Domingo passado publicamos artigo neste espaço para comemorar o fato de o presidente Lula passar a se envolver diretamente no debate sobre causas e soluções para a trajetória persistente de pressão nos preços dos alimentos. Claro que desde o seu início o governo vem agindo para contornar esse problema que afeta duramente, em especial, as populações economicamente mais carentes. Porém, a entrada em cena do presidente representou um necessário up grade no tratamento político dispensado a esse assunto que integra o rol das maiores prioridades do governo.
É absolutamente essencial a atuação sem limites do governo para enfrentar a inflação da comida, pois, da sua eficácia, depende não apenas o crescimento sustentável da economia, mas, sobretudo, a viabilização do compromisso virtuoso do governo pela elevação do padrão de vida de todo o povo brasileiro. A segurança alimentar e nutricional é um dos grandes desafios em escala global.
Talvez, a compreensível e legítima pressa do governo por medidas para a recuperação da renda e do emprego não tenha sido acompanhada de ações, no porte exigido, para o restabelecimento do setor produtor de alimentos deteriorado após sete anos de desmontes nas políticas para a agricultura familiar e a reforma agrária.
Então, são necessárias, na atualidade, ações consistentes e substantivas para assegurar respostas de curto prazo na oferta alimentar, o que vem sendo feito mediante as ações dos planos safra, e para a esperada recuperação dos estoques públicos.
Porém, entendemos que devemos ir além. Especificamente para os produtos mais afetados pela expansão das principais commodities para exportação, como o arroz, feijão e mandioca, devam ser implementadas medidas com impacto estrutural no estímulo a essas culturas.
No geral, o mercado doméstico não tem atratividade que rivalize com o mercado externo no caso das commodities agrícolas, principalmente pelos efeitos de três variáveis: preços internacionais, câmbio e Lei Kandir. Somente a desvalorização do Real no ano de 2024 chegou a cerca de 22%.
Por conta desse contexto, as três culturas em consideração, experimentam longa trajetória de erosão das respectivas áreas plantadas, deslocadas para produtos com fortes conteúdos exportadores.
Observe-se que, em 1995 as áreas plantadas com arroz, feijão e mandioca representavam 26% da área total com lavouras temporárias; em 2023 não passaram de 5.9%, no conjunto. Junto à enorme perda de área não houve ganhos de produtividade à altura.
Neste cenário, apresentamos projeto de Lei no Senado que, sem criar qualquer empecilho para o setor exportador, tende a ampliar o grau de atratividade do mercado interno desses alimentos. Em resumo, a proposição pretende agregar as variações do câmbio e dos preços internacionais aos custos de produção na definição dos preços mínimos desses três produtos.
Adicionalmente, a proposta incentiva a formação de estoques públicos desses alimentos o que nos parece absolutamente crucial nesses tempos atuais já de expectativas continuadas de fenômenos climáticos atípicos em intensidade e frequência. Esses produtos integram o núcleo da dieta básica da população e, juntamente com a sua ampla diversidade de subprodutos são definidores da história da culinária brasileira com efeitos importantes na nossa própria formação cultural.
Estamos convencidos que a proposta poderá ser de grande utilidade nos esforços do governo Lula no controle sustentável da inflação dos alimentos.