A SRª ANGELA PORTELA (Bloco/PT – RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Sr. Presidente, Senador Anibal Diniz, Srªs e Srs. Senadores, ao longo dos últimos dias, temos visto as notícias na grande imprensa nacional e na imprensa do meu Estado de Roraima sobre uma prática abominável em nosso País: trata-se do tráfico de pessoas, do tráfico de seres humanos, seja em regiões de fronteiras, como é o nosso caso lá em Roraima, na fronteira com a Guiana, seja nas grandes metrópoles de cidades como Fortaleza, Salvador, e outras capitais do nosso País.
O tráfico de pessoas, Srs. Senadores, é a prática de recrutamento, transferência, transporte, alojamento ou acolhimento de pessoas para a exploração sexual, para o trabalho ou serviços forçados, de escravatura ou práticas similares à escravatura, de servidão ou de remoção de órgãos, conforme a Convenção de Palermo.
Para o êxito de tal prática, recorre-se a ameaças, ao uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridades frente a uma situação de vulnerabilidade, entrega ou aceitação de pagamentos a exploradores.
Dados da Pesquisa sobre Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes para Fins de Exploração Sexual Comercial no Brasil, da ONU, revelaram a existência de 241 rotas de tráfico de pessoas, sendo 110 relacionadas ao tráfico interno, intermunicipal e interestadual, e 131 ligados ao tráfico internacional. Essa pesquisa dá conta de que as regiões mais pobres do Brasil apresentam maior concentração de rotas do tráfico de pessoas.
Neste triste cenário, a Região Norte, a nossa região, tem a maior concentração de rotas do País. São 76 rotas no Norte, 69 no Nordeste, 35 no Sudeste, 33 no Centro-Oeste, e 28 no Sul do País.
E nós, brasileiros e brasileiras que vivemos em Boa Vista, a nossa capital de Roraima, somos vítimas desse fenômeno dos nossos tempos, na fronteira entre Boa Vista e a capital da República da Guiana, Georgetown.
Neste final de semana, Senador Mozarildo, notícia veiculada nos principais meios de comunicação do nosso Estado – e aqui eu quero destacar o jornal Folha de Boa Vista– informou que a Polícia Federal ouviu o depoimento de uma mulher, vítima do tráfico internacional de seres humanos.
A mulher acusou Selwyn Lewys, DJ de uma boate em Georgetown, de aliciar brasileiras para o tráfico internacional de seres humanos. A Polícia Federal comunicou o fato à Justiça da Guiana que, de imediato, expediu mandado de prisão contra o acusado.
De acordo com a vítima, ao iniciar seu trabalho como prostituta na Boate Red Dragon, teve seu passaporte retido pelo DJ, a exemplo do que era feito normalmente com outras mulheres que eram recrutadas por ele em Manaus e em Boa Vista.
Como ocorre em casos de trabalho escravo, as mulheres já chegam para trabalhar na boate com uma dívida para pagar, decorrente dos custos de passagem e hospedagem.
Os aliciadores também retêm o passaporte das pessoas que recrutam, para impedir que elas empreendam fuga e, ao mesmo tempo, para exigir o pagamento das dívidas, que elas não contraíram.
No caso revelado e divulgado amplamente na imprensa de Roraima, o guianense aguarda julgamento, enquanto a Polícia da Guiana e a Polícia Federal buscam novas provas que garantam sua condenação e a de outras pessoas mencionadas pela vítima em sua denúncia.
Relatos colhidos de pessoas que não podem aparecer revelam que, no mercado do tráfico de seres humanos, uma menina vale cerca de R$1.500, para fins de exploração sexual, em Roraima. Se for menor de 18 anos e sem experiência no mercado do sexo, a menina vale ainda mais. As meninas traficadas, geralmente com idade entre 12 e 17 anos, são levadas para prostíbulos em Manaus ou para o Suriname.
A distância entre Boa Vista, nossa capital, e Georgetown é de 641 quilômetros. É, portanto, uma distância menor do que a que separa nossa capital de Manaus, no Amazonas.
Roraima, que faz fronteira com vários países, como Venezuela e Guiana, tem uma relação comercial com a Guiana. Pelos portos de Linden e de Georgetown, prevê-se uma intensa movimentação com a exportação de mercadorias para a Europa e para os Estados Unidos.
Aqui no Congresso Nacional, no Senado Federal, a Comissão Parlamentar – mista – de Inquérito do Tráfico Nacional e Internacional de Pessoas debate o problema social e diplomático. A Senadora Vanessa Grazziotin, que preside essa CPI, defendeu a criação de uma lei sobre o tráfico de pessoas que vá além do plano nacional de enfrentamento ao tráfico de pessoas, que tem força de lei por ser um decreto presidencial assinado por vários ministros.
