A partir do momento em que for notificado pelo Conselho de Ética e Decoro Parlamentar – o que acontece ainda nesta terça-feira (10/04) -, o senador goiano Demóstenes Torres (ex-DEM) do Senado, terá dez dias para apresentar defesa prévia sobre sua relação com o contraventor Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira.
Será uma tarefa árdua, reconhecem os senadores de todos os partidos, inclusive de seu ex-partido, o DEM, porque notícias divulgadas na imprensa apontam uma clara associação entre o senador e o contraventor, preso desde fevereiro em Mossoró (RN), em presídio de segurança máxima. Enquanto as matérias revelam uma relação que vai além da amizade, no início de março, o senador goiano negou ter participado de qualquer negociação ilegal e disse que suas relações com Cachoeira eram apenas amistosas.
Gravação obtida pela imprensa revelou uma conversa em que Demóstenes orientava Cachoeira sobre a viabilidade de levar adiante a votação de um projeto de lei que pretendia legalizar os jogos de azar.
O presidente eleito do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, senador Antonio Carlos Valadares (PSB-SE), a quem cabia julgar pela admissibilidade ou não da representação feita pelo PSOL, acatou as argumentações. Isto quer dizer que, na prática, mesmo que Demóstenes renuncie ao mandato, o processo de cassação não será interrompido.
Valadares poderia ainda hoje sortear o nome do senador que será responsável pela relatoria do processo que pedirá a cassação do mandato de Demóstenes. Acontece que, para evitar qualquer questionamento jurídico a respeito dos procedimentos regimentais, Valadares decidiu seguir o que diz o artigo 23-A da Resolução do Senado nº 25 de 2008, para escolher o relator na quinta-feira (12/04), assim respeitando o prazo regimental de dois dias.
A Resolução nº 20/1993, que instituiu o Código de Ética do Senado Federal, diz que a designação de relator, por meio de sorteio, será realizado em até três dias úteis após a admissibilidade da representação. O sistema de sorteio de relator foi incluído na Resolução 25/2008 e tornou-se conhecida, ironicamente, de Emenda Demóstenes.
Até então Demóstenes era um senador atuante e que se apresentava a seus pares como uma referência da moralidade pública. Ao propor o sorteio do relator, Demóstenes quis evitar que o senador representado ao Conselho de Ética e Decoro Parlamentar pudesse influenciar na escolha do relator responsável pelo pedido de cassação.
Mas ambas resoluções são claras. O relator do processo de cassação de mandato não poderá ser um senador do partido que assina a representação ao Conselho e nem um senador que pertença ao partido do senador que responderá o processo. Mesmo que Demóstenes tenha apresentado sua desfiliação do DEM, o senador Jayme Campos (DEM-MT), até então presidente interino do Conselho, alegou não estar apto para julgar o ex-companheiro, embora tenha dito que irá assinar o pedido de abertura de uma CPI mista para investigar a relação entre parlamentares e o contraventor Carlinhos Cachoeira.
Bate-boca
O senador Pedro Simon (PMDB-RS) elogiou a postura do líder do PT e do Bloco de Apoio ao Governo, Walter Pinheiro (PT-BA), que tem insistido na abertura de uma CPI mista para investigar as relações entre parlamentares e Carlinhos Cachoeira. Simon disse que estranhava a postura do líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros, que pouco antes havia dito que não era uma tradição do PMDB pedir a abertura de CPIs.
“É uma tradição sim. Parabenizo a presidenta Dilma em apoiar a abertura de uma CPI para investigar o contraventor Carlinhos Cachoeira. CPI tem que investigar e punir quem comete crime”, afirmou. Simon só exagerou ao dizer que as CPIs do Cartão Corporativo e a das ONGs não teve seu relatório aprovado. Renan, então, balançou a cabeça negativamente. As duas CPI não só tiveram seus relatórios finais aprovados como propuseram mudanças nos dois casos.
Para o senador Humberto Costa (PT-PE), integrante do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, a decisão de aceitar a representação contra o senador Demóstenes Torres foi bastante fundamentada do ponto de vista legal. “Todos os senadores tem um posicionamento muito evidente, muito claro, de que é necessário dar uma resposta para a sociedade, mostrando que a Casa quer preservar e melhorar sua imagem e não quer compactuar com a impunidade”, afirmou.
Segundo Humberto Costa, todos os fatos do relacionamento do senador Demóstenes Torres com o contraventor Carlinhos Cachoeira devem ser esclarecidos, mas sem esquecer a garantia constitucional do amplo direito à defesa.
Marcello Antunes
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