Alessandro Dantas

Pelo menos a maior parte da população de Belém, na qual me incluo, deva ter se sentido ofendida, mas não abalada, com a declaração incrivelmente desrespeitosa do chancelar alemão sobre o alívio sentido em “deixar aquele lugar” em referência à sua passagem por Belém para a Cúpula o Clima. Para dizer o mínimo, foi uma fala incompatível com a postura que se espera de qualquer pessoa e, forçosamente, de um chefe de governo. Neste momento, já nem sei se seria o caso, mas minha reação imediata foi a protocolar requerimento no Senado Federal propondo de voto de repúdio ao Sr. Friedrich Merz.
Gostar, ou não, de coisas, pessoas e lugares, é do jogo, pois constitui resposta afetiva e cognitiva dos sentimentos humanos. O problema não é meu se tem gente que prefira joelho de porco a uma ventrecha de pirarucu!
O complicado do Sr. Merz, é que a manifestação depreciativa ao Brasil e à capital paraense decorreu do tom adotado e ao fato de ter integrado um discurso oficial e estruturado, no Congresso Alemão. Um país com a terceira maior economia do planeta que exceto por desvios históricos eventuais a exemplo do período tenebroso de 1933 a 1945, em geral, forneceu importantes contribuições para a humanidade nas mais diversas áreas.
Ademais, as declarações ofensivas do Sr. Merz contrastaram com a densidade e a cordialidade das relações bilaterais Brasil/Alemanha que remontam formalmente a 1871, logo após a unificação alemã e a criação do Império Alemão. Em sua estadia em Belém, o chanceler foi recebido com todo o carinho pelo presidente Lula e pelo governador do estado, sendo que a sua comitiva teve acolhida hospitaleira e generosa pela nossa população.
No dia 19, quarta feira, a imprensa nacional noticiou que o chanceler alemão não iria se retratar da agressão feita a Belém e ao Brasil. Essa decisão do chanceler eleva a gravidade do episódio. Deixou de ter sido um lapso diplomático passando a alimentar interpretações que as remetem à influência de reminiscências do período pós-1933.
A propósito, em 2020, na disputa pela liderança da União Democrata Cristã, Merz foi acusado de associar homossexualidade com pedofilia, o que provocou enorme repercussão e críticas na Alemanha.
Em outro momento o atual chanceler acusou refugiados ucranianos de praticar “turismo de bem-estar social” na Alemanha, o que lhe provocou muitas críticas que, neste caso, o obrigaram à retratação.Na sequência das suas declarações desastrosas, Merz chamou alunos imigrantes de “pequenos paxás” e assim provocando reações indignadas por parte, em especial, de políticos de esquerda.
Mais recente, já em 2025, afirmou que Israel estava fazendo o “trabalho sujo” para o ocidente ao atacar instalações nucleares no Irã. Em seguida, associou a presença de migrantes urbanos a um “problema de paisagem urbana” passando a defender deportações.
Assim, a grosseira declaração do chanceler alemão sobre o Brasil e Belém, fez parte da expressão em série das próprias deformações, e só depõe contra a pessoa dele mesmo e macula a imagem de um país grandioso, cuja sociedade virtuosamente ainda luta para se livrar da herança de um período sombrio da sua história.
De nossa parte, quem é “daquele lugar”, parte de um estado com a história que tem, que ostenta riquezas natural, cultural e gastronômica fabulosas, e integra uma região no controle de um mega ativo climático-ambiental e econômico com funções nevrálgicas para o planeta, não terá a autoestima afetada por conduta como a do chanceler alemão. Senhor Merz, não alimentamos ressentimentos. Retorne, e será bem-vindo e acolhido “naquele lugar”.



