ARTIGO

Belém 1.7 grau, por Beto Faro

A COP 30 ocorreu em um momento de erosão do sistema multilateral num contexto de desarranjos estruturais na geopolítica global

Alessandro Dantas

Belém 1.7 grau, por Beto Faro

A COP 30 acabou. Foi mantida a tradição histórica das COPs que jamais entregaram tudo o que delas se espera. A COP do Clima no Brasil não entregou tudo, mas ficou longe de ter sido um fracasso.

Como fator limitante comum que costumam frustrar as expectativas das COPs sobressai a exigência de decisões homologadas por todas as partes, ou seja, as decisões das COPs devem ter o endosso de 195 países.

Não bastasse, a COP 30 ocorreu em um momento de erosão do sistema multilateral num contexto de desarranjos estruturais na geopolítica global. Sentimos falta de liderança entre as grandes economias mundiais que são os grandes vilões das emissões, e que, portanto, devem assumir a responsabilidade pelo financiamento do clima.

Temos o distanciamento dos EUA que no atual governo, colocaram organizações multilaterais, na lona, a começar pela própria ONU e OMC, e que romperam com o Acordo de Paris. De outra parte, a COP 30 testemunhou a tentativa de maior liderança por parte da União Europeia que, todavia, na presente quadra histórica, não dispõe de peso político para tal. Por último, temos a China, uma superpotência econômica com enorme potencial de liderança em temas globais, mas que, guiada por estratégias que só os chineses entendem, se mantém passiva nas disputas geopolíticas globais.

Fato é que para dezenas de países e a totalidade das organizações ambientalistas, a grande frustração da COP 30 foi a inviabilização do chamado “mapa do caminho” da transição dos combustíveis fósseis e, também, o do desmatamento. Essas propostas feitas pelo governo Lula, com grande adesão internacional, caso tivessem sido aprovadas, teriam marcado a COP 30 como o ponto de inflexão definitivo para a contenção do aquecimento do planeta.

De todo modo, a presidência brasileira da COP 30, que se estenderá até 1º de dezembro de 2026, irá manter essas propostas na agenda de discussões entre os países. É bem possível que ainda nesse período, principalmente o mapa do caminho dos combustíveis fósseis passe a constituir objeto de adesão voluntária por vários países. Com o intuito de reafirmar e consolidar o compromisso do Brasil com essa pauta, nosso mandato vem discutindo proposta de projeto de Lei estabelecendo o mapa do caminho dos combustíveis fósseis e o do desmatamento.

Pretendemos manter os debates e, idealmente, darmos força de Lei a esse objetivo estratégico, com a ambição, também, de inspirar outros países a legislações da espécie. As terríveis ameaças ao clima exigem compromissos de descarbonização com essa força. Ressalvadas as “expetativas frustradas”, entre as quais, os recursos para o financiamento do clima, concordo com a marca da COP 30 como a COP da adaptação. A agenda da adaptação, que inicia já em 2026, ademais de ter rompido as resistências à triplicação dos recursos, teve consenso sobre os 59 indicadores da Meta Global (GGA) que irão orientar o monitoramento do avanço das ações de adaptação.

Este espaço não comportaria o resumo dos principais avanços obtidos na COP 30. Porém, especificamente para o Brasil, temos a comemorar, afora a reafirmação do protagonismo do país nesse tema, e o reconhecimento do mundo ao papel da Amazônia nos desafios do clima, a conquista de valiosos instrumentos. Cito a iniciativa global para a recuperação de áreas degradadas (Raiz) inspirada no programa brasileiro caminho verde, que reabilitará para o circuito produtivo, com sustentabilidade, cerca de 1 bilhão de hectares de terras ao redor do mundo.

O TFFF, crucial para a Amazônia e seus povos, conquistou adesões gigantescas e o nosso Plano Clima será lançado em breve. Em resumo, Belém “não entregou” a meta de 1.5º C, mas também, mas não a deixou degringolar para 2ºC. Acho que ficamos em 1.7ºC, deixando extraordinário legado para a Turquia, afora os legados também extraordinários para Belém.

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