A aprovação da Lei de Migração (13.445/2017) deveria facilitar a regularização de estrangeiros no Brasil. Porém, o caso de cidadãos venezuelanos que tem vindo para o Brasil mostra que o País tem violado essa legislação. A afirmação foi feita nesta terça-feira (27) pela procuradora do Trabalho da 11ª Região no Município de Roraima, Priscila Moreto, durante audiência na Comissão de Direitos Humanos do Senado.
De acordo com a Polícia Federal, foram mais de 17 mil pedidos de cidadãos da Venezuela para entrarem regularmente no Brasil só no ano passado. Roraima é o principal destino dessas pessoas.
Elas ingressam no País principalmente pelo município de Pacaraima, que faz fronteira com a Venezuela. Sem apoio, boa parte dos migrantes – muitos com nível alto de escolaridade – acaba se submetendo às piores condições possíveis para sobreviver, como trabalhos análogos ao de escravo, prostituição e situação de mendicância.
“Esse cidadão sabe que está sendo abusado, mas não sabe como denunciar. É uma omissão do município, do Estado e da União”, disse a procuradora Priscila Moreto. A afirmação tem como base o relatório elaborado após visitas técnicas aos municípios de Boa Vista, Pacaraima e Manaus (AM), feitas pelo Ministério Público do Trabalho em conjunto com instituições como a Missão Paz, que acolhe e auxilia migrantes.
“Isso tudo mostra grave violação por parte do Brasil dos Direitos Humanos, direitos que o Brasil se comprometeu nacionalmente internacionalmente. Viola inclusive a Lei de Migração, que prevê princípios, diretrizes e repúdio à xenofobia e à discriminação, além do acolhimento humanitário. O Estado tem que gerir o caso dessas pessoas em extrema vulnerabilidade social”, afirmou.
Presente à audiência, a presidenta da Comissão de Direitos Humanos do Senado, Regina Sousa (PT-PI), alertou para a necessidade de o Brasil oferecer todo apoio possível aos governos municipais e do Estado do Roraima. “É muito difícil administrar um Estado que já é pobre e a população aumenta repentinamente”, justificou a parlamentar.
Regina disse ainda esperar que o Brasil tenha um cuidado especial com o tema, ao contrário do que faz os Estados Unidos. “Sabemos muito bem que os Estados Unidos não veem a Venezuela com olhar humanitário e, sim, visando o petróleo do país sul-americano”, complementou.
Deslocamento digno
Membro da Agência da ONU para Refugiados (Acnur), o oficial Paulo Sérgio de Almeida cobrou estratégias para garantir a ida de migrantes para o interior do País de forma planejada e com deslocamento digno – com respeito integral aos direitos dessas pessoas – e uma acolhida adequada em outros estados brasileiros. “Onde venham a ter acesso a emprego e a outras oportunidades de geração de renda”.
A audiência no Senado também contou com a participação interativa da população. Sobre comentários afirmando que os governos precisam cuidar apenas dos brasileiros que passam fome, a representante da Cruz Vermelha Brasileira, Carolina Sampaio, foi enfática: “São todos seres humanos. Se a gente não cuidar deles [cidadãos venezuelanos], eles continuarão chegando da mesma forma, e a situação só vai piorar para os brasileiros”.
Plano em andamento
Durante o debate na CDH, representantes do governo federal afirmaram que um plano de fluxo migratório estaria em andamento. O presidente do Conselho Nacional de Imigração, Hugo Medeiros, disse que o governo encomendou pesquisas para entender esse fluxo de migrantes e, só depois, elaborar políticas públicas para essas pessoas.