O Brasil permanece insistindo na divulgação das atas eleitorais na Venezuela e na defesa de uma solução para o conflito interno por meio do diálogo. No entanto, só reconhecerá o resultado quando forem divulgados os documentos oficiais do pleito. As afirmações foram feitas nesta quinta-feira (15/8), na Comissão de Relações Exteriores do Senado, pelo assessor especial da Presidência da República Celso Amorim.
Amorim, que foi ministro das Relações Exteriores do Brasil na gestão Itamar Franco e nos dois primeiros mandatos de Lula, acredita que a melhor solução para a Venezuela após o período eleitoral é o diálogo.
A crise no país vizinho se instalou logo após a divulgação do resultado das eleições venezuelanas, com o atual presidente, Nicólas Maduro, anunciando sucesso na reeleição – sem, no entanto, mostrar qualquer evidência oficial de que as denúncias de fraude feitas por opositores e pelo Carter Center são infundadas. O caso está sendo investigado pelo Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) da Venezuela. A oposição afirma que a instituição é aparelhada pelo chavismo e, por isso, não poderá agir com independência e credibilidade para atestar os resultados eleitorais.
“A solução precisa ser construída pelos próprios venezuelanos. Temos de um lado o candidato e atual presidente Maduro, que diz que ganhou, mas não mostra as atas. E, de um outro lado, um grupo da oposição que tem as atas. Mas como poderíamos, no futuro, saber se isso é um bom precedente, reconhecer um presidente pelos documentos de que dispõe?”, questionou Amorim.
Reconhecimento das eleições
Apesar do tom conciliador, o assessor especial deixou claro que o resultado eleitoral no país sul-americano só será reconhecido com a divulgação das atas eleitorais. A afirmação ocorreu após um questionamento do senador Humberto Costa (PT-PE).
Celso Amorim havia dito que a demora na divulgação das atas é preocupante, mas disse que cobrar uma data limite para isso “não é o caminho”. Para Humberto, não se trata de fazer um ultimato ao país vizinho, mas o Brasil precisa ter previsão do que vai acontecer.
“Até quando vamos aguardar a entrega dessas atas, e, se não forem entregues, quais serão as consequências? Vamos declarar que não reconhecemos o governo anterior? (Com) O governo de Maduro, nós vamos abrir um debate para a construção de algum tipo de entendimento político? Onde para a fronteira de uma mediação para evitar uma violência política, uma guerra civil, e começa uma interferência política propriamente dita?”, questionou o senador petista.
Em resposta, Amorim cravou que o Brasil não vai “reconhecer um governo [na Venezuela] se essas atas não aparecerem”.
Direitos Humanos
A situação na Venezuela levou à oposição ao governo até mesmo a se preocupar com um tema que passa longe das suas pautas: direitos humanos – a não ser quando se trata de golpistas do 8 de janeiro. Parlamentares questionaram se o assessor especial havia visitado prisões na Venezuela.
Em resposta, o assessor lembrou que não foi mandado para isso e ficou apenas três dias no país vizinho para acompanhar as eleições. No entanto, destacou a atuação do governo Lula no tema.
“O governo ofereceu inclusive retirar os assessores da senhora María Corina Machado [líder da oposição na Venezuela] que estão presos ou estão exilados na embaixada do Brasil. O Brasil está interessado e continuará interessado em resolver e ajudar a questão de direitos humanos”, disse.
Sobre o tema, o líder do Governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (PT-PA), aproveitou para cobrar coerência do colega Sergio Moro (Republicanos-PR) – responsável, anos atrás, quando juiz federal, por agir de forma parcial na condução dos processos como forma de tirar o atual presidente Lula da corrida eleitoral de 2018 no Brasil.
“Vi o senador Moro denunciar o Judiciário e o regime venezuelano por impedir opositores de concorrer nas eleições. É uma evolução e tanto”, alfinetou.
Reconhecimento internacional
Celso Amorim lembrou que o presidente Lula tem conversado com diversos países e formou uma frente com a Colômbia e o México para tentar chegar a uma solução pacífica. Segundo Amorim, a posição brasileira tem sido elogiada por representantes dos Estados Unidos e países da União Europeia. Ele disse ter recebido ligação até do Vaticano para tratar do caso.
“Todos os nossos interlocutores concordam que é preciso encontrar a solução no diálogo. Todos têm manifestado confiança na posição do Brasil. […] A nossa função, a função do Brasil, é apaziguar”, acrescenta.
Para a senadora Augusta Brito (PT-CE), a atuação brasileira no caso é uma prova da retomada do protagonismo do país no mundo.
“Constatamos o respeito que estamos tendo. Seja atribuindo grande responsabilidade ao Brasil numa questão que sabemos ser fundamental para evitar conflitos – talvez até guerras –, demonstrando também o respeito do presidente Lula a nível mundial”, aponta a parlamentar.
Confira imagens da audiência desta quinta-feira: