A SRª ÂNGELA PORTELA (Bloco/PT – RR) – Srª Presidenta Senadora Ana Amelia, senhores Senadores, senhoras Senadoras, as mulheres que moram, que trabalham na fronteira do Brasil com Venezuela, principalmente aquelas que vivem situação de risco, de violência sexual e doméstica, têm agora um espaço para procurar quando estiverem submetidas à condição de violência. Esse espaço foi inaugurado na última sexta feira, dia 22, no Município de Pacaraima, em Roraima.
Trata-se do Centro Binacional de Assistência a mulheres migrantes na fronteira Brasil-Venezuela. É o primeiro centro criado em fronteira com a função de acolher e assistir de forma humanizada, respeitosa e cidadã as mulheres migrantes vítimas da violência de gênero. O Centro Binacional faz parte de um acordo bilateral firmado em abril de 2010 pelo ex-Presidente Lula e pelo Presidente Hugo Chávez, da Venezuela. Esse acordo corresponde aos trabalhos bilaterais que visam a garantir a integração fronteiriça e melhorar as condições de vida das populações daquela região. No caso do Brasil, a formalização da assinatura se deu por meio da Secretaria de Políticas Públicas para as Mulheres da Presidência da República. Já no caso da Venezuela, o documento foi formalizado por intermédio do ministério do poder popular para a mulher…
a Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República e o Ministério do Poder Popular para a Mulher e a Igualdade de Gênero da República Bolivariana também integram o Comitê de Fronteira, instalado durante a inauguração deste centro na última sexta-feira.
Reafirmando a parceria entre os dois países, a vice-presidente do Instituto Nacional da Mulher da Venezuela Srª Judith Lopez Guevara considerou muito importante a instalação do Comitê de Fronteira.
Judith Lopez também reconheceu que sem essa parceria, “não chegaríamos às mulheres em situação de violência com a mesma intensidade de forma prática e mais ágil”, como afirmou em seu discurso.
Na condição de coordenadora do Grupo Parlamentar Misto Brasil-Venezuela, venho a esta tribuna externar meu contentamento com a efetivação tanto do Centro Binacional de Assistência a Mulheres Migrantes na Fronteira Brasil – Venezuela, como com a formação do Comitê de Fronteira.
Estou feliz, Senhoras e Senhores, porque vejo se concretizar algo cujo processo acompanhei ao longo dos anos. Estive presente à solenidade de assinatura do memorando de entendimento da criação do centro binacional.
Lembro que para equipar o centro bilateral, a Secretaria de Política para Mulheres arcou com investimentos da ordem de R$101 mil para compra de computadores e mobiliário, aquisição de automóvel e custeio de despesas com aluguel.
Lembro, também, que Secretaria de Política para Mulheres assumiu a responsabilidade de capacitar profissionais para atuar no Centro. A capacitação se deu no último mês. Na
oportunidade, profissionais receberam conhecimento sobre relações de gênero, conceito de violência, tratados internacionais, diversidade das mulheres e as políticas de enfrentamento à Violência contra as Mulheres, ao tráfico de pessoas e sobre a Lei Maria da Penha.
Manifesto-me, portanto, em cumprimento ao objetivo do Grupo Parlamentar Misto Brasil-Venezuela iniciativas, no âmbito do Legislativo, com vistas a aproximar os dois países e superar dificuldades nas relações binacionais.
Mas manifesto-me, principalmente, porque compreendo que a existência do centro binacional representa uma grande conquista para as mulheres da região fronteiriça, do lado do Brasil, em Pacaraima e do lado da Venezuela, em Santa Elena do Uairén.
Há tempos
Há tempos, essas cidades requeriam a existência de um centro binacional de atendimento às mulheres migrantes que são vitimadas pela violência local.
Localizada em região de fronteira, Pacaraima e Santa Helena do Airen têm trânsito frenético de pessoas e carros, um intenso movimento comercial. Na fronteira Brasil-Venezuela, pode-se elencar uma série de problemas socioeconômicos, que vão desde o transporte de cargas do Brasil para a Venezuela sem documentação até o contrabando de combustíveis e de mercadorias, o tráfico de drogas e o tráfico de mulheres para a prostituição.
O tráfico de mulheres para a prostituição é, sem dúvida nenhuma, Srs. Senadores, o problema mais grave. São meninas e adolescentes que são aliciadas com a promessa de obter emprego fácil e bem remunerado em outros países.
A realidade é que essas meninas e adolescentes, em vez de estarem na escola, acabam sendo vítimas da prostituição, da exploração sexual, do cárcere privado e até do trabalho escravo.
As redes internacionais de exploração sexual para fins comerciais, crime que ultrapassa a fronteira, são temas que estão nas agendas mundiais, seja da Organização Internacional do Trabalho, a OIT, seja de outros organismos que o combatem. Governos lutam contra o problema e acadêmicos também estudam suas causas e consequências.
Nesta Casa, o Congresso Nacional, no nosso Senado Federal, também há uma comissão parlamentar de inquérito de tráfico de pessoas, sob o comando das nossas colegas de Parlamento Vanessa Grazziotin e Lídice da Mata.
Atuando juntamente com Ministros de Estado, entre os quais a Ministra de Políticas para as Mulheres, Srª Eleonora Menicucci, essa CPI investiga as causas, consequências, rotas e responsabilidades por esse crime.
No Brasil, estudos acadêmicos apontam Roraima, o nosso Estado, como um dos principais eixos da rota internacional do tráfico de pessoas, via BR-174, de Manaus para Boa Vista, seguindo para Pacaraima, a caminho da Europa.
Fatores geográficos, econômicos, sociais, culturais e populacionais propiciam o fenômeno do tráfico de pessoas e da intensificação da violência contra as mulheres na região.
