Um despacho do presidente interino do Senado, o tucano Cássio Cunha Lima (PB), atropelou o consenso que vinha se formando na casa sobre a tramitação da reforma trabalhista e causou polêmica. Cunha Lima, que está no cargo até amanhã, quando está previsto o retorno do titular, Eunício de Oliveira (PMDB-CE), decidiu remeter a matéria à apreciação de apenas duas comissões temáticas — Assuntos Econômicos e Assuntos Sociais– surpreendendo até mesmo a aliados próximos ao deixar de fora a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
A decisão gerou apelos e protestos à direita e à esquerda. Além da bancada do PT, que em peso defendeu que o interino reconsiderasse a seu despacho, parlamentares do PMDB, REDE, PSD e PSB também se manifestaram contrários ao ato de Cunha Lima.
Correria
“Como é que pode uma matéria dessa natureza passar pelo Senado sem ser apreciada pela CCJ? Esse é um ponto inegociável para nós”, protestou o senador Lindbergh Farias (PT-RJ), resumindo a perplexidade que a decisão do interino causou no plenário do Senado. A CCJ, lembrou Humberto Costa (PT-PE), é o colegiado que tem a atribuição de analisar a constitucionalidade e a juridicidade de todas as propostas que passam pelo Senado. A praxe da Casa é que todas as matérias relevantes e de maior impacto passem pelo crivo da comissão.
A líder do PT, Gleisi Hoffmann, destacou que a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) — que a reforma trabalhista pretende desmontar — tem a mesma natureza dos códigos em vigor no país, como o Civil e o de Processo Civil e não teria cabimento a proposta passar ao largo de uma análise jurídica. Fátima Bezerra (PT-RN) lembra que a matéria praticamente extingue a Justiça do Trabalho. “Como é que a CCJ não vai avaliar uma coisa dessas?”.
Para os senadores petistas, que protestaram em bloco contra a decisão do interino, o que está ocorrendo é uma tentativa de apreciar o projeto na correria. “Nós não podemos repetir o erro da Câmara dos Deputados, que decidiu sobre essa proposta de maneira açodada, sem respeito pelos trabalhadores. Propostas com o impacto dessa reforma precisam ser avaliadas com responsabilidade”, lembra Gleisi.
A reforma trabalhista começou a tramitar no Senado nesta terça-feira como PLC 38/2017, depois de ser aprovada em regime de urgência naquela Casa.
CCJ e Direitos Humanos
A Bancada do PT defende que antes de chegar ao plenário a reforma trabalhista passe pelas comissões de Assuntos Econômicos (CAE), Assuntos Sociais (CAS), Constituição e Justiça (CCJ) e Direitos Humanos (CDH), para que seus impactos possam ser cuidadosamente analisados e debatidos a partir desses ângulos — com a participação dos trabalhadores, os principais afetados, mas também com empregadores, estudiosos e técnicos.
Desde a semana passada, já era dada como certa a tramitação do PLC 38 em pelo menos três comissões—CCJ, CAE e CAS—entendimento confirmado nesta terça-feira pelo líder do Governo, Romero Jucá (PMDB-RR) e pelo presidente da CAE, Tasso Jereissati. A decisão de Cunha Lima de remeter a matéria a apenas dois colegiados foi, portanto, recebida com muita surpresa.
Além de tramitar na CCJ, proposta que as falas em plenário sugerem ser amplamente majoritária, os petistas insistem que a reforma trabalhista passe pela Comissão de Direitos Humanos. O projeto, ressaltam eles, pretende alterar radicalmente as condições de trabalho no País. “Mexe na situação das mulheres grávidas, no tamanho do horário do almoço, na proteção das vítimas dos acidentes de trabalho”, lembra Paulo Paim (PT-RS).
Para Jorge Viana (PT-AC), é essencial que a reforma trabalhista passe também pela CDH e CCJ. “Já há um questionamento sobre a legitimidade do governo. Não é possível apressar matérias que mexem na vida do País, na vida dos brasileiros”, defendeu.