Pensando como minha colega Vanessa Grazziotin, também considero que a legislação atual requer completude. Como integrante da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa, penso que devemos mostrar a esses criminosos que um país decente se faz com punição a todo tipo de crime, particularmente os crimes hediondos, como o tráfico de pessoas, sejam eles de crianças, adolescentes, mulheres.
O tráfico de pessoas, sabemos todos nós que não é uma prática, não é uma novidade. Mas não podemos mais continuar assistindo às denúncias se sucederem umas às outras sem que tenhamos como dar um basta a uma prática tão hedionda quanto o tráfico de pessoas.
Por isso, Sr. Presidente, para encerrar minhas palavras, gostaria de destacar aqui a denúncia feita em meu Estado de Roraima, que só tem a nos preocupar como representante do Parlamento e como representante do nosso Estado de Roraima, no sentido de tomarmos a iniciativa de coibir essa prática tão abominável, que é o tráfico de crianças, adolescentes e mulheres para a exploração e o abuso sexual.
Concedo o aparte ao Senador Mozarildo Cavalcanti.
O Sr. Mozarildo Cavalcanti (Bloco/PTB – RR) – Senadora Angela, é muito importante que V. Exª esteja fazendo essa denúncia neste momento, porque parece até que estamos assistindo à novela, que está passando, Salve Jorge, em que várias mulheres foram levadas para outro país dessa forma. Imagina lá no nosso Estado de Roraima, em que a fronteira é seca, tem uma rodovia que nos une tanto com a Guiana como com a Venezuela. E inclusive há notícias de que há uma rota de tráfico internacional vindo de outros países, passando pelo Brasil. Isso mostra a necessidade de uma política decente para as nossas fronteiras, reforçando os quadros da Polícia Rodoviária Federal, da Polícia Federal, e aparelhando melhor, inclusive, essas duas instituições. De fato, se não há outros mecanismos de Estado no sentido de não deixar vulneráveis essas pessoas, sejam jovens ou pessoas mais idosas, pela falta de opção de trabalho ou pela oferta de um trabalho que não existe, mas que, na verdade, se transforma nisso que V. Exª falou, eu quero dizer que é preciso, de fato, que olhemos mais para as nossas fronteiras terrestres e que tenhamos uma política mais adequada de reforço e de proteção, além de outras políticas sociais que se fazem necessárias em um caso como esse. Portanto, parabéns pelo assunto que aborda.
A SRª ANGELA PORTELA (Bloco/PT – RR) – Obrigada, Senador Mozarildo. Eu quero compartilhar com a sua preocupação. Sem dúvida alguma, é necessário o fortalecimento da Polícia Federal, no sentido de ampliar os quadros existentes, porque nós temos duas fronteiras: a fronteira com a Venezuela e a fronteira com a Guiana. Ambas apresentam esse tipo de problema, além do tráfico de armas e de combustível. Então, gostaríamos também de lembrar que, no Programa de Desenvolvimento da Faixa de Fronteira, poderiam ser incluídas ações no sentido de fortalecer, de coibir o tráfico de pessoas, o tráfico de armas e também o descaminho de combustível, que é uma prática muito comum, principalmente na fronteira do Brasil com a Venezuela.
Na fronteira com a Guiana, o senhor sabe muito bem, existe uma fragilidade muito grande. Então, as jovens, as meninas que saem para serem usadas no tráfico internacional, nacional e intermunicipal têm uma facilidade imensa de passar da Guiana para o Brasil e do Brasil, de Bonfim, para Georgetown. É uma facilidade imensa. Então, queremos fazer essa denúncia, reforçar a necessidade de implementação de ações dentro do Programa de Desenvolvimento da Faixa de Fronteira, fortalecendo o aparato do Estado, da Polícia Rodoviária Federal, que, em nosso Estado, não tem efetivo suficiente para fiscalizar as nossas estradas federais, e também a Polícia Federal.
Há necessidade de um remanejamento, de um quadro maior de delegados da Polícia Federal, de agentes da Polícia Federal. Nós temos conhecimento de que existe um número considerável de agentes saindo da Academia para serem distribuídos nas superintendências das Polícias Federais do nosso País. Então, queremos aqui reforçar o pedido para que olhem para as fronteiras Brasil-Guiana e Brasil-Venezuela.
Era isso, Sr. Presidente.
Muito obrigada.