Jair Bolsonaro não teve forças para impedir o fim da Lei de Segurança Nacional (LSN) e sancionou o projeto de lei que trata dos crimes contra o Estado Democrático de Direito mantendo o artigo que revoga a lei criada durante a ditadura militar. Ainda assim, agiu em causa própria e contra a democracia ao vetar pontos importantes do texto.
Bolsonaro, por exemplo, vetou a criminalização do ato de espalhar ou promover fake news que possam comprometer o processo eleitoral. Ao ser contra tal medida, Bolsonaro, que tanto alarde faz sobre a segurança das eleições, atacando as urnas eletrônicas, assina uma verdadeira confissão de culpa sobre os métodos que o ajudaram a se eleger.
“Bolsonaro se utiliza dos vetos à Lei de Defesa do Estado Democrático de Direito para se proteger dos próprios crimes. A comunicação enganosa em massa produziu nesta pandemia a desinformação e levou milhares de brasileiros à morte. Para além disso, a eleição do Bolsonaro é fruto dessa estratégia que contamina e destrói a nossa democracia”, observa o senador Rogério Carvalho (PT-SE), que foi o relator do projeto de lei (PL 2.108/2021).
Outros dois vetos claramente buscam proteger os militares em prejuízo da democracia. São eles: ao aumento de pena genérico se os crimes são cometidos com violência ou grave ameaça, exercidos com emprego de arma de fogo, por funcionário público ou por militar; e ao aumento de pena quando o crime de atentar contra manifestação popular for cometido por militar.
Bolsonaro ainda manobrou para atacar os movimentos sociais ao vetar também o artigo que criminaliza o atentado ao direito de manifestação, sob o argumento de que é difícil diferenciar manifestações pacíficas de violentas. Em artigo, a advogada Tânia Maria de Oliveira, integrante da Coordenação Executiva da ABJD (Associação Brasileira de Juristas pela Democracia), avalia que esse veto “corresponde à relação do presidente com a violência contra movimentos sociais, sobretudo oriunda das polícias”.
O senador Rogério Carvalho aponta ainda outra intenção de autodefesa de Bolsonaro ao vetar a livre manifestação pacífica: “Quanto ao veto à livre manifestação pacífica, o medo do Bolsonaro é que o povo brasileiro já entendeu que ele é promotor do caos social. E a consequência natural, serão mobilizações em massa nas ruas após a pandemia. Bolsonaro tenta se blindar da própria nação.”
Congresso pode derrubar os vetos
Segundo apurou a Folha de S. Paulo, militares que integram o governo desejavam que Bolsonaro vetasse também o artigo 4º do projeto de lei, justamente o que revoga a LSN. O ex-capitão, no entanto, recuou desse veto, o que representa uma importante vitória das forças democráticas do país.
Na quarta-feira, antes da decisão de Bolsonaro ser divulgada, o relator do projeto, senador Rogério Carvalho (PT-SE), avisou que, se Bolsonaro ousasse vetar o artigo 4º, o Congresso Nacional certamente derrubaria o veto. “Uma lei criada para um regime de exceção, um regime autoritário, não serve para um regime democrático”, afirmou o senador.
Após a decisão de Bolsonaro, o senador mantém a crença de que os vetos poderão ser derrubados. “Não há democracia sem a livre manifestação nem com mentiras. A aprovação deste projeto foi fruto de amplo entendimento das casas legislativas de que há um risco crescente às instituições democráticas e ao próprio exercício da democracia. Por isso, estou convencido de que haverá uma reação aos vetos presidenciais, e temos chances reais de derrotar o autoritarismo do Bolsonaro.”
Além de revogar a Lei de Segurança Nacional, o PL 2.108/2021 cria um capítulo no Código Penal para tipificar crimes contra o Estado Democrático de Direito. O projeto foi aprovado em votação simbólica em 10 de agosto, mesmo dia em que Bolsonaro ameaçou a democracia com um patético desfile de tanques na Esplanada dos Ministérios.
“É uma decisão histórica! Um dos mais importantes avanços democráticos dos últimos anos no país”, comemorou Rogério Carvalho na ocasião. “É a oportunidade que temos de mostrar que nenhum governo terá autorização pra agir no excesso. Significa valorizar a democracia e derrotar o autoritarismo”, afirmou, em clara referência ao gesto autoritário de Bolsonaro naquele dia.