Ana Rita quer tipificar escravidão nas cidades

A SRª ANA RITA (Bloco/PT – ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Srª Presidenta, quero aproveitar para parabenizá-la pela aprovação do projeto, na manhã de hoje, na Comissão de Direitos Humanos. Também quero saudar aqui todos os colegas Senadores e Senadoras.

É com imensa satisfação que ocupo, hoje, a tribuna para afirmar que vivemos no Parlamento brasileiro, esta semana, um dia histórico, com a aprovação, na última terça-feira, pela Câmara dos Deputados, da PEC 438, do ano de 2001. A PEC permite a expropriação de imóveis rurais e urbanos onde a fiscalização encontrar exploração de trabalho escravo. Esses imóveis serão destinados à reforma agrária ou a programas de habitação popular.

Passados 124 anos da abolição oficial da escravatura e após mais de 11 anos de tramitação no Congresso Nacional, enfim, a Câmara Federal, aprovou em segundo turno a Proposta de Emenda à Constituição. A votação da PEC foi possível após um acordo de líderes e depois de muita pressão dos trabalhadores que, por anos a fio, se mobilizam pela aprovação da PEC.

Desde já, quero parabenizar as centrais sindicais: a CUT, a CPT, o MST, a Contag, e tantos outros movimentos sociais que sempre estiveram à frente desta luta.

Quero cumprimentar, também, os Deputados e as Deputadas que disseram sim ao fim do trabalho escravo, votando a favor da PEC. Quero cumprimentar e elogiar, ainda, os integrantes e as integrantes da Frente Parlamentar Mista peia Erradicação do Trabalho Escravo e o Deputado Domingos Dutra que preside o grupo do qual, com muito orgulho, faço parte. A Frente, relançada no ano passado, cumpre um papel muito importante no Congresso Nacional.

A vitória dessa terça-feira, sem dúvida, é fruto do trabalho de todas e todos estes lutadores e estas lutadores e do conjunto da sociedade brasileira. Pois, isso foi o que mostrou o resultado da votação na Câmara, onde a PEC foi aprovada por 36 votos a favor, 29 contra e 25 abstenções. Ou seja, foi aprovada por ampla maioria. Foi mais uma vitória de todas e todos aqueles e aquelas que sonham e lutam por uma vida digna, fraterna e de plena cidadania.

A PEC que teve origem aqui no Senado, como sofreu modificações na Câmara Federal, retornará a esta Casa.

Prezadas Senadoras, Prezados Senadores, Srª Presidenta, quero fazer um apelo a todos e a todas para que votemos o mais rápido possível a PEC pelo fim do trabalho escravo aqui nesta Casa. Apelo, também, ao nosso Presidente Sarney, à Mesa Diretora e a todos os líderes para que coloquem a PEC na pauta de votação do Senado.

Em pleno século XXI e com o prestígio e a respeitabilidade adquiridos pelo Brasil na última década, não podemos mais conviver com práticas próprias do período medieval. É mais do que urgente que acabemos com o trabalho escravo em nosso País. Se queremos, e é claro que nós queremos, uma vida digna, fraterna e de plena cidadania para todos os brasileiros e todas as brasileiras temos que colocar fim ao trabalho escravo.

Aprovar a PEC 438 significa vitória do Parlamento e uma demonstração de dignidade e respeito à vontade da sociedade brasileira. É fundamental para o Brasil erradicar o trabalho escravo. É uma demonstração ao mundo de que o Brasil não comporta mais nenhum tipo de política que leve ao trabalho análogo à escravidão.

Portanto, a luta não se encerra com a aprovação da PEC na Câmara. Vencemos mais uma importante batalha e, daqui para frente, devemos nos manter vigilantes e continuar atentos para evitar novos retrocessos e para colocar fim a essa situação a que ainda são submetidos centenas de trabalhadores e trabalhadoras de nosso País.

Dados da Organização Internacional do Trabalho, a OIT, mostram que, nos últimos seis anos, 40 mil pessoas foram libertadas em todo o Brasil de trabalhos análogos à escravidão. O levantamento, denominado de Perfil dos Principais Atores Envolvidos no Trabalho Escravo Rural no Brasil, aponta que mais de 50% desta população é composta por homens com até 30 anos e em sua maioria migrantes do Nordeste, 80% deles negros. As informações tiveram por base pesquisa realizada entre 2006 e 2007 nos Estados de Mato Grosso, Pará, Bahia e Goiás, que se encontram no topo da lista de denúncias.

De acordo com a OIT e o Ministério do Trabalho e Emprego, 50% dos registros realizados entre os anos de 1995 e 2011 estavam concentrados no Pará. No mesmo período, Mato Grosso registrou 30% das denúncias. Para a OIT, os negros e as negras estão mais vulneráveis ao trabalho escravo devido à situação de miséria a que, muitas vezes, são expostos.

A falta de oportunidades em empregos decentes para brasileiros e brasileiras que não possuem qualquer qualificação profissional e a relativa fragilidade das redes de proteção social os obriga a aceitarem condições precárias de trabalho em locais onde sua dignidade e liberdade são violentadas.

Nas fazendas, diariamente, são encontradas pessoas alojadas em barracos improvisados com lonas, sem banheiros ou com banheiros sem qualquer condição de higiene e funcionamento, sem água potável e com alimentação de baixa qualidade.

É nosso papel e de todas e de todos aqueles e aquelas que lutam pela afirmação e ampliação de nossa cidadania continuar na luta para libertar todos os trabalhadores e todas as trabalhadoras desta absurda e inaceitável situação.

É isso, Srª Presidente, que eu gostaria de dizer neste momento.

