ARTIGO

America First II, por Beto Faro

No plano econômico e comercial, o governo Trump poderá gerar dificuldades importantes com a sua visão curiosamente antiliberal e ultranacionalista

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America First II, por Beto Faro

Apoiador de Donald Trump, em 2020, segurando bandeira com lema da campanha do então candidato

Duas notícias recentes impactam o mundo: o observatório europeu Copernicus informou que em 2024 tivemos a temperatura mais elevada da história. Neste ano ultrapassaremos a fatídica marca de 1,5°C de temperatura média acima dos níveis pré-industriais, evento antecipado em décadas. A outra notícia, é que a segunda nação maior emissora de gases de efeito estufa elegeu Donald Trump como o seu 47º presidente.

A primeira notícia obviamente é desastrosa; a segunda, o será na hipótese de o novo governo americano potencializar a primeira. Nas demais dimensões, tanto nos EUA como no resto do mundo, as repercussões do futuro governo Trump refletirão a efetividade do cumprimento dos pontos mais bizarros da sua agenda.

Expectativas à parte, o presidente Trump foi eleito pela maioria do povo americano, portanto, merece o reconhecimento e o respeito do seu país e das nações democráticas. Torci pela vitória de Kamala. Não deu, então viva a democracia! Resta ao Brasil o esforço diplomático para manter com a administração Trump, o bom diálogo na busca por relações fraternas, de plena reciprocidade e cooperação, e por conquistas econômicas mútuas na relação bilateral.  Porém, temos, sim, um cenário preocupante.

Diferente do primeiro governo, Trump terá força política diferenciada à medida que contará com maioria na Câmara e no Senado, além de amplo conforto na Corte Suprema. Ademais, as urnas lhe garantiram indiscutível chancela popular pois venceu no eleitorado e nos delegados, sem contar o seu controle absoluto sobre o Partido Republicano. Com este ‘Céu de Brigadeiro’, o presidente poderá dar curso à sua pauta de extrema direita a depender de eventuais resistências da solidez das instituições americanas, incluindo uma imprensa muito forte; e das reações internacionais.

O mundo deveria se mobilizar pelo acolhimento e assistência aos imigrantes em situação de ilegalidade nos EUA, já que para essa população sofrida e criminalizada, parece inevitável o processo de deportação massiva. Idênticas motivações humanitárias deveriam mobilizar o mundo em socorro à população arrasada em Gaza.

Os riscos para a humanidade são muito prováveis no tema ambiental face a iminente nova retirada dos EUA do Acordo de Paris; e, mais, com a promessa de Trump de “dar todo o gás” para a indústria do petróleo; para a economia carbono intensivo, na contramão da saúde do planeta. Enquanto isso, o Brasil está aumentando as suas metas de redução das emissões. Com Lula presidente temos dois anos de queda no desmatamento da Amazônia, e agora também no cerrado. Nossas emissões caíram para o menor nível em 15 anos. Pautamos o tema do clima no G20 e temos a ambição de transformar a COP 30 em Belém como o ponto de inflexão da humanidade no combate real à emergência climática. Dificilmente Trump estará em Belém e, de fato, não terá sentido com os EUA eventualmente fora do Acordo de Paris.

No plano econômico e comercial o governo Trump poderá gerar dificuldades importantes com a sua visão curiosamente antiliberal e ultranacionalista. A promessa de sobretaxar as importações de todos os países poderá desorganizar a economia mundial, mas com danos imensos para a própria economia americana. Reações virão criando novas tensões no mundo. Certamente o deverá acelerar a agenda das suas ambições geopolíticas. Na relação comercial vimos, desde 2010, a melhora na posição do Brasil com os EUA. Passamos de um déficit comercial de US$ 7.7 bilhões para US$ 1 bi em 2023. A retomada da guerra comercial com a China poderá beneficiar ao agronegócio brasileiro, o que será positivo caso a China leve adiante as cláusulas ambientais que passou a exigir nas suas compras de commodities agrícolas.

Aqui no Brasil, alguns bolsonaristas acham que “estarão dentro” do Make America Great Again. Replicando a ingenuidade e o complexo de vira-lata demonstrado pelo seu líder em entrevista para um grande jornal, creem que o America First II culminará com a anistia dos crimes por eles praticados contra a democracia no Brasil.

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