NOTA

‘Palestra coercitiva’ é face autoritária do Ministério Público

MP coagiu ilegalmente milhares de pais em Dourados (MS) a assistirem uma palestra contra a discussão de identidade de gênero na escola
‘Palestra coercitiva’ é face autoritária do Ministério Público
A Bancada do PT no Senado Federal expressa seu espanto e sua indignação com a atitude do Ministério Público de Mato Grosso do Sul, particularmente do procurador Sérgio Fernando Harfouche, que coagiu ilegalmente milhares de pais em Dourados (MS) a assistirem uma palestra, dada pelo próprio procurador, contra a discussão de identidade de gênero na escola.
Os pais e mães receberam em suas casas a convocação obrigatória feita pela Promotoria de Justiça da Infância e Juventude, sob pena, para quem faltasse à reunião, de multa de 3 a 20 salários mínimos, além da acusação por crime de abandono intelectual de menor.
Assim, o procurador Harfouche inaugurou um novo tipo de palestra, a “palestra coercitiva”.
Evidentemente, não é papel do Ministério Público impor visão religiosa determinada a pais de alunos. O Brasil é uma república laica, desde a Constituição de 1891. Não vivemos mais na época do Império, quando Estado e Igreja se confundiam.
Lembramos que o art.19 da CF veda à União, aos Estados e os municípios “estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-las, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público”.
Recordamos, ainda, que o debate sobre identidade de gênero, que visa combater a discriminação, é política de Estado que encontra base em várias declarações e convenções internacionais, como a Declaração de Diretos do Homem da ONU, o Pacto de San José e, notadamente, a Convenção da Conferência Geral da UNESCO relativa à Luta contra a Discriminação no Campo do Ensino, todas introduzidas em nossa ordem jurídica interna com força de lei.
Assim sendo, a atitude autoritária e descabida do citado promotor é inconstitucional e ilegal. O Estado brasileiro não pode forçar cidadãos comuns a aceitarem valores religiosos específicos. A crença e a fé são liberdades fundamentais das pessoas. A laicidade do Estado é precondição para uma verdadeira democracia.
Não podemos aceitar passivamente atitudes autoritárias que fragilizem ainda mais a nossa combalida democracia, abatida pelo golpe e o Estado de exceção. A Bancada do PT no Senado exige uma investigação extensa sobre o episódio e a responsabilização do procurador Harfouche.
Brasília, 29 de maio de 2017
Gleisi Hoffmann, líder do PT no Senado
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