Punição mais severa ao vandalismo gera polêmica e adia votação

Senador Humberto citou efeitos do 11 de setembro nos EUA e recomendou mais tempo para reflexão e debates a fim de prevenir más decisões

Punição mais severa ao vandalismo gera polêmica e adia votação

Humberto lembrou que comoção pelo 11
de setembro resultou em supressão de 
direitos políticos e liberdades civis nos EUA

Ficou para a próxima semana a decisão da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) sobre o projeto que tipifica o crime de vandalismo durante manifestações públicas. O debate sobre o projeto de lei do Senado (PLS) 508/2013 prosseguirá na próxima quarta-feira, por sugestão do líder do PT, senador Humberto Costa (PE). A justificativa é de que o tema é polêmico e exige um debate cuidadoso e profundo. Humberto é contrário à proposta por considerar que o projeto criminaliza o legítimo direito da sociedade de protestar e de se manifestar publicamente.

O líder petista alertou para o risco de o Parlamento legislar em clima de comoção, lembrando as decisões de exceção tomadas nos Estados Unidos logo após os atentados de 11 de setembro de 2001, quando dispositivos legais voltados para o combate ao terrorismo resultaram, na prática, na supressão de direitos políticos e liberdades civis. “Corremos o risco de fazer algo semelhante, aprovando essa proposta sob o impacto da morte do cinegrafista Santiago Andrade, da TV Bandeirantes”, argumentou o líder do PT ao lembrar o profissional atingido por rojão durante manifestação no Rio de Janeiro, em fevereiro.

O PLS 508/2013, de autoria do senador Armando Monteiro (PTB-PE), endurece as punições a atos criminosos praticados durante manifestações públicas, estabelecendo penas que podem chegar aos 12 anos de prisão. “A liberdade política é um valor universal que precisa ser preservado. Apesar da boa intenção do projeto, não podemos abrir as portas para as tentações autoritárias”, apelou Humberto, defendendo a rejeição da matéria.

O senador Lindberg Farias (PT-RJ) também criticou duramente o projeto, por considerar o risco da criminalização do movimento social. Lindberg era o presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE) durante a mobilização pelo impeachment do ex-presidente Fernando Collor, em 1992. E subscreveu, juntamente com o senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), um voto em separado pela rejeição do PLS 508.

O senador representante do Rio de Janeiro lamentou que o mesmo parlamento que não conseguiu oferecer respostas às legítimas reivindicações da juventude durante as manifestações de junho de 2013 pretenda agora aprovar uma legislação que, na prática, pode intimidar os protestos de rua. “Não conseguimos aprovar nada referente à reforma política e vamos aprovar essa matéria?”, questionou.

Para Lindberg, a atual legislação já dá conta de punir eventuais excessos e crimes praticados no decorrer de uma manifestação popular. Os dois jovens acusados de acender e atirar o rojão que matou o cinegrafista Santiago, por exemplo, estão presos preventivamente e respondem por homicídio triplamente qualificado, sem que qualquer lei com viés de exceção tenha sido aprovada.

O senador fluminense também considerou um equívoco o forte agravamento das penas para danos ao patrimônio contido no PLS 508, que equivalem a punições 24 vezes maiores que as aplicadas atualmente à depredação de propriedade pública ou privada.

“O que temos que ter com os jovens manifestantes é diálogo. Para eles, está cada vez mais difícil ir às ruas protestar, pois já há legislações estaduais extremamente restritivas. O que precisamos é compreender suas reivindicações e buscar respostas para elas”, conclamou. Para Lindberg, aprovar uma lei como a proposta no PLS 508 às vésperas da Copa 2014 é uma “péssima sinalização”.

A senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), que também foi líder estudantil na juventude, discordou de Humberto Costa e Lindberg, seus colegas de bancada, e ponderou que ao coibir a violência nas manifestações, o PLS 508 pode contribuir para estimular a participação da sociedade nos protestos, já que muita gente deixou de comparecer às ruas por medo de atos de vandalismo.

Embora favorável à matéria, a parlamenter ponderou que o projeto tinha o defeito de não tratar de uma das formas de violência mais corriqueira nas manifestações, que são os abusos cometidos pelas polícias. Ela sugeriu ao relator, Pedro Taques, que considerasse tratar da questão em seu substitutivo.

Humberto Costa considera que o prazo de uma semana para a retomada dos debates sobre a matéria na CCJ será importante para os senadores refletirem sobre exemplos de más decisões tomadas em nome da democracia. “É importante que tenhamos clara a cultura política que queremos fortalecer e que sinalização queremos dar à sociedade. Há 50 anos, fomos privados da democracia por um golpe militar e reconquistamos a democracia com muito sacrifício”, concluiu.

Cyntia Campos

 

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