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT – RS) – Senadora Ana Rita.

A SRª ANA RITA (Bloco/PT – ES) – Sim, Senador Paim.

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT – RS) – Permite-me um aparte?

A SRª ANA RITA (Bloco/PT – ES) – Sim, com certeza.

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT – RS) – Senadora Ana Rita, quero cumprimentar V. Exª por trazer este tema ao plenário do Senado. Tive a oportunidade de comentar também, rapidamente, lá na Comissão de Direitos Humanos. Tenho dito o seguinte: quem não comete o crime de ter trabalhadores sob a escravidão, seja na cidade ou no campo, não tem que temer. Lamento só que foram quase 12 anos. Essa PEC começou aqui, o Senador Ademir Andrade, foi para a Câmara, volta agora e teve uma pequena melhora, porque botaram agora a palavra “urbano”, na área rural e na área urbana, não é? Consequentemente, o Senado não tem mais como voltar atrás. Ou o Senado aceita a introdução da Câmara, ou vai ter que ratificar que já votou. Por isso que não cabe mais discussão. Acho até que devemos aceitar o adendo que a Câmara colocou, que não é só na área rural e também na área urbana, como vimos recentemente em São Paulo. Por isso que estou consciente e convicto de que o Senado vai aprovar, ainda neste semestre, antes do recesso de 15 de julho, a PEC do Trabalho Escravo, para que, de uma vez por todas, a gente mostre ao mundo que no Brasil nós combatemos e estamos acabando com o trabalho escravo. Aqueles que cometeram esse crime vão ter que responder e vão ficar sabendo que, se cometerem, vão perder, sim, a sua propriedade. Parabéns a V. Exª, que é Vice-Presidente da Comissão de Direitos Humanos e tem uma posição sempre de grande satisfação para este Senador, que tem a alegria de estar naquela Comissão com V. Exª.

A SRª ANA RITA (Bloco/PT – ES) – Obrigada, Senador Paim, pelo aparte.

Acredito que esta Casa também tem a consciência de que é preciso votar urgentemente a matéria e, com a modificação, com o complemento que a Câmara fez, que melhorou e qualificou o projeto, com certeza, nesta Casa, não terá a menor dificuldade de passar. Então, acreditamos muito que possa ser aprovado o mais rápido possível.

Espero também, Senador Paim, que a sociedade brasileira saiba reconhecer o esforço de muitos Parlamentares e de muitos movimentos sociais que batalharam, durante estes onze anos, para que esta PEC seja aprovada. Então, parabéns a todos os Deputados e Deputadas Federais; parabéns a todas as entidades que lutaram, trabalharam e batalharam para que a PEC fosse aprovada. E parabéns também à Frente Parlamentar, que se empenhou muito na pessoa do Deputado Domingos Dutra, um grande lutador e batalhador desta causa. Então, parabéns a todos por essa grande vitória.

É isso, Srª Presidenta.

Muito obrigada.

A SRª PRESIDENTE (Vanessa Grazziotin. Bloco/PCdoB – AM) – Cumprimento V. Exª. Sem dúvida nenhuma…

A Srª Ana Amélia (Bloco/PP – RS) – Eu tinha pedido um aparte à Senador Ana Rita.

A SRª ANA RITA (Bloco/PT – ES) – Senadora Ana Amélia, desculpe-me.

A Srª Ana Amélia (Bloco/PP – RS) – Senadora Vanessa, peço um minuto apenas.

A SRª PRESIDENTE (Vanessa Grazziotin. Bloco/PCdoB – AM) – Fique à vontade.

A Srª Ana Amélia (Bloco/PP – RS) – Eu queria felicitar o Senador Paim pelo aparte em que sublinhou a questão de que, agora, é dado um tratamento de igualdade ao trabalho escravo ou degradante para a área rural e urbana. Essa é uma forma justa de fazer a avaliação, uma vez que nós também, na primeira audiência que tivemos na CDH para discutir essa matéria, no início da Legislatura, ano passado, ouvimos um relato dramático de trabalhadores na área da indústria têxtil de confecções, imigrantes ilegais, sendo explorados na indústria. Então, essa igualdade é muito importante do ponto de vista da justiça que foi tratada. E essas áreas urbanas serão usadas para fazer moradias populares. No caso da área rural, para assentamento. Agora, felicito V. Exª. A decisão foi democrática. O que esta Casa precisa é criar uma regulamentação que dê segurança jurídica, para dar, pelo menos, a garantia de recurso ou de defesa, quando houver.

Às vezes, do ponto de vista de um fiscal, ele pode ter argumentos que não necessariamente sejam argumentos técnicos. E, para encerrar, eu queria também dizer que, em seu pronunciamento, há o seguinte: “nas fazendas, existe trabalho escravo”. Acho que até por uma questão de justiça – e V. Exª é uma pessoa justa –, o trabalho degradante existe em algumas áreas rurais. Então, “nas fazendas” dá a ideia de que toda área rural brasileira é submetida a trabalho degradante. E não é o caso. Sei que não foi o desejo de V. Exª, mas no seu texto está “nas fazendas, existe”. Então, é preciso separar o joio do trigo. Como disse o Senador Paim, quem deve tem de pagar, mas quem não deve não pode ser injustiçado, porque a maioria dos trabalhadores e dos produtores rurais brasileiros tem compromisso com a justiça social, com a observância das leis trabalhistas e com esse cuidado com os trabalhadores. Então, essa é a observação que faço, Senadora Ana Rita, cumprimentando-a pelo pronunciamento.

A SRª ANA RITA (Bloco/PT – ES) – Obrigada, Senadora.

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