Dilma Rousseff já não titubeia. Em março de 2011, quando recebeu Barack Obama em Brasília, a presidenta, com apenas três meses de governo, caminhava insegura sobre seus recém-estreados sapatos vermelhos de salto alto pelas escadarias escorregadias do Palácio do Planalto. Debutava, balbuciante, na alta política mundial diante do olhar de um Washington ávido por aliados de porte na América do Sul, onde conta apenas com a subordinação armada da Colômbia e a adesão do Chile ao câmbio livre.
Nesta segunda-feira, (09/03), no Salão Oval, Dilma se movia com o passo mais seguro, passo de quem representa a “sexta economia” mundial e busca estabelecer uma relação de “igual para igual”, tal como declarou, ao desembarcar em Washington no domingo passado (08/03).
Com a voz segura e monocórdica, a presidenta reafirmou que a bancarrota econômica mundial é consequência da inundação de dólares e euros estimulada pelos países desenvolvidos, reiterando opiniões já expostas há uma semana, durante a Cúpula do BRICS, na Índia, e há um mês, frente à impassível Angela Merkel, durante visita à Alemanha. “Essas políticas monetárias provocam a desvalorização das moedas dos países desenvolvidos, comprometendo o crescimento das economias emergentes”.
Dilma não repetiu a expressão “tsunami monetário”, usada em Nova Delhi, mas responsabilizou a guerra cambial pela “instabilidade, o baixo crescimento e o desemprego que afeta várias regiões do mundo”.
Em alguns momentos, falava como porta-voz dos países latino-americanos, que, no final desta semana, participarão da Cúpula das Américas, em Cartagena, na Colômbia. Disse que o demonstrará com clareza “que a América Latina é um continente que vem crescendo, distribuindo renda e realizando inclusão social”. “Vamos discutir os benefícios da integração para a América Latina”, porque “o crescimento econômico ocorrerá (como consequência) do fortalecimento de nossos mercados internos, com a inclusão de milhões de brasileiros e latino-americanos”.
Em seus quase quinze minutos de exposição ante um Obama atento, Dilma não abordou de forma explícita a situação de Cuba – talvez para evitar constrangimento a um anfitrião que a recebeu “fraternalmente” – mas o assunto foi mencionado pelos membros de sua comitiva em conversas informais com a imprensa.
Nessas conversas, a delegação brasileira defendeu que a ilha, visitada em janeiro passado por Dilma, seja convidada para participar da Cúpula que congrega 34 países do hemisfério. Ainda se especula, embora já sem a insistência de há algumas semanas, que Washington e Brasília lançarão, em Cartagena, uma aliança pelo meio ambiente, provavelmente na área de energias renováveis, como uma prévia da Rio +20, a ser realizada em junho e para a qual Obama foi formalmente convidado ontem.
Obama falou por cerca de cinco minutos, concentrando-se nos interesses norte-americanos nas gigantescas reservas de gás e petróleo descobertas no litoral brasileiro e na busca de um consenso em temas globais, como o Oriente Médio, questão já abordada pela presidenta brasileira, que, em fóruns mundiais, condenou uma ofensiva militar contra a Síria e questionou o recrudescimento das pressões sobre o Irã.
Como em todas as relações de Estado, os líderes expressam a relação de poder que há entre seus países. Ente o Brasil os Estados Unidos, essa relação mudou, em uma década de governo do Partido dos Trabalhadores. Entre janeiro de 2003 – quando Luiz Inácio Lula da Silva subiu a rampa do Planalto – e março de 2012, as mudanças foram drásticas: os EUA, que representavam 25% do comércio exterior brasileiro, retrocedeu aos 12,5% e já não detém a coroa de principal parceiro comercial do Brasil, posto que há dois anos é ocupado pela China, cujas transações com o país sul-americano superam em cerca de US$ 17 bilhões às de Washington.
A agenda da defesa foi abordada lateralmente entre os dois presidentes, deixando quase arquivado o tema de uma aliança militar estratégica. Como se espera de países que disputam a supremacia continental.
Por Darío Pignotti – Página 12