Claro que não sou um expert em geopolítica global. Porém, até por se tratar de tema instigante, e por dever de ofício, procuro estar minimamente informado a respeito. Com essa ressalva emito algumas opiniões sobre aspectos que julgo importantes relacionados à 15ª Cúpula do Brics realizada recentemente na África do Sul.
É provável que a reunião de Johanesburgo, marcada pela incorporação de seis novos membros “estratégicos” ao BRICS, consolide e dê celeridade ao movimento contra hegemônico, no plano global, conduzido por países do eixo Sul/Sul (sul global). É de se esperar avanços na direção de um mundo multipolar que crie as condições para relações mais equilibradas e justas entre os países. Um contexto global com mudanças na atual institucionalidade ainda minada por desconfianças e vícios da guerra fria, incluindo uma diplomacia muitas vezes persecutória e excludente levada a cabo pelo ocidente, assim entendido na acepção dominante do conceito que exclui países como o próprio Brasil. Nesses termos, não é a afinidade ideológica o fator de convergência do BRICS+, mas o compromisso dos seus membros por maior simetria nas relações econômicas, financeiras, e comerciais no plano global.
De forma alguma o BRICS+ visa conflito com os EUA, mas é uma necessidade imperiosa dos países de fora do G7 e da OTAN, para que disputem espaços e influência no tabuleiro internacional. Pelo menos o governo brasileiro jamais iria concordar com o BRICS+ como polo político antagônico aos EUA, nação com a qual mantemos sólidas relações históricas. Observe-se que a Arábia Saudita que passará a integrar o BRICS+ é a principal aliada dos EUA no Oriente Médio. A própria China mantém interesses econômicos e comerciais gigantescos com os EUA.
Setores da mídia avaliam que a emergência do BRICS+ significou a capitulação do Brasil às ambições geopolíticas da China. À parte a provável antipatia com o nosso maior parceiro comercial, deliberadamente rejeitam as reais motivações estratégicas do Brasil e dos demais membros desta aliança poderosa. Optam por uma ordem mundial na qual o Brasil, no caso, não consegue dar vazão às suas enormes potencialidades econômicas, políticas e culturais historicamente represadas, em grande medida, pelos estrangulamentos impostos pelo atual sistema de poder.
Não obstante os nossos laços históricos amigáveis e de estreita sinergia com os EUA, traduzidos, inclusive, no apoio territorial e na oferta de produtos estratégicos à participação dos EUA nos esforços de guerra dos Aliados, não apenas o Brasil, mas a América do Sul como um todo, tem sido submetida a expedientes como a vedação de transferência de tecnologias, restrições de acesso aos mercados, de investimentos, etc, que nos tolhem o direito ao desenvolvimento. Essa prática se estende ao restante do “ocidente”; basta ver os termos da proposta de Acordo Mercosul/UE atualmente em discussão.
O fato é que alguns setores não perceberam que além do peso econômico do BRICS+, está a aglutinação de países que controlam grande parte da energia e da oferta alimentar do mundo. Isto, combinado com maior espaço para o continente africano, fato que afora a simbologia geopolítica inclusiva, robustece a potência política do BRICS+ no campo de minerais estratégicos e para a indispensável expansão da produção de alimentos no mundo.
Enfim, não obstante as suas contradições, o BRICS+ representa oportunidade real de disputas por mudanças numa ordem mundial na qual o ocidente prefere despejar 120 bilhões de dólares em armas para a Ucrânia numa guerra provocada, sim, pelos erros da Rússia, mas que vem ocorrendo, também, por ignorarem as ponderações feitas por autoridades do porte do insuspeito Henry Kissinger. A opção persecutória é tanta que os países europeus preferiram impor sanções às suas próprias populações. Enquanto isso, o apoio à preservação da floresta amazônica, crucial para o enfrentamento da maior ameaça para a continuidade da vida neste planeta vem merecendo pífio apoio financeiro pelo ocidente. Vida longa ao BRICS+.