Os trabalhadores mais ricos das regiões metropolitanas brasileiras, que são 10% do total, ganharam 39 vezes mais que os mais pobres (40%) em 2020. Um ano antes, recebiam “apenas” 29 vezes mais. É a conclusão do terceiro boletim ‘Desigualdade nas Metrópoles’.
O documento é produzido pela PUC-RS em conjunto com o Observatório das Metrópoles e o Observatório da Dívida Social na América Latina (RedODSAL), a partir de dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Segundo reportagem do jornal ‘Folha de São Paulo’, o levantamento considera apenas a renda do trabalho.
Para medir a oscilação do nível de desigualdade, os pesquisadores utilizaram o método conhecido como Índice Palma, que consiste em dividir a renda dos 10% mais ricos pela dos 40% mais pobres. Como o recuo dos rendimentos foi muito mais acentuado entre os trabalhadores da faixa mais baixa do que entre os de maior renda, a diferença disparou de 2019 para 2020.
A renda do trabalho dos mais pobres recuou 34,2% – de R$ 237,18 por mês, no último trimestre de 2019, para R$ 155,95 no mesmo período de 2020. O impacto para os mais ricos foi quase cinco vezes menor: 6,9%, para R$ 6.356. No grupo intermediário, que abrange 50% do total de trabalhadores, a queda foi de 8,6%, para R$ 1.195.
As maiores diferenças de ganho entre os mais ricos e os mais pobres foram verificadas nas regiões metropolitanas de João Pessoa (88,3 vezes) e do Rio de Janeiro (59,7). Na região metropolitana de São Paulo, ficou pouco acima da média (40,2 vezes). As menores diferenças estão nas regiões de Curitiba e Goiânia (23,2 vezes).
Um dos coordenadores do estudo, o professor de Ciências Sociais da PUC-RS Andre Salata, lembrou a importância do auxílio emergencial para compensar as perdas do mercado de trabalho e lamentou sua suspensão.
“No final de 2020, a renda dos mais pobres não havia se recuperado, era muito menor do que no final do ano anterior, e foi nesse momento que o governo federal decidiu interromper o pagamento do auxílio emergencial”, explicou. “Quando você tem a interrupção do auxílio, no começo de 2021, você tem imediatamente um aumento da pobreza, porque essas pessoas não contam mais com aquela compensação.”
Nas ruas, a fome avança
Na derrocada gerada pela falta de rumos do ministro-banqueiro da Economia, Paulo Guedes, enquanto boa parte dos trabalhadores mais ricos recorrem ao home office para manter suas atividades, os informais de renda mais baixa são obrigados a ir para as ruas, mesmo contra a vontade, para garantir a sobrevivência, dia após dia.
Reportagem do portal ‘Uol’ com engraxates de São Paulo relata as dificuldades enfrentadas pela categoria em meio às medidas de restrição social impostas para conter o avanço da epidemia na maior metrópole do país. Cercada por escritórios de advocacia, órgãos da Prefeitura, bancos e a Bolsa de Valores, a Praça Antônio Prado, região privilegiada do centro antigo da capital, é o cenário da desolação.
“Eu estou com meu INSS atrasado, não consigo pagar. Moro sozinho e ainda ajudo minha mãe. Meu pai tem as casas dele lá em Minas, mas não quero nada que não seja meu”, disse o engraxate Joel Augusto Fernandes, 38 anos. Hoje, ele não engraxa mais do que quatro pares por dia, e vive entre pagar dívidas em atraso e lutar pelo pão de cada dia.
O primo de Joel, Fernando Augusto Guimarães, 43 anos, vive a mesma dificuldade. “Se está todo mundo aqui não vou falar que a gente ia brigar pelo cliente, mas ninguém ia trabalhar. No máximo um par de sapatos por dia e olhe lá”, afirmou à reportagem.
Entre os catadores de São Paulo, afirma reportagem do site ‘Brasil de Fato’, a renda mensal, que era de cerca de um salário mínimo antes da pandemia, caiu 80%. A superlotação nos 115 Ecopontos do município tem levado à redução do número de serviços diários e afetado diretamente os ganhos dos catadores informais.
Segundo último levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), de 2017, o Brasil tinha em torno de 600 mil catadores em atividade. Hoje, a estimativa do Movimento Nacional dos Catadores de Recicláveis (MNCR) alcança um milhão de profissionais – apenas 5% vinculado a cooperativas ou associações.