ataque aos povos indígenas

Política de fertilizantes é cavalo de Troia para invadir terras indígenas

Para Rogério Carvalho, o governo usa a guerra no leste europeu para colocar em prática estratégia de invadir reservas e dizimar povos originários. Alternativas existem, lembra o senador, e foram mostradas por governos do PT
Política de fertilizantes é cavalo de Troia para invadir terras indígenas

Foto: Alessandro Dantas

A agricultura precisa de fertilizantes. E o Brasil importa 80% de todos esses produtos, feitos à base de potássio, fosfatos e nitrogenados. No caso dos compostos de potássio, a dependência é maior: 94% vêm de fora, principalmente da Rússia (32,5%) e de Belarus (18%). Com a crise no leste europeu, avizinha-se outra crise, a de oferta de fertilizantes para uma lavoura que abastece o mercado interno e responde pela maior parte de nossas exportações. Mas há 13 anos, no governo do PT, o Brasil começava a montar sua indústria própria de fertilizantes. E chegamos a 2022 sem fábricas e andando em círculos, na busca de “nova” solução para o problema. O que aconteceu de lá para cá? Outro desafio é onde e como explorar esses minerais. O Brasil possui a terceira maior jazida de potássio, mas parte dela fica próxima a rios que cortam a Amazônia. O assunto foi debatido nesta quinta-feira (10) em audiência na Comissão de Agricultura do Senado (CRA).

O presidente da Comissão, senador Acir Gurgacz (PDT-RO), abriu o debate dizendo que a retomada da produção de fertilizantes no país demanda tempo, cerca de 10 anos, e defendeu a entrada de investidores nacionais e estrangeiros e o estímulo à exploração de jazidas no país. Afirmou, ainda, que o potássio brasileiro está principalmente concentrado numa área que abrange 14 municípios distribuídos por Amazonas, Rondônia, Mato Grosso e Pará, e garantiu que essas terras estão fora de reservas indígenas e de áreas de proteção ambiental.

Contrariando Acir Gurgacz, o diretor do Departamento de Transformação e Tecnologia Mineral do Ministério de Minas e Energia, Enir Sebastião Mendes, admitiu que o plano do governo de legalizar a extração de potássio na região da Volta Grande do Xingu, perto de Altamira (PA), esbarra na proximidade a reservas indígenas, que seriam afetadas. Em tom de lamento, o gestor explicou que o plano está suspenso em razão de ação do Ministério Público. Também não comentou estudo do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente que ressalta os graves riscos ambientais envolvidos na exploração do potássio, e que podem perdurar por décadas. É que, ao extrair o mineral, a empresa deixa para trás a salmoura concentrada, que, principalmente na época das cheias, vai parar nos rios, dizimando os peixes e poluindo as águas.

Mais convergente com o presidente da CRA, o diretor de Programa da Secretaria Executiva do Ministério da Agricultura (MAPA), Luís Eduardo Rangel, disse que o Ministério apoia a política de fertilizantes preparada pelo governo por meio de grupo de trabalho que operou no Planalto no ano passado. A ideia, segundo ele, é que, passando a produzir fertilizantes, “o Brasil importe, até 2050, apenas 55%”.

Novamente o looping infinito: esse era o percentual de importação previsto para o Brasil, hoje, caso não fossem fechadas – por Temer e Bolsonaro – as fábricas de fertilizantes na Bahia, em Sergipe e no Paraná, instaladas nos mandatos do PT. E se também não tivessem sido abandonadas as plantas projetadas para Minas Gerais e Mato Grosso do Sul. A Fábrica de Fertilizantes Nitrogenados (Fafen), fechada por Bolsonaro em 2020, era responsável pela produção de 30% do mercado brasileiro de ureia e amônia e 65% do Agente Redutor Líquido Automotivo (ARLA 32). Além de agravar a dependência nacional desses produtos, a canetada jogou mais de mil trabalhadores na rua. Agora, a Petrobras tenta vender as instalações da fábrica.

Em sintonia com o plano governista, a Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira regime de urgência ao projeto (PL 191/2020) que legaliza a mineração em terras indígenas. Será formado grupo de trabalho na Câmara para, conforme o presidente da Casa, deputado Artur Lira, colocar o texto em votação em abril. O líder do PT no Senado, Paulo Rocha (PA), protestou. Como lembrou o senador, a votação foi feita no momento em que ocorria o Ato pela Terra e Contra o Pacote da Destruição, no gramado da Esplanada dos Ministérios. “Milhares de pessoas gritando: Lira Não contra a mineração em terras indígenas! Nesse momento, o presidente da Câmara dos Deputados resolveu votar em medida de urgência, passando por cima de todos os protocolos, a liberação da mineração nas terras indígenas”. Humberto Costa (PT-PE) também não deixou passar: “Apesar da grande mobilização, o governo aprovou a urgência do PL 191/20, que libera a mineração em terras indígenas. O governo Bolsonaro ignora os anseios da população brasileira, mas a luta não acabou. Não vamos aceitar a destruição da Amazônia e o ataque aos indígenas”.

Cavalo de Troia
O senador Rogério Carvalho (PT-SE) classifica a estratégia do governo, que junta o PL 191 e a política de fertilizantes, como “um cavalo de troia, um jeito de invadir terras indígenas usando como desculpa a guerra entre Rússia e Ucrânia”. Segundo Rogério Carvalho, se o governo quisesse, encontraria alternativas: “Para dar uma ideia, Sergipe é riquíssimo em carnalita (mineral de onde se extrai potássio). Portanto, ali ainda tem condição de explorar numa área que não é indígena, que não é de preservação. Ali, poderíamos produzir boa parte do potássio necessário à produção de fertilizantes, sem precisar dessa conversa de invadir terras indígenas. Em Sergipe tem uma planta pensada, concebida para essa extração. É mais uma conversa fiada para justificar a invasão e a destruição dos povos originários.”

 

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