Uma alteração no texto do artigo 7º da Constituição poderá modificar totalmente o direito de escolha sobre quem toma conta de um bebê após o nascimento ou a adoção. Isso é o que propõe a Proposta de Emenda à Constitucição (PEC nº 110/2011), de autoria da senadora Marta Suplicy (PT-SP). O texto defende que o que hoje se chama licença gestante se converta em licença natalidade. Embora pareça um simples detalhe, a mudança permitirá que a criança possa ser acompanhada por ambos os pais durante quinze dias após o nascimento, ao invés dos atuais cinco dias concedidos ao pai da criança.
A proposta permite, ainda, que qualquer um deles – pai ou mãe – possa desfrutar da licença de seis meses. “Isso é o que há de mais moderno na Europa, onde os pais decidem quem irá cuidar da criança nestes primeiros meses”, disse Marta, acrescentando que “a ideia é resolver um problema que temos hoje: caso a mãe venha a falecer, o pai não pode cuidar do filho para além dos cinco dias que a lei permite, pois a licença é da mãe, prerrogativa da maternidade”.
Na justificativa da PEC, a senadora Marta argumenta que além de dar aos pais a possibilidade de escolher livremente quem deve tomar conta do bebê, “hoje, com os avanços da medicina e também por meio da adoção, uma pessoa que integra união civil com outra do mesmo sexo pode alcançar a paternidade ou a maternidade”. Por isso, a disciplina constitucional precisa ser “ampla o bastante para abranger essas alternativas”,argumenta.
Marta enfatiza que os direitos trabalhistas previstos na Constituição devem ser aplicados a todas as pessoas, independentemente de sua orientação sexual, identidade de gênero ou gênero. Sua proposta também prevê a proibição de diferença de salário, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, orientação sexual, identidade de gênero, idade, cor ou estado civil.
Homofobia proibida
Também de autoria da senadora Marta Suplicy, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC nº111/2011) pretende colaborar com o fim da discriminação de gênero, orientação sexual e identidade de gênero. Embora proíba, o texto não criminaliza a homofobia. A proposta, em si, altera o artigo 3º da Constituição Federal para incluir, entre os objetivos fundamentais do Brasil, a promoção do bem de todos, sem preconceitos relativos à identidade de gênero ou orientação sexual.
“É apenas uma alteração principiológica. Com a nova redação fica explícito que entre os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil está vedado qualquer preconceito e discriminação quanto à orientação sexual e à identidade de gênero das pessoas”, comenta Marta.
De acordo com a senadora, apesar de o texto atual mencionar que não pode haver preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer formas de discriminação, é um objetivo desejar que esta vedação, na Constituição Federal, englobe os casos de orientação sexual e identidade de gênero.
União estável e casamento
Deixar clara a permissão do reconhecimento legal da união estável entre pessoas do mesmo sexo. Esse é o objetivo do Projeto de Lei do Senado (PLS nº 612/2011), de autoria da senadora Marta Suplicy. Ela explica que o projeto faz a adequação do texto do Código Civil à recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que concedeu à união estável homoafetiva o mesmo regime jurídico aplicável à união estável heteroafetiva.
“Com a criação de uma lei clara, alguns juízes que ainda desobedecem à decisão do STF, apesar de ser vinculante, não poderão tomar decisões tão contraditórias. Assim vai acabar a insegurança jurídica sobre esta questão”, disse a senadora, lembrando que alguns magistrados insistem em não acatar a união estável, “condenando os casais homoafetivos a uma eterna insegurança sobre sua situação”.
Reconhecimento da identidade social
Quando uma pessoa decide mudar sua aparência física e adotar outra identidade social, sua imagem deixa de ser compatível com o nome que lhe foi dado ao nascer. Pior, sua documentação torna-se um constrangimento. Imagine ser, visualmente uma mulher e precisar apresentar documentos com foto e nome de homem, por exemplo.
Para eliminar essa disparidade, a senadora Marta Suplicy apresentou o projeto de lei (PLS nº 658/2011) que reconhece os direitos à identidade de gênero e garante a troca de nome e sexo nos documentos de identidade de transexuais.
“O transexualismo é uma realidade social que exige uma tomada de posição do parlamento brasileiro, tendo em vista a total ausência de disciplina legal específica”, explica.
Marta acrescenta que, de acordo com a psiquiatria, “o transexualismo é nada mais que o desejo de viver e ser aceito enquanto pessoa do sexo oposto. Este desejo se acompanha, em geral, de um sentimento de mal-estar ou de inadaptação por referência a seu próprio sexo anatômico e do desejo de submeter-se a uma intervenção cirúrgica ou, ainda, a um tratamento hormonal para de tornar seu corpo tão conforme quanto possível ao sexo desejado”.
A senadora observa que o artirgo 13 do Código Civil ainda é utilizado contra aqueles que desejam realizar cirurgias de adequação sexual, quando estabelece que, salvo por exigência médica, é proibido o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes.
“Nosso projeto busca a criação de uma lei específica sobre o tema, para evitar os tantos casos de brasileiros que se sentem profundamente inadaptados ao próprio sexo de nascença e lutam em vão na Justiça pela adequação do nome e sexo nos seus documentos de identidade”, afirma.
O projeto foi inspirado na lei de identidade de gênero do Uruguay que, em síntese, determina que toda pessoa tem direito ao livre desenvolvimento de sua personalidade, conforme a própria identidade de gênero, com independência de qual seja seu sexo biológico, genético, anatômico, morfológico e hormonal.
Giselle Chassot
Ouça a entrevista da senadora Marta Suplicy:
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