A CPMI criou de início muitas suspeitas. Mas não é pretensão, creio, apontar sua importância na punição de Demóstenes ou no respaldo à Polícia Federal
Ao final do primeiro semestre dos trabalhos legislativos, são importantes algumas reflexões acerca dos resultados alcançados pela CPMI que apura as “práticas criminosas” da organização dirigida por Carlinhos Cachoeira.
Por se tratar de inquérito parlamentar com características muito peculiares, sobretudo a de iniciar os trabalhos já com farto material produzido pela Polícia Federal nas operações Vegas e Monte Carlo, houve inicialmente críticas e desconfianças a respeito da própria necessidade de se criar a CPMI.
Além disso, também os procedimentos iniciais adotados -a rigidez no controle da documentação para evitar vazamento de informações sigilosas e iniciar os depoimentos pelos agentes públicos que participaram das investigações, em vez de se chamar logo os acusados- provocaram uma onda de suspeitas por parte dos que não compreenderam que um novo roteiro deveria ser seguido.
Ele se baseava na jurisprudência do STF. Tivemos como ponto de partida as diversas ações já realizadas pela polícia, pelo Ministério Público e pelo Poder Judiciário.
A CPMI, além de realizar suas tarefas, teve que se defender muito para conquistar credibilidade e comprovar que seu nascimento tinha uma razão de ser, a de aprofundar as apurações e, com isso, lançar luzes sobre a atuação de uma organização criminosa que se infiltrou na administração pública em unidades da Federação e em municípios.
Superado esse primeiro desafio, o inquérito parlamentar ainda assim continuou sendo alvo de desconfianças por parte daqueles que achavam que a comissão deveria ter foco mais amplo, nacional. Muitos consideraram tentativa de esvaziamento -e formularam acusações nesse sentido- o plano de trabalho direcionado para iniciar as investigações pelos atos da organização criminosa na região Centro-Oeste.
A CPMI, mais uma vez, superou essas críticas, demonstrando a qualidade dessas apurações localizadas e as revelações que delas surgiram quanto às formas de operar do grupo investigado. Mais ao final do semestre, a CPMI comprovaria que não tem nada a esconder, ao aprovar a convocação também de personalidades nacionais e ao quebrar o sigilo de todas as empresas que se relacionam com o grupo criminoso.
Além desses exemplos fáticos notórios, é inegável que a existência e o funcionamento da comissão também contribuíram para fortalecer as atividades de outros órgãos do Estado brasileiro, que endureceram suas ações contra os principais envolvidos no “esquema Cachoeira”.
Nesse sentido, podem ser citados como resultados associados aos esforços da CPMI: o respaldo para que a Polícia Federal continue revelando novos atos ilícitos do grupo; a atuação do Judiciário brasileiro para que os principais delinquentes continuem preso; ou a punição sofrida por Demóstenes Torres no Senado.
Seria pretensão interpretar que, para esses fatos, foi importante a existência da CPMI? Parece que não. É inconteste que uma das principais características do inquérito parlamentar é mobilizar a opinião pública e a mídia, o que resulta em excepcional controle da sociedade sobre os atos e pessoas sob investigação.
Além disso, os diversos órgãos estatais demandados pela CPMI, ou que com ela interagem, adquirem maior respaldo institucional e social para desempenhar suas funções, o que resulta em maior agilidade e eficiência.
Por essas razões, superando críticas e desconfianças, parece-nos que a CPMI alcançou conquistas nada desprezíveis, num país em que são evidentes as dificuldades em se combater organizações criminosas como essa, que movimenta recursos milionários e é integrada por pessoas influentes na sociedade e no próprio Estado.
Artigo publicado na edição de 17/08 da Folha de S. Paulo
O senador Vital do Rêgo (PMDB-PB) é presidente da CPMI que investiga a rede criminosa de Carlos Augusto Ramos o “Carlinhos Cachoeira.