Penalização e impunidade foram as palavras mais ouvidas no debate sobre o Código Penal Brasileiro (PLS 236/2012), nesta terça-feira (21/08), em mais uma reunião da Comissão Especial do Código Penal no Congresso. No centro de toda a discussão, está a relação mútua entre a necessidade crescente de responder aos altos números da violência registrados no País e a realidade do sistema prisional nacional. A valorização da vida, especialmente por meio da redução de homicídios, esbarra numa das grandes questões que a nova legislação precisa responder: “como fazê-lo?”.
Um dos caminhos possíveis, conforme ressaltou o senador Jorge Viana (PT-AC), vice-presidente da comissão, pode estar no fim da desproporcionalidade das penas. Para o senador, a desproporcionalidade contamina a aplicação da Lei e contribui até para a superlotação dos presídios. As condenações por delitos mais leves, argumenta, penalizam excessivamente algumas pessoas, enquanto os crimes contra a vida estão “banalizados”. “A pessoa que falsifica um cosmético fica mais tempo presa, hoje, do que alguém que tira a vida do outro. Não tem sentido”, afirmou.
O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Ophir Cavalcante, também demonstrou profunda preocupação com as penas incluídas no projeto. Ele fez duras ressalvas, por exemplo, à previsão da mesma pena para crimes ambientais e abandono de incapaz (reclusão de 1 a 4 anos, de acordo com o PLS 236). “É importante o passarinho, mas o homem fica em segundo plano”, constatou.
Atentando para a situação crítica dos presídios brasileiros, o presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros, Fernando Fragoso, viu como temerária a a intenção de ampliar a duração das penas. Ele observou que, atualmente, existem no País 514 mil reclusos em um sistema prisional que “não tem vagas nem para metade disso”. Hoje, segundo o Alto Comissariado de Direitos Humanos da ONU, o Brasíl ocupa a quarta posição em número de detentos do mundo, atrás dos EUA, China e Rússia
A alternativa, na avaliação de Fragoso, está em propostas de ressocialização e de caráter mais pedagógico, que não ganharam importância na proposta do Senado. “Estamos trabalhando com a ideia de deixar o preso por mais tempo dentro da cadeia. Será que essa é a melhor conduta? Queremos ter presos definitivos?”, questionou.
Responsável por uma operação nacional que pretende por fim a mais de 136 mil inquéritos antigos inconclusos, Taís Schilling Ferraz, também conselheira do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), observou que apenas 8% dos assassinatos transformam-se em denúncia e um número ainda menor se em condenações.
Mesmo assim, ela viu restrições à ampliação de qualquer tipo de pena. Citando o filósofo italiano Cesare Beccaria, Taís ponderou “não é o tamanho da pena, mas a certeza da punição”. Entretanto, ela considerou que justificariam penalidades mais severas para ameaças, graças ao alto número de execução, e contra a mulher, com base no que define a Lei Maria da Penha.
Reavaliação do calendário
Um clamor para a ampliação do prazo de apresentação de sugestões de alteração do projeto também foi manifestado por quase todos os juristas e senadores. Eles consideram que a apresentação de emendas até 4 de setembro, conforme previamente definido pelo relator, inviabilizará importantes modificações. Ophir esclareceu que a OAB não tinha conseguido nem terminar a análise sobre toda a propostas e que só deverá fazê-lo dentro de 60 ou 90 dias. “[A Ordem] está preocupada com o curto prazo, porque esse é um Código que mexe com a vida das pessoas e no que lhes é mais precioso: a liberdade”, disse, para depois pedir cautela em relação ao clamor popular.
Jorge Viana, que também vem alertado para a necessidade de reavaliação do calendário, adiantou que o relator do projeto, Pedro Taques (PDT-MT), e o presidente da comissão, Eunício Oliveira (PMDB-CE), estudam rever o prazo de apresentação de emendas. Uma reunião administrativa deverá ser convocada para a semana que vem com o intuito de discutir uma nova data.
Catharine Rocha
Leia mais:
Código Penal: “A vida, no Brasil, não vale nada”, diz Viana