10 de dezembro de 2016
Em seminário promovido na Casa de Portugal, em São Paulo (SP), a presidenta eleita do Brasil, Dilma Rousseff, e a ex-presidenta da Argentina, Cristina Kirchner, debateram na noite de sexta (9) sobre o tema “A luta política na América Latina hoje”. Organizado pela Fundação Perseu Abramo (FPA), o evento, que abriu o seminário “Nossa America Nuestra”, atraiu centenas de pessoas. A bancada foi formada apenas por mulheres. Além de Dilma e Cristina, havia a presença da secretária de Relações Internacionais do PT, Monica Valente, e da vice-presidenta da FPA, Iola Ilíada.
“Hoje é uma mesa feminina e feminista”, conclamou Dilma, para aplausos da plateia que lotava a Casa de Portugal. Logo depois, a presidenta eleita, e destituída por conchavos políticos comandados pelo golpista Michel Temer, criticou o crescimento atual do neoliberalismo na América Latina após uma sequência de governos populares e democráticos.
Ela também destacou a distribuição de renda promovida pelos governos dela e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e apontou para o futuro da luta política da esquerda no Brasil. “Numa primeira etapa, nós atacamos o problema da distribuição de renda. Mas não conseguimos combater a concentração de riqueza em nosso País, que seria uma segunda etapa. Esse seria, e será, o nosso próximo objetivo”.
Dilma lembrou que, em seu governo e de Lula, houve a política de valorização do salário mínimo, o acesso a casa própria para milhões de brasileiros, além da valorização de ações educacionais, como a lei de cotas, o Prouni, o Fies, a formação técnica, entre outras medidas.
Sobre o seu processo de impeachment, Dilma afirmou que o início da crise se deu após sua reeleição. Seus adversários, explicou a presidenta eleita, não aceitaram os resultados democráticos das urnas e pediram a recontagem de votos e o seu não empossamento.
Após tomar posse, porém, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) se tornou presidente da Câmara dos Deputados, a quem define como “neoliberal na economia e conservador nos direitos civis”. “Mas se fosse só o Cunha o problema, estava bom, estava ótimo… O grande problema era o grupo de apoio ao Cunha”, afirmou a presidenta.
Para ela, um dos objetivos principais do golpe é completar o trabalho que foi deixado interrompido pelo governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). “Ele não conseguiu privatizar a Petrobras, a Eletrobras, e ‘virar a página do Getúlio’, ou seja, acabar com os direitos trabalhistas”.
Dilma elogiou a luta dos estudantes secundaristas, que tomaram centenas de centros educacionais pelo Brasil para combater as medidas contra a educação de Temer. “Jovens ocupam escolas, para lutar por seus direitos, e são tratados com dureza e repressão. Mas quando um grupo invade o Congresso para pedir a volta da ditadura militar, é tratado com brandura”.
Por fim, a líder petista criticou fortemente diversas medidas do governo Temer, como a PEC 55, a reforma da Previdência, e a indicação de retiradas de direitos trabalhistas. Ela também sentenciou quais são as duas medidas emergenciais para trazer o País de volta à normalidade democrática: “Eleições diretas e reforma política”.
As transformações de Kirchner
“Querida Dilma Rousseff, presidenta legítima da República Federativa do Brasil”, começou Cristina Kirchner, provocando aplausos entusiasmados da plateia. Depois, a ex-mandatária criticou a volta do neoliberalismo no continente após 15 anos de “governos nacionais, populares e democráticos que marcaram definitivamente a vida do continente”.
“O neoliberalismo é uma doença que se transmite por várias vias: uma é cultural; a outra, midiática”, sentenciou. “Mas não devemos ficar tristes pelos retrocessos. Esse período marcou definitivamente a vida da América Latina”.
Há um ano, lembrou a ex-presidenta, se finalizava o seu segundo e último mandato, que definiu como o período de crescimento mais extenso e continuado, com inclusão social, da sua nação.
Ela deixou a presidência com o índice de desemprego entre os menores do país vizinho em décadas: 5,9% da população ativa. Seu governo e de seu marido, Nestor Kirchner, provocaram uma mobilidade social ascendente na Argentina, explicou. “De uma tal maneira que a pobreza deixou de ser uma condição hereditária. Os trabalhadores puderam sonhar em mandar seus filhos às universidades e ter sua casa própria, seu carro e suas férias”.
Ela lembrou que, no começo do século, o Fundo Monetário Internacional (FMI) intervia na Argentina como na época das colônias, e isso foi se transformando ao passar do tempo, como ocorreu no Brasil. Por fim, criticou o presidente argentino atual, Mauricio Macri. “Ele pode destruir tudo o que construímos em tantos anos”.
Volta do neoliberalismo
A secretária de Relações Internacionais do PT, Monica Valente, afirmou que ambas as presidentas melhoraram bastante a vida das suas nações. “Muito devemos às duas pelas transformações positivas ocorridas no Brasil e na Argentina”, disse.
Ela também destacou que tanto Dilma quanto Kirchner estiveram na luta por uma sociedade mais justa desde a juventude e que, com elas, ambos os países conseguiram resgatar a justiça social e o papel do estado no desenvolvimento econômico.
A volta do pensamento neoliberal na América Latina também foi criticada pela secretária. Em especial, como exemplo, destacou a reforma da Previdência proposta pelo governo ilegítimo de Temer. “Esse governo busca criar um mercado cativo para a previdência privada”.
O evento foi apoiado pelo PT, o PCdoB, a Central Única dos Trabalhadores (CUT), a Fundação Maurício Grabois, a Fundação Rosa Luxemburgo, o Insituto Nacional Hamilton Cardoso e o Conselho Latino Americano de Ciências Sociais (Clacso).
Por Bruno Hoffmann, para a Agência PT de Notícias