O país não suporta mais tantos desmandos no Palácio do Planalto e no Ministério da Economia, cuja paralisação devastou empregos e empurrou milhões de brasileiros para a extrema pobreza e a fome. Em entrevista coletiva à imprensa nesta sexta-feira (8), em Brasília, o ex-presidente Lula fez um balanço de uma ampla agenda de encontros e reuniões na capital e falou dos desafios de reconstrução do Estado brasileiro, demolido por Bolsonaro e Paulo Guedes. Para colocar o país novamente no rumo da prosperidade, insiste Lula, é preciso devolver ao Estado o papel de indutor do desenvolvimento, por meio de políticas de fomento econômico e atração de investimentos.
“Quero um Estado forte, porque só um Estado forte é capaz de acabar com a miséria nesse país”, disse Lula. “De fazer casa popular subsidiada para o povo que está desempregado e ganha pouco. Quero um Estado capaz de melhorar o SUS, que era tripudiado antes da pandemia, e agora é endeusado por quem tripudiava. O SUS é uma coisa extraordinária. Não quero um Estado empresarial mas com força para ser o indutor do desenvolvimento”, apontou o ex-presidente. “Um Estado que cuide das pessoas sem preocupar com o gasto de cuidar das pessoas. É esse Estado socialmente justo que quero para esse país”.
Ele reconheceu que os desafios do país em 2023 são maiores do que quando assumiu a Presidência em 2003, mas insistiu que é hora de olhar para frente e criar novas oportunidades para o futuro. “Quando deixei a Presidência, jamais imaginei que o Brasil ficaria pior do que deixei. Não esperava que o Brasil voltasse ao Mapa da Fome, era um motivo de orgulho termos saído”, desabafou.
Lula lembrou, no entanto, que o partido fez muito pelo país nos 13 anos em que governou o Brasil. Os resultados econômicos do PT falam por si, argumentou Lula, mas é possível fazer muito mais. “O legado que deixei nesse país vale por 500 cartas ao povo brasileiro”, comparou, ao responder se faria uma nova versão do documento apresentado à sociedade nas eleições de 2002.
“Nós pegamos esse país com U$ 30 milhões de dívida ao FMI, 12% de inflação, 12 milhões de desempregados e o [Pedro] Malan [ministro da Fazenda do governo FHC], que era um bom homem, tinha de ir todo final ano até Washington buscar dinheiro para fechar o caixa no Brasil”, relatou Lula.
“Começamos a governar, todos os economistas diziam que o país iria quebrar. Nós consertamos a economia: trouxemos a inflação para 4,5%, geramos 20 milhões de empregos, tivemos superávit primário durante todo o governo, pagamos a dívida ao FMI, emprestamos U$ 10 bilhões ao FMI e ainda deixamos U$ 370 bilhões em reservas, que é o que está salvando o Brasil”, ressaltou.
Inflação e pobreza
Lula observou que a incompetência de Bolsonaro destruiu o poder de compra do trabalhador ao permitir a volta da inflação e o descontrole absoluto dos preços de itens essenciais ao povo brasileiro, como os alimentos, o combustível e o gás de cozinha.
“A gasolina já subiu 39%, o óleo diesel, 33%. Sem nenhuma necessidade. O Brasil tem refinarias altamente qualificadas”, disse, ao criticar duramente a política de dolarização do preço dos combustíveis. “A Petrobras tem uma direção mais importante do que o presidente da República. Se Bolsonaro não tem coragem de governar, de dizer ao almirante que está lá que não vai aumentar, significa que o Brasil precisa de um novo presidente”, destacou.
“Bolsonaro não consegue controlar o preço da carne, o preço do frango, da mandioca, que subiu 45%, do açúcar, que subiu 38%”, enumerou. “Não é apenas o combustível que ele não controla. Não controla o custo de vida do povo, não controla a inflação, e agora está dizendo que vai haver desabastecimento por causa da China”.
“Tenho uma preocupação muito grande com a inflação, que prejudica o povo mais pobre, com o emprego, que é uma coisa muito séria, com a fome. A questão econômica a gente resolve quando mostrar seriedade”, explicou. “No momento temos um governo que não faz outra coisa a não ser contar mentiras todos os dias”.
600 mil vítimas
Lula voltou a condenar a falta de humanidade e solidariedade do ocupante do Planalto, incapaz de manifestar um gesto de compaixão às famílias das vítimas da Covid-19 no país. “É um momento de tristeza. No momento em que o país mais precisa de um presidente, que é como se fosse um grande chefe de família, que tem a responsabilidade de manter a família em paz, com esperança, ele destrói”.
Lula apontou para todas as atrocidades cometidas por Bolsonaro à frente do país. “E mais grave, um presidente da República que nunca fez um gesto de solidariedade a uma única pessoa, vítima ou aos familiares das 600 mil pessoas que morreram”.
“Continua mentindo, tentando vender remédios ineficazes, fazendo propaganda contra máscara, continua dizendo que o coronavírus não é o bicho papão que a ciência, que a medicina diz que é”, ressaltou.
O ex-presidente enfatizou ainda a importância do trabalho da CPI da Covid, que revelou uma quadrilha atuando “para mentir sobre remédios ineficazes e a compra das vacinas”, e disse esperar que o relatório irá contribuir para a punição dos culpados.
Diálogo e eleições
Na entrevista, Lula reforçou a importância de andar pelo país para dialogar com a sociedade, com movimentos sociais e partidos políticos, em torno de uma agenda para o enfrentamento da crise. “Tenho conversado com todas as forças políticas”, relatou. “Vou conversar com todo mundo, partidos políticos, com a sociedade. Consertar esse país é uma tarefa de muita gente”.
Lula voltou a defender que todos os partidos tenham a liberdade de lançar suas candidaturas. “Tem muita gente sem competitividade se colocando como candidato. Eu acho ótimo, mas é preciso disputar o primeiro turno. Pode ter quantas vias quiser”, opinou.
“Ano que vem vamos poder brigar muito para consertar esse país. Esse país haverá de ter juízo suficiente para eleger alguém que respeite a democracia, que goste dela, e que exercite a democracia nos atos cotidianos”, apostou Lula. “Quem quer que seja, deve ser alguém humanista, com um mínimo de solidariedade, que pense no país”.