EUA mentem ao alegar terrorismo, diz Greenwald sobre espionagem

EUA mentem ao alegar terrorismo, diz Greenwald sobre espionagem

Jornalista do “The Guardian” diz que espionagem no Brasil tem interesse econômico

“Sem dúvida, o grande motivo dessa
espionagem é aumentar o poderio
econômico do governo norte-americano
e dar mais vantagem a eles”

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Espionagem ouviu, nesta quarta-feira (09), no Senado, o jornalista e advogado norte-americano Glenn Greenwald e o estudante brasileiro, David Miranda. O jornalista é o autor das reportagens publicadas no jornal britânico The Guardian que revelaram o esquema de espionagem internacional montado pela Agência Nacional de Segurança (NSA).

“Sem dúvida, o grande motivo dessa espionagem é aumentar o poderio econômico do governo norte-americano e dar mais vantagem a eles. Fizemos denúncias que mostram isso”, disse Greenwald sobre as revelações de que a Petrobras e o Ministério de Minas e Energia teriam sido alvo de espionagem. A presidenta Dilma Rousseff também foi vítima da “bisbilhotagem”.

Segundo ele, os EUA, Canadá e Inglaterra estão fazendo a mesma espionagem que a China faz. “A Inglaterra e os Estados Unidos mentem para seus cidadãos e para todo o mundo quando dizem que utilizam esse sistema para proteger seus cidadãos contra o terrorismo. Existe terrorista na OAS, Petrobras ou no Ministério de Minas e Energia? Eles agora vão dizer que existem terroristas nos ministérios da presidenta Dilma?”, indagou o jornalista.

Divulgação
Segundo Greenwald, ele faz uma análise criteriosa dos documentos que tem em mãos antes de torná-los públicos. Com o trabalho, explicou, é possível detectar as conexões e o modus operandi da NSA e de seus parceiros nos atos de espionagem.

“Estou fazendo um jornalismo de alto risco. Estou sendo ameaçado por pessoas do meu país. Mas, continuarei a fazer esse jornalismo até o último documento ser publicado. Sinto que tenho essa obrigação até com a minha fonte, que é o Edward Snowden. Não estou escondendo informações, não estou segurando documentos”, disse.

Documentos
Questionados pela oposição sobre a viabilidade de deixar os documentos entregues a eles para análise da CPI, Miranda foi enfático: “Se vocês quiserem ter todas essas informações necessárias, bastaria o Brasil dar asilo ao Edward Snowden”, disse referindo-se ao ex-funcionário da NSA, responsável pela denúncia.

Presente à audiência, o senador Eduardo Suplicy (PT-SP), lembrou que isto seria impossível pois poderia ser considerado criminoso pelas autoridades dos Estados Unidos. “Esse pedido é inviável. Não podemos entregar documentos do governo americano a cidadãos de outro país. Isso seria caracterizado como traição. Esses dados que temos não se referem apenas aos Estados Unidos, eles se referem a outros países também. Nesses documentos, não existem apenas informações sobre ações de espionagem. Existem também as formas como a NSA ataca algum alvo”, explicou David Miranda.

“Eles cumpriram com seu papel, que é algo muito relevante. Isso não significará o descumprimento dos deveres do Greenwald com sua legislação. Ao repassar esses dados ele acabaria praticando um crime”, completou Suplicy.

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“Eles cumpriram com seu papel, que é algo
muito relevante”

Detido por nove horas

Greenwald mora no Rio de Janeiro com seu companheiro David Miranda, que foi detido no aeroporto de Heathrow, em Londres, em 18 de agosto passado, quando embarcava para o Brasil.

Miranda relatou durante a audiência da CPI, que ficou sob custódia por nove horas seguidas e que as autoridades britânicas confiscaram seu aparelho celular e os equipamentos de informática. Após passar pelo interrogatório, que abordou temas como as manifestações no Brasil, o seu pensamento sobre a política brasileira e suas visões políticas como um todo, ele foi liberado sem que houvesse nenhum tipo de acusação.

