Senador Suplicy relata caso da doença – o mieloma múltiplo – na família e solicita esclarecimentos.
Segundo a ANVISA, a liberação do medicamento |
Um impasse muito comum na Saúde brasileira foi tema de debate na Comissão de Assuntos Sociais (CAS) do Senado: a ausência de registro, no País, para a comercialização de um novo medicamento para tratamento de uma doença grave, fatal e com sérios comprometimentos para a qualidade de vida do paciente está sendo usado com sucesso no Exterior.
Sem registro, segundo a lei, o medicamento não pode ser vendido no Brasil e muito menos incluído na lista de medicamentos adquiridos pelo Governo para serem fornecidos aos pacientes por meio do Sistema Único de Saúde (SUS).
A questão é polêmica, porque ainda que os pacientes estejam de fato defendendo seu direito à vida, há também um interesse econômico concreto por parte da indústria farmacêutica. Órgãos de fiscalização já detectaram que várias associações de pacientes são financiadas por laboratórios, interessados na liberação de medicamentos que produzem.
No centro da polêmica, quase sempre apontada como responsável pelo atraso nas liberações de novas drogas, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Como exemplo, os participantes da audiência pública tomaram conhecimento das dificuldades que a lenalidomida enfrenta para ser encontrada e empregada no Brasil, apesar do propalado êxito divulgado por seu fabricante, no tratamento de um tipo de câncer que acomete cerca de
A doença, segundo Angelo Maiolino, médico hematologista do Comitê Científico Médico da Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia (Abrale), a doença não tem cura, mas apenas tratamento. “É uma doença com grande morbidade”, explicou. Morbidade é o termo científico para definir os sintomas associados à uma doença. No caso do Mieloma Múltipo, esses sintomas incluem crises renais, dores e fragilidade óssea.
Polêmica
O requerimento para registro do medicamento à base de lenalidomida – medicamento que, supostamente, é a forma mais moderna para o tratamento da doença foi indeferido em 2010 pela Anvisa. No dia 28 de dezembro de 2012, uma nota da Agência explicou que a autorização para comercialização do remédio foi negada porque a avaliação dos riscos de sua utilização e dos benefícios que ele traz foram inconclusivos.
A nota explica que a concessão ou não do registro, a gerência de medicamentos da Anvisa foi precedida de consulta Ad Hoc ao Instituto Nacional de Câncer (INCA), à Câmara Técnica de Medicamentos da Anvisa (Cateme), composta por especialistas externos, e ao Conselho Nacional de Saúde que é composto por usuários, trabalhadores e gestores do Sistema Único de Saúde (SUS). Segundo o documento, o INCA não apontou melhorias no tratamento do Mieloma Múltiplo com uso da lenalidomida.
Além disso, a Cateme se manifestou contrária ao registro do medicamento diante da ausência de dados que demonstrassem a superioridade
Senador Suplicy relatou caso da doença de |
da lenalidomida em relação ao tratamento já adotado no país. Ou seja, na opinião da área técnica responsável pelo registro de medicações, o medicamento não traria vantagens em relação ao tratamento que já é utilizado no Brasil, à base de talidomida.
Também o Conselho Nacional de Saúde, por meio da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), se posicionou contrariamente à concessão do registro para o medicamento contendo lenalidomida.
O laboratório pretendia registrar o produto como mais uma opção de tratamento de 2º nível (utilizada após o tratamento com o medicamento de 1º nível). No Brasil, em situações como essa, a Anvisa exige estudos clínicos de eficácia e segurança cujo desenho comprove que o novo medicamento tenha, no mínimo, um perfil terapêutico igual ao produto existente no mercado para a mesma indicação.
Ainda de acordo com a Anvisa, o registro do medicamento contendo lenalidomida foi negado porque a empresa que pediu o registro apresentou um estudo clínico comparando seu produto com tratamento envolvendo o uso de placebo (produto sem nenhuma ação farmacêutica) e não a outro com igual indicação terapêutica já existente no mercado brasileiro desde 2005. “Também não foi apresentado um Plano de Riscos consistente para o medicamento, considerando que seus efeitos são semelhantes aos da Talidomida (risco de má formação fetal)”, diz o documento.
Conclui a nota: “ A Anvisa trabalha para fazer chegar ao mercado produtos inovadores que representem ganhos para a saúde da população, no entanto nenhum medicamento pode ser registrado com dúvidas sobre o seu desempenho terapêutico, cabendo aos laboratórios interessados no registro a apresentação de estudos que sustentem os adequados níveis de eficácia e segurança de seus medicamentos”.
Caso na família
Pacientes e portadores da doença participaram do debate de hoje e relataram ter importado o medicamento a preços altíssimos. Um deles contou que chegou a vender um carro para custear o tratamento.
A senadora Ana Amélia (PP-RS), autora do requerimento para a realização do debate relatou o caso de uma médica que está respondendo a processo porque receitou a medicação para um paciente.
O senador Eduardo Suplicy (PT-SP) convive de perto com o mieloma múltiplo. Ele relatou que o outro avô de uma de suas netas foi diagnosticado com a doença. “Depois de ouvir o relato de todo o sofrimento dele e depois de saber que outros países já liberaram a utilização desse medicamento e que ele poderia custar muito menos se não precisasse ser importado, eu queria entender melhor essa questão”, disse.
No final da sessão, os senadores apelaram à Anvisa para que fizesse uma nova avaliação sobre a concessão do registro.
Veja a nota da Anvisa:
Giselle Chassot