As medidas para reaquecer a economia, adotadas pelo Governo Federal nos últimos dois meses, como a desoneração da folha salarial, a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de veículos e produtos da linha branca (geladeira, freezers, ar condicionado, fogões), assim como a sucessiva queda das taxas de juros e dos spreads bancários têm começado a surtir efeito.
Essa previsão, de que a economia iria acelerar a partir do segundo semestre, foi feita há dois meses pelo presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, quando fez um balanço da política monetária na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado (CAE). Pouco depois, ao repetir que a economia vai melhorar, Tombini foi duramente criticado, ao ponto de um jornal fazer um editorial intitulado “O mundo rosa de Tombini.” Com argumentos que não se sustentam diante dos fatos, o destaque é quando um economista de fora do governo diz que o País caminha no rumo certo. Assim, tudo indica que a torcida do contra, mais uma vez, vai morder a língua.
Em artigo publicado hoje no jornal O Estado de S. Paulo, intitulado “O crescimento vem aí: prepare-se”, o professor de economia Antônio Correa de Lacerda traça um cenário que reforça as perspectivas do governo: “o Brasil é um dos poucos países do G-20 que combinam, no último decênio, desemprego decrescente, melhora social e relativa estabilidade macroeconômica”, afirma.
Confira o artigo:
O crescimento vem aí, prepare-se! :: Antônio Correa de Lacerda
Você está preparado para aproveitar as oportunidades como cidadão, consumidor, trabalhador e empresário que virão por aí? É muito comum e compreensível que tenhamos uma postura de cautela diante da percepção de crise, o que muitas vezes nos desvia da chance de aproveitar as oportunidades. Há uma crise lá fora, mas, por aqui, o mercado tem todas as condições de resistir e decolar. Depois de meses de estagnação, os primeiros indicadores de recuperação do nível de atividade começam a sinalizar um segundo semestre mais aquecido. Isso não evitará que o crescimento do ano corrente se limite ao teto de 2%, mas, até para que esse cenário se viabilize, implicará um crescimento anual da ordem de 4% no último trimestre, que deve se consolidar pelo menos nesse nível em 2013.
O quadro internacional continua pouco alvissareiro, com a crise na Europa, baixo crescimento nos EUA e diminuição do ritmo de expansão na China, cujas exportações em parcela expressiva têm como destino os dois primeiros mercados. Isso impacta negativamente a economia brasileira, não apenas pelo efeito adverso nas exportações para os mercados mencionados, mas, principalmente, pela incerteza, que tem gerado adiamentos de projetos de investimentos.
No âmbito doméstico, grande parte das medidas adotadas ao longo dos últimos meses impactará positivamente as atividades. Para as empresas, especialmente nessa fase de transição, o grande desafio será o de calibrar os seus investimentos com base no potencial futuro da demanda e nem tanto na situação conjuntural. O quadro à frente é bem melhor do que a fotografia do momento e é sempre bom lembrar que o mercado interno é o grande indutor do nosso crescimento.
Os projetos carecem de um prazo de maturação e é preciso decidir hoje para aproveitar as oportunidades que surgirão nos próximos meses e anos. Nessas fases tende a ocorrer o “efeito manada”, muito comum no mercado financeiro, em que agentes individuais tendem a repetir os movimentos dos outros sem muita reflexão. No que se refere aos investimentos produtivos, a volatilidade não é tão intensa, mas a trajetória do efeito segue a mesma lógica. Os mesmos projetos de investimentos que foram ou estão sendo procrastinados deverão de forma simultânea ser retomados quando o muito provável cenário de recuperação do mercado se tornar mais evidente.
A queda na taxa de juros real e a recalibragem da taxa de câmbio são dois elementos muito importantes que trarão impactos para o setor produtivo. A taxa de juros mais baixa, tanto no conceito básico como principalmente aos tomadores finais deverá ser um impulsionador natural da demanda e dos investimentos, porque libera renda que anteriormente seria destinada aos encargos financeiros e também diminui o custo do capital para as empresas.
Na política cambial vai se consolidando a reversão do quadro predominante. Os últimos anos de câmbio, crescentemente valorizado, têm diminuído o espaço para a arbitragem e o início da correção do viés pró-importação, em detrimento da produção local.
O quadro de desinflação mundial advindo da crise nos países centrais criou uma janela de oportunidade para que se procedesse ao ajuste monetário e cambial no Brasil sem grandes riscos. No entanto, longe de avaliar que isso seria simples e automático. Em outros momentos, embora as condições internacionais permitissem, ficamos presos em nossos próprios pseudodilemas macroeconômicos e deixamos escapar a chance de fazê-lo. Portanto, méritos para a equipe econômica que tem conduzido com competência esse processo!
Tudo isso é uma condição necessária, mas não suficiente para transformar nosso potencial de consumo em maior valor agregado local e mais investimentos na produção e infraestrutura. É preciso evoluir na melhora do ambiente sistêmico para propiciar um panorama mais favorável à atividade doméstica. Não se trata de deixar de incentivar o consumo, mas de conciliá-lo com a melhora das condições de ampliação de oferta para que a demanda não vaze para as importações. Além da desvalorização do real e a redução dos juros é preciso tornar as demais condições sistêmicas isonômicas relativamente aos concorrentes internacionais.
É isso que pode garantir a sustentabilidade e a qualidade do crescimento econômico dos próximos anos. Embora esse seja um caminho mais complexo a ser trilhado, é aquele que nos propiciará melhores condições para a expansão do emprego, da renda, evitará constrangimentos nas contas externas, além de tornar mais viável os saltos de produtividade e inovação. Para isso temos de ter discernimento para preservar os avanços obtidos, mas não nos acomodarmos com eles. O Brasil é um dos poucos países do G-20 que combinam, no último decênio, desemprego decrescente, melhora social e relativa estabilidade macroeconômica. De 2003 a 2010, por exemplo, o PIB cresceu 4% ao ano e isso tornou possível reduzir o nível de desemprego à metade (de 12% para 6%) e propiciou a ascensão social de cerca de 40 milhões de cidadãos. O desafio é tornar essas condições não apenas como um ganho transitório, mas algo permanente, o que requer as decisões e ações voltadas para isso.
Artigo publicado no jornal O Estado de S Paulo