Os índices de homicídios de adolescentes estão crescendo e, sem a adoção de políticas públicas para conter essa tendência, o Brasil poderá registrar 43 mil assassinatos de jovens entre 12 e 18 anos no período de 2015 e 2021. É o que aponta o relatório do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), divulgado na última terça-feira (10). O estudo também mostra que as pessoas de 12 a 18 anos são as que mais morrem assassinadas no País, considerando-se a proporção que representam na população.
Os estados do Nordeste são os que registram o maior crescimento nos índices de homicídios de adolescentes, e as vítimas são principalmente meninos negros. Para a senadora Regina Sousa, (PT-PI), presidente da Comissão de Direitos Humanos, os dados “são alarmantes, mas não são surpreendentes”. O aumento de casos no Nordeste, lembra a parlamentar, tem relação direta com a concentração de miséria. “Apesar do esforço dos governos petistas, é no Nordeste que a falta de atenção e de políticas públicas se torna mais visível”.
O relatório Índice de Homicídios na Adolescência 2014 (IHA), trabalha com as estatísticas e registros da violência já consolidados e é resultado de uma parceria entre o UNICEF, o Ministério dos Direitos Humanos (MDH), o Observatório de Favelas e o Laboratório de Análise da Violência, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (LAV-Uerj).
Regina Sousa ressalta que os cortes orçamentários promovidos pelo governo Temer podem contribuir de maneira decisiva para aprofundar essa tragédia. No Orçamento de 2018, por exemplo, está proposto um corte de 69% para políticas defesa dos direitos da criança e do adolescente. “O atual governo está promovendo um desmonte das políticas que foram desenvolvidas pelos governos petistas”.
Cálculo do IHA
A pesquisa do Unicef analisa os homicídios de adolescentes de 12 a 18 anos nos 300 municípios brasileiros com mais de 100 mil habitantes. O índice de Homicídios de Adolescentes (IHA) é calculado para cada grupo de mil pessoas entre 12 e 18 anos. A partir da análise das informações de 2014, para cada mil adolescentes, 3,65 correm o risco de ser assassinados antes de completar o 19º aniversário. Se as condições que prevaleciam em 2014 não mudarem, entre 2015 e 2021, um total de 43 mil adolescentes poderá ser morto nesses 300 municípios analisados.
Para Frances Bauer, do Unicef, a falta de oportunidades “tem determinado cruelmente a vida de muitos adolescentes”. O Brasil conseguiu nas últimas décadas significativos avanços na redução da mortalidade infantil , mas o número de mortes entre os adolescentes cresceu de uma maneira alarmante. “É primordial que o País valorize melhor a segunda década de vida e dê à adolescência a importância que ela merece”, defende Bauer.
As mortes de crianças menores de 1 ano foram reduzidas de 95.938, em 1990, para 37.501, em 2015. Durante o mesmo período, o número de adolescentes de 10 a 19 anos assassinados aumentou de 4.754 para 10.290, segundo o Datasus.
Desde 2012, o número dos adolescentes entre 12 e 18 anos morrendo por agressão é proporcionalmente mais alto do que do resto da população brasileira (31,6 para cada 100.000 adolescentes em 2014 comparados com 29,7 para cada 100.000 pessoas no geral).
Políticas específicas
Para a senadora Regina Sousa, é preciso fortalecer as políticas específicas para os adolescentes para que o País não continue a perder tantos jovens para o crime e as drogas. “Não há políticas de geração de emprego, capacitação, escola nem lazer para essa juventude. E a população que está fora das escolas é a que está morrendo”. Ela alerta que há uma grande parcela de desassistidos no Brasil que cada vez mais são deixados fora do Orçamento.
A Comissão de Direitos Humanos do Senado acompanha de perto o tema e vai encaminhar sugestões para os estados. “É preciso tomar posição e enfrentar esse quadro de extermínio proposital – por omissão – dos jovens de periferia, negro e desempregado”.
Risco mais alto para os adolescentes do sexo masculinos e negros no Nordeste
Outro ponto importante que o relatório mostra é a “nordestização” da violência. Das dez capitais mais violentas para um adolescente, sete estão na Região Nordeste. Fortaleza tem o maior IHA, com 10,94 homicídios para cada grupo de mil adolescentes, seguida por Maceió (9,37). As cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo registraram a 19ª e a 22ª posição entre as capitais (2,71 e 2,19, respectivamente).
O cálculo dos riscos relativos atesta a influência de sexo, cor, idade e meio utilizado no homicídio na probabilidade de um adolescente ser vítima de violência letal. Em 2014, os adolescentes do sexo masculino tinham um risco 13,52 vezes superior ao das adolescentes do sexo feminino, e os adolescentes negros, um risco 2,88 vezes superior ao dos brancos. O risco de ser morto por arma de fogo é 6,11 vezes maior do que por outros meios.
Outro estudo conduzido pelo UNICEF, a Assembleia Legislativa do Estado do Ceará e o Governo do Estado do Ceará, Trajetórias Interrompidas, traz uma análise de homicídios ocorridos em Fortaleza e em outros seis municípios cearenses, com conclusões semelhantes. As vítimas eram, em grande maioria, meninos (97,95%) e negros ou pardos (65,75%), moradores das periferias. Os adolescentes assassinados eram, em sua maioria, pobres – 67,1% viviam em lares com renda familiar entre um e dois salários mínimos – e 70% estavam fora da escola há pelo menos seis meses. Em Fortaleza, metade dos homicídios de adolescentes aconteceu em média a 500 metros da casa da vítima.