Durante a audiência, o estudante brasileiro chegou a cobrar explicações do Ministério das Relações Exteriores. Segundo ele, o Itamaraty deve tomar alguma atitude para que nenhum brasileiro seja submetido ao mesmo constrangimento. “Fiquei um pouco decepcionado com a ação do Itamaraty. Apesar de rápida, não houve nenhuma ação efetiva do Brasil para impedir que isso ocorra com outros brasileiros em trânsito pela Inglaterra”, disse. “Para mim está muito claro que o governo britânico acreditava que o David portava documentos relacionados à espionagem”, acrescentou Greenwald.

Confira as principais falas de Glenn Greenwald durante a audiência:

EUA e Inglaterra
O público deve saber o que acontece com a privacidade delas. Tenho o objetivo de proteger a privacidade e os direitos humanos de todas as pessoas, em qualquer país. Para mim, essa é minha obrigação como jornalista.

Existe uma guerra contra o jornalismo e o processo de transparência. Estados Unidos e Inglaterra estão se movimentando para destruir qualquer informação sobre esse processo de espionagem. Eles estão fazendo esforços para destruir todos os nossos computadores.

O governo britânico ameaça os jornalistas envolvidos e que moram em solo inglês. Se um governo é sério na política de defesa de seus interesses e no interesse de seus cidadãos, deve proteger aquele que deu início a todo esse processo que é Edward Snowden.

Programa Olympia, do Canadá
Todas as informações que temos sobre esse programa, nós já publicamos. Talvez tenham mais com Snowden, mas ele não me passou. Por ora, não temos mais informações para divulgar sobre o programa.

Artigo meu publicado hoje no The Guardian mostra que existe um estreito relacionamento entre empresas especializadas na exploração de minerais e a agência de espionagem do Canadá. Esses documentos mostram uma ampla cooperação entre essas duas partes.

Petrobras
Fiz as reportagens por saber que são informações muito importantes para a população desse País. Todas as informações que conheço sobre espionagem na Petrobras e no MME já foram publicadas. Trabalho para divulgar informações importantes que possam abrir um leque maior de possibilidades de investigações, que possam incluir a Polícia Federal. Mas, reconheço que tenho limites para expor esses dados, até pelos riscos que estamos correndo ao divulgar essas denúncias.

O sistema de espionagem dos EUA  é o mais forte do mundo. É muito difícil se proteger desses ataques. A NSA não está brincando. Existe um motivo sério para estarem espionando a Petrobras. Eu não sei o motivo exato. Mas quem sabe é a NSA, o governo.

Gigantes da internet
Eles (Facebook, Google, Microsoft) negaram que a NSA tenha acesso indiscriminado aos dados de suas empresas. Porém, o problema é a legislação contra terror. As empresas não estão negando que a NSA tenha acesso a esses dados. Elas apenas dizem que dão acesso a essas informações somente quando permitidos pela legislação. E eu não conheço nenhum pedido de acesso a esses dados que tenha sido negado pela justiça norte-americana.

AT&T
Não sei dizer se a AT&T é uma empresa que facilita o acesso às informações que ela possui. O Brasil tem contratos de tecnologia com a AT&T e ela trabalha de forma muito próxima com a NSA. Mas não existem informações suficientes para afirmar se existe cooperação no trabalho de espionagem.

Países espionados e parceiros
Os Five Eyes trabalham de forma muito próxima com a NSA. Ainda existe um segundo grupo de países que são alvos de espionagem, mas também atuam em parcerias em ações específicas como são os casos da Armênia, França, Espanha e Itália. Outro grupo de países é apenas espionado. São eles o Brasil, Venezuela, Rússia e China.

Encaminhamentos
Ao final da reunião, o jornalista Glenn Greenwald se comprometeu com os senadores a fornecer o contato do advogado de Edward Snowden para que os senadores pudessem viabilizar uma teleconferência com o ex-agente da NSA. Além disso, a CPI enviará uma correspondência ao governo russo para saber se a legislação permite tal interação do asilado.

A senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) ainda informou que enviará um pedido de informações ao Itamaraty para saber os motivos da retenção de David Miranda no aeroporto da Inglaterra e quais os procedimentos adotados pelo governo brasileiro após o ocorrido.

Rafael Noronha

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