Considerado uma espécie de Constituição da internet, o marco civil estabelece “princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet no Brasil”, por parte dos usuários, dos provedores e também do governo. O projeto tramita em regime de urgência na Câmara e precisa ser votado até a próxima segunda-feira (28), ou passará a trancar a pauta do plenário, impedindo as demais votações em sessões ordinárias da Casa.
A urgência para o projeto do marco civil foi pedida pela presidenta Dilma Rousseff, após as denúncias de espionagem norte-americana contra comunicações de cidadãos e do governo brasileiro. Um dos pontos inegociáveis do projeto, para o relator, deputado Alessandro Molon (PT-RJ), é exatamente o que garante a privacidade dos cidadãos, além dos dispositivos que asseguram a liberdade de expressão e a neutralidade da rede.
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, também acredita que o aprimoramento das leis nacionais pode ser um instrumento de defesa da privacidade dos cidadãos e também do Estado. “A proposta de um novo marco civil da internet é uma saída não só para o momento que o Brasil vive, mas para todos os países que querem ter também os seus direitos e a sua soberania garantidos”, afirmou o ministro em audiência na Câmara sobre a espionagem norte-americana.
Neutralidade
A neutralidade da rede é um dos pontos polêmicos contidos na matéria. De acordo com esse princípio, as empresas de telecomunicação ficam impedidas de oferecer aos usuários pacotes com serviços diferenciados (por exemplo, só com e-mail, apenas com acesso a redes sociais ou incluindo acesso a vídeos, cobrando valores diferenciados para cada plano). Aprovada a neutralidade, não haveria qualquer tipo de distinção aos dados que trafegam em relação a sua origem, destino e conteúdo.
Molon defende que o texto sobre a neutralidade da rede seja mantido na íntegra. “As companhias de telefonia pretendem cobrar mais caro, dependendo de onde vem a informação ou do tipo de dado que a gente acessa. Se for voz, querem cobrar um preço; se for música, outro; se for vídeo, outro e assim por diante”, disse à Agência Câmara.
Relator da proposta participa de debate
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Ele ressalta que o marco civil é a saída para proteger os 100 milhões de usuários brasileiros da internet do uso de suas informações. “O texto proíbe uma série de atividades de bisbilhotagem, como a venda para marketing direcionado daquilo que acessamos na rede. Elas [empresas] argumentam que isso vai diminuir os seus lucros. É verdade: reduzirá seus lucros para proteger os usuários brasileiros.”
Já as empresas de telecomunicação criticam a proposta alegando que ela vai inibir investimentos no setor e, como consequência, “atrapalhar a inclusão digital”.
Segundo Molon, os provedores de conexão podem não quer a neutralidade da rede, mas os 80 milhões de internautas a querem. “A Câmara vai ter que decidir se vai atender às preocupações de um setor ou se vai atender aos internautas”, afirmou. “Acho muito difícil que se encontre um ponto de equilíbrio, que os usuários aceitem e que as empresas achem bom para os seus negócios”, complementou.
Privacidade e liberdade de expressão
O relator também defende a manutenção do texto do projeto no que se refere à liberdade de expressão e à privacidade. “A tecnologia permite hoje um nível de controle do indivíduo que é muito arriscado para a democracia”, salientou. “O marco civil não impede práticas de espionagem, mas avança na proteção da privacidade, tornando certas práticas ilícitas”, completou.
Molon ressaltou que hoje também não existem regras que definem a responsabilidade do provedor de aplicação sobre comentários publicados pelos usuários. “Hoje quem decide é o Judiciário, e as decisões judiciais são divergentes”, disse. “O marco civil deixa claro que, a partir do momento em que houver ordem judicial para remover o conteúdo, a responsabilidade sobre ele passa a ser também do provedor”, destacou.
O texto do marco civil em tramitação na Câmara passou por consulta pública, entre 2009 e 2010, e recebeu mais de 2 mil sugestões da sociedade. O projeto foi elaborado pelo governo, com base no documento “Princípios para a governança e uso da Internet”, do comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br).
“A proposta possibilitará um posicionamento futuro mais adequado sobre outros importantes temas relacionados à internet que ainda carecem de harmonização, como a proteção de dados pessoais, o comércio eletrônico, os crimes cibernéticos e o direito autoral, a governança da internet e a regulação da atividade dos centros públicos de acesso à internet”, diz a exposição de motivos do Poder Executivo, que acompanha o projeto.
Nesta terça-feira (22), a Câmara dos Deputados promove um videochat com Molon para debater o conteúdo do relatório do deputado. O evento será transmitido pelo Portal e pela TV Câmara, a partir das 11 horas e estará aberto à participação de todos os interessados. Basta acessar o link que estará disponível, no horário do bate-papo, no portal Câmara Notícias ou encaminhar perguntas para o Disque Câmara (0800 619 619).
Veja abaixo alguns dos principais pontos do marco civil da internet:
O que é o marco civil?
Projeto de lei que estabelece “princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet no Brasil”. As determinações do projeto dizem respeito aos usuários de internet, os provedores de conexão, provadores de conteúdo e o governo.
Quais são dos direitos e garantias estabelecidos pelo marco civil?
Os destaques do projeto são: o direito à privacidade, o sigilo das comunicações (salvo em casos de ordem judicial), direito a não suspensão da conexão, a manutenção da qualidade contratada da conexão e informações claras e completas sobre coleta, uso, tratamento e proteção de dados pessoais.
Quais os objetivos do marco civil?
Um dos principais motivos da criação do projeto de lei é a insegurança jurídica, que acaba gerando “decisões inconsistentes”, segundo o secretário de assuntos legislativos do Ministério da Justiça no judiciário. Um exemplo foi o caso da modelo Daniela Cicarelli. Após processar o site YouTube, pelo fato de usuários terem postado um vídeo íntimo da modelo, um juiz havia determinado que o site de vídeos fosse bloqueado no país.
Quem participou da elaboração do projeto?
A iniciativa para a criação do projeto começou em outubro de 2009 e partiu da Secretaria de Assuntos Legislativos da Justiça (SAL/MJ) e a Escola de Direito do Rio de Janeiro da Fundação Getúlio Vargas. O projeto ao longo dos anos recebeu contribuições da sociedade civil, parlamentares e representantes de empresas.
Com agências onlines
Conheça o projeto do Marco Civil da Internet
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