Do ponto de vista demográfico, Pacaraima tem mais de 15 mil habitantes e Santa Helena do Airen, mais de 29 mil. Juntas, as duas cidades formam uma população de mais de 45 mil pessoas, que, diariamente, convivem com estrangeiros, viajantes, turistas, taxistas, comerciantes e traficantes de pessoas e de drogas.
Marcada pelo intenso fluxo das pessoas que se deslocam para Santa Elena de Uairén para fazer compras, Pacaraima é lugar propício para o mercado ilícito do câmbio e do combustível, como descrito em um estudo acadêmico realizado pela universidade federal:
Caminhões e carros enfileirados em busca de combustível mais barato, casas que atuam clandestinamente na venda de gasolina e a forte presença de mulheres, que chegam e saem de Pacaraima com os caminhoneiros e carros que abastecem na fronteira, constituem o cenário da fronteira Brasil–Venezuela.
É nesse cenário que a exploração sexual se constitui, propiciando tráfico de mulheres, como se observa em outro trecho do trabalho acadêmico:
As casas noturnas e prostíbulos que apresentam shows de strip-tease e outros tipos de “entretenimento” são comuns em Pacaraima e Santa Elena. Sobretudo, turistas e caminhoneiros. Em Santa Elena, na Venezuela, esse segmento da prostituição fechada é maior que em Pacaraima, tendo na sua maioria mulheres brasileiras.
A afirmação da Secretária Nacional de Políticas para as Mulheres, Aparecida Gonçalves, confere crédito ao estudo, como podemos ver. Ela diz:
Nas fronteiras secas, as mulheres saem de moto ou de carro e vão para o outro país fazer programa, sejam as brasileiras na Venezuela, sejam [as mulheres] da Venezuela no Brasil. Aí nós vamos ter um alto índice de violência, um alto índice de problemas de saúde, seja saúde sexual, DST/Aids, sejam outros tipos de doença. São essas perspectivas que fazem com que se proponham políticas públicas de atendimento às mulheres.
Além da Venezuela, a proximidade geográfica com a Guiana, bem como a facilidade de circulação por essas fronteiras fizeram com que Roraima se transformasse em uma rota de tráfico internacional de mulheres.
A Secretária de Assistência Social de Pacaraima, Marcela Pacheco, também deu seu parecer sobre tão importante momento, dizendo: “Por sermos uma região de fronteira, temos uma peculiaridade. Lidamos com mulheres estrangeiras, indígenas e brasileiras em situação de violência.”
É nesse cenário de contrabando de mercadorias, mercado de drogas e de tráfico de pessoas que o fenômeno de violência contra as mulheres se intensifica.
O Brasil, como sabemos, aparece no Mapa da Violência de 2012 em 7º lugar entre os 87 países que mais matam mulheres. Aqui, senhoras e senhores, a cada 5 minutos, uma mulher é agredida, perfazendo 4,4 assassinatos de mulheres em cada grupo de 100 mil.
Esse mapa mostra que, entre 1980 e 2010, aproximadamente 92 mil mulheres foram assassinadas.
No Mapa da Violência de 2012, Roraima aparece em 13º lugar entre as unidades federativas mais violentas, com uma taxa de homicídio de mulheres da ordem de 5 por 100 mil.
Empenhada no combate à violência doméstica e sexual e também atenta à situação da fronteira Brasil-Venezuela, que comunga, a um só tempo, comércio e violências, já fiz várias gestões nos órgãos federais – nacionais e internacionais.
Por várias vezes conversamos com o Embaixador da Venezuela no Brasil, o Sr. Maximilien Arvelaiz, a quem pedi atenção para a construção dos Centros de Referência para o combate à violência contra a mulher e ao tráfico internacional de pessoas.
Atuando diretamente sobre a estruturação das administrações brasileiras, apresentamos emendas ao Plano Plurianual de Investimentos (PPA 2008/2011), à Lei de Diretrizes Orçamentárias e ao Orçamento da União para que Estados e Municípios criem a infraestrutura necessária à aplicação da Lei Maria da Penha.
No PPA, colocamos emendas para a criação dos Centros de Perícia Médico-Legal Especializados no Atendimento à Mulher Vítima de Violência Doméstica e Familiar, implantação dos Núcleos de Defensoria Pública Especializada e inclusão de mulheres em situação de violência como público-alvo do Pronasci – Programa de Segurança Pública com Cidadania.
Conseguimos, ainda, recursos para o Projeto Mulheres na Luta Contra a Violência em Roraima. Esse projeto tem como foco principal a formação de mulheres camponesas, que devem atuar como multiplicadoras na conscientização de todas as práticas violentas e divulgar a Lei Maria da Penha.
Lutamos por recursos para capacitar profissionais que atendem mulheres em situação de violência, além de qualificar e esclarecer mulheres do campo em relação à Lei Maria da Penha.
Relatamos e fomos autora de emendas destinadas a beneficiar mulheres em situação de vulnerabilidade ou de risco de vida.
Agora estou muito feliz com o fato de termos o Centro Binacional de Assistência a Mulheres Migrantes na fronteira Brasil–Venezuela e com a formação desse Comitê de Fronteira. O Centro Binacional é o primeiro e, com certeza, irá desencadear a criação de outros, afinal, os problemas de fronteira são todos iguais. Eles se parecem.
Estou feliz também porque sei que, daqui para frente, teremos mais vozes e equipamentos para combater a violência doméstica e de gênero, um fenômeno que não existe apenas no Brasil e que, por isso mesmo, requer muita união, parceria e ações afirmativas dos três Poderes de Governo: do Poder Executivo, do Legislativo e do Judiciário.
Era o que eu tinha a dizer, o que tinha a registrar neste momento, Srª Presidenta e Srs. Senadores.
Muito obrigada.