-feira (24), na Comissão de Relações Exteriores (CRE). O colegiado ouviu — pela quarta vez, este ano — o ministro das Relações Exteriores Mauro Vieira, que defendeu a opção brasileira pelo multilateralismo e pela construção de regras globais no âmbito da Organização Mundial do Comércio.

O ministro explicou que o Acordo Transpacífico — tratado pelos senadores oposicionistas como a nova panaceia das relações comerciais internacionais —sequer está em vigor. Essa articulação entre Austrália, Brunei, Chile, Cingapura, Estados Unidos, Japão, Nova Zelândia e Peru concluiu recentemente sua 23ª e derradeira rodada técnica e ainda vai passar por ajustes políticos (já houve 19 rodadas neste âmbito) para que possa ser finalmente firmada e submetida à aprovação do Congresso americano, entre outras instâncias.

“O Brasil não faz parte da Bacia do Pacífico e não foi convidado a integrar esse acordo, que, aliás, foi negociado sempre a portas fechadas”, apontou Vieira.  Para ele, o TPP consagra a tendência assumida pelos EUA de se afastarem do multilateralismo que esse mesmo país estimulou e construiu a partir do final da II Guerra Mundial, mas alertou que a adoção de postura similar não é uma alternativa interessante para o Brasil.

“Nosso país não pode depender de um único mercado ou de uma única região. Precisamos buscar uma inserção global, multilateral”, afirmou o chanceler, para quem o País acerta em investir na construção de regras globais no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC), regras que valem para um universo de 150 países. “As questões que nos interessam, como a dos subsídios agrícolas, são defendidas e negociadas na OMC”, lembrou Vieira.

É na OMC que o País tem as condições de ajudar a criar os mecanismos internacionais de comércio que favorecem os interesses brasileiros, uma rede em que haja pleno conhecimento das normas e transparência em sua aplicação. “O Brasil é um ator global, negocia globalmente e precisa ter uma inserção ampla no mundo. Não pode se circunscrever a esse ou aquele bloco de parceiros”.

Os senadores oposicionistas que integram a CRE têm insistido na tese de uma suposta “falência do Mercosul” e que a aliança sul-americana privaria o Brasil de acordos “mais vantajosos”, como o Acordo Transpacífico. Vieira rebateu essa tese. “Para nós, é fundamental contar regras claras, que visam a reger as relações comerciais entre 150 países, não apenas os 12 da chamada Aliança Transpacífica. Sem regras claras, precisas e oriundas de um consenso internacional, o que teremos são as guerras comerciais”, alertou o ministro.

É a diferença entre a inserção autônoma e plural e a subordinação, na qual os países em desenvolvimento não conseguirão defender seus próprios interesses, mas apenas os interesses dos mais fortes. Vieira lembrou que a defesa do multilateralismo e a integração sul-americana, tão criticadas pela oposição, são princípios constitucionais. “Precisamos estar presente em todos os fóruns, nas diversas áreas”. O País não recusa, a priori, os acordos regionais e plurilaterais, mas esses acordos precisam ser compatíveis com as regras da OMC. “Fizemos a escolha correta, que é a valorização da OMC”, resumiu o ministro. “Parece-me sempre mais acertado defender nossos próprios interesses que os interesses dos mais fortes. Um país que não se impõe pela força das armas precisa buscar o diálogo com o número mais amplo de parceiros”.

Um dos pontos centrais em debate na OMC interessa diretamente — e muito — ao Brasil: os subsídios agrícolas, por meio dos quais muitos países, entre eles grandes economias, buscam tornar artificialmente competitiva sua produção, tanto para o mercado interno quanto para exportação. “Reduzir esse tipo de protecionismo é estratégico para nós”, afirmou o ministro. O Brasil é atualmente o segundo maior exportador de alimentos do planeta e tem na agricultura um pilar essencial a sua economia.

Esse tema está em negociação há 14 anos, na chamada Rodada de Doha, uma série de encontros multilaterais no âmbito da OMC que tratam de desenvolvimento e comércio. A próxima etapa da Rodada de Doha transcorre no próximo mês (entre os dias 14 e 18), em Nairóbi, no Quênia. Os temas principais das conversações serão exatamente os subsídios agrícolas — regras que assegurem a competição nas exportações — e as normas especiais para países de menor desenvolvimento relativo.

Sobre a demora para a conclusão da Rodada de Doha — ou mesmo para a consolidação do Mercosul —, Vieira destacou que a criação da União Europeia exigiu 50 anos de tratativas. “Não podemos ceder a esse tipo de crítica, até porque nesse processo diversas posições brasileiras foram acatadas e estão se consolidando. A OMC foi criada em 1995, em substituição ao Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT), e atualmente é presidida pelo brasileiro Roberto Azevêdo.

Venezuela
O outro tema da audiência pública foram as próximas disputas legislativas na Venezuela, marcadas para dezembro, e o suposto veto à indicação do ex-ministro Nélson Jobim como observador brasileiro do processo eleitoral naquele país. Vieira explicou que não houve veto ao nome de Jobim para a direção política da missão da Unasul.

“Conversei com o ministro Jobim, não houve veto a ele. Até porque não estávamos no momento de definir a direção política”. O que ocorreu, relatou o chanceler, é que além do ex-ministro, indicado pelo Tribunal Superior Eleitoral do Brasil (TSE), outros nomes foram submetidos por outros países membros da Unasul. “Não sei de onde surgiu o boato de que teria havido veto”, afirmou o chanceler, destacando que esses boatos foram a razão para que Jobim retirasse seu nome da lista de candidatos à direção da missão da Unasul que acompanhará as eleições.

O presidente da CRE, Aloysio Nunes (PSDB-SP), que chegou a ir à Venezuela para “cobrar a marcação das eleições”, agora desacredita do processo em curso. “O Brasil e a Unasul podem estar legitimando uma farsa”, afirmou o tucano. Essa opinião, porém, não é compartilhada pelo principal líder oposicionista daquele país, Henrique Capriles, candidato detentor de quase 48% dos votos da última eleição presidencial venezuelana. Para Capriles, não há saída para a crise venezuelana que não passe pela realização do pleito de dezembro.

Cyntia Campos

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