Setor elétrico: 579, a MP da competitividade – Paulo Pedrosa

“É hora de fazer valer a vantagem do modelo de concessões e de produção em favor da sociedade”.

Para o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, que retornou às atividades após licença para tratamento de saúde, a repercussão do mercado em relação à Medida Provisória (MP nº 579/2012), que reduzirá em média 20% do preço das contas de luz, tem sido muito exagerada. Isto, porque não houve surpresa e todas as iniciativas estão plenamente de acordo com as leis que regem o setor elétrico. Segundo ele, a legislação é clara quanto à decisão do governo de não remunerar os ativos já amortizados no processo de renovação das concessões. “Não temos que transferir para os acionistas das empresas um patrimônio que é de todo o povo brasileiro”, afirmou Lobão na última semana, durante reunião de trabalho com seus assessores diretos, entre eles o secretário-executivo, Márcio Zimmermann, que o substituiu durante a licença.

Por mais que o lobby de grupos interessados insista em dizer que haverá perdas, principalmente para a Eletrobras, a mídia não deu um único registro para a alta de preços das ações da empresa na última sexta. Durante o pregão na BMF/Bovespa, os papéis da empresa registraram alta de até 10,7% e fecharam valorizados em cerca de 7%. Na manhã desta segunda-feira (26/11), os papéis ON e PNB (Elet3 e Elet6), respectivamente, iniciaram o dia de negócios com alta de 7,54% e 10,39%.

A perspectiva favorável em relação MP só tende a crescer. Os empresários farão campanha a favor da MP 579, porque entendem que a redução média de 20% na conta de luz – para o setor industrial a queda poderá atingir até 28% – é um fator preponderante para reduzir o custo Brasil e contribuir para o crescimento. Outra manifestação favorável à MP pode ser verificada em artigo publicado na edição de hoje no jornal Valor Econômico, de autoria de Paulo Pedrosa, presidente-executivo da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace).

Paulo Pedrosa traz a lembrança que foi citada pelo ministro interino de Minas e Energia, Márcio Zimmermann, durante sua participação na audiência pública realizada pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) no Senado há uma semana: “desde o Código de Águas que passou a regular o setor de energia no Brasil, em 1934, está previsto que os ganhos com o fim das concessões do setor devem ser alocados aos consumidores”.  Pedrosa escreve, em seu artigo, que “os consumidores não só pagaram pela construção das usinas hidrelétricas, por meio das tarifas, como em 1993 houve um equacionamento de passivos, a um custo da ordem de US$ 26 bilhões para as empresas e a população brasileira (Lei nº 8.631)”, e acrescenta: “ nos últimos anos a venda de energia tem sido feita em regime de livre negociação de preços pelas concessionárias cujas concessões vendem, o que significa que os próprios investidores assumiram os riscos do negócio. É fundamental que o governo se mantenha firme em sua posição de buscar a competitividade e a discutir tecnicamente eventuais alterações”. Só faltou Pedrosa dizer que, o resto, é especulação.

Marcello Antunes

Leia a íntegra do artigo:

Medida Provisória 579, a MP da competitividade :: Paulo Pedrosa

“Não iremos para um caminho de desenvolvimento se não dermos importância à indústria. Ela é importante para articular os demais setores, tem um poder de inovação que se espraia pela economia, é decisiva para nós que precisamos aumentar a formação bruta de capital fixo, que precisamos elevar nossa taxa de investimentos.” A declaração da presidenta Dilma Rousseff em entrevista recente ao Valor retrata o espírito da Medida Provisória (MP) 579, criada para reverter a tendência que tornou o custo da energia um fator de perda de competitividade da produção nacional. Mais do que uma questão de boa vontade, a ideia de impulsionar a economia com base na modicidade de custos da energia tem respaldo em diversos estudos que identificam uma forte correlação entre a redução desse custo e a promoção do desenvolvimento. Os efeitos benéficos se verificam na geração de empregos, redução da inflação e aumento dos investimentos.

Nas últimas semanas, tem havido reação intensa à Medida Provisória, em alguns casos, até profetizando o colapso do setor elétrico. Essa reação é até natural em um processo de exercício de direitos da dimensão do que estamos vivendo. O problema é que, na maioria dos casos, a argumentação parece confundir quebra de expectativas de retorno de investimentos com quebra de contratos. Confundem-se passivos de empresas com ativos não depreciados de concessões de usinas. Também se misturam conceitos de depreciação fiscal, contábil e regulatória para a apresentação de reivindicações exageradas.

Em muitos casos parece que os investidores esperam transformar o setor elétrico em um setor pré-pago, no qual caberia aos consumidores aportar recursos para a expansão. É preciso ter cuidado, pois a lógica regulatória, e até econômica e do desenvolvimento, é de que os investimentos devem ser feitos com capital dos investidores para serem remunerados quando a energia for disponibilizada para consumo.

Desde o Código de Águas está previsto que o ganho com o fim das concessões deve ser alocado ao consumidor

Para evitar que a discussão se desvirtue, é fundamental focá-la em argumentos técnicos. As indenizações devem estar vinculadas apenas à realização de investimentos prudentes: o que foi amortizado não pode mais ser cobrado da sociedade e os serviços de operação e manutenção devem buscar a eficiência que já se verifica em muitas concessões de infraestrutura.

Desde o famoso Código de Águas, que passou a regular o setor de energia brasileira em 1934, está previsto que os ganhos com o fim das concessões do setor devem ser alocados aos consumidores. De lá para cá, os consumidores não só pagaram pela construção das usinas, por meio das tarifas, como em 1993 houve um equacionamento de passivos, a um custo da ordem de US$ 26 bilhões para as empresas e a população brasileira (Lei nº 8.631) na cotação cambial da época. Além disso, nos últimos anos a venda de energia tem sido feita em regime de livre negociação de preços pelas concessionárias cujas concessões vencem, o que significa que os próprios investidores assumiram os riscos do negócio. É fundamental que o governo se mantenha firme em sua posição de buscar a competitividade e a discutir tecnicamente eventuais alterações.

A Medida Provisória precisa ser aperfeiçoada quando houver argumentos sólidos que justifiquem as mudanças, um ponto em especial merece a atenção do governo e do Congresso Nacional. Ocorre que a decisão de alocar toda a energia das concessões vincendas ao mercado das distribuidoras, o chamado mercado regulado, exclui desse benefício quase 60% da indústria brasileira que compra energia no mercado livre e que também pagou pela depreciação dos investimentos das concessões que vencem.

Em tais condições, a MP não só deixa de promover a competitividade da indústria em seu potencial máximo como pode resultar em um aumento do custo nesse ambiente de contratação, praticamente anulando os efeitos do corte de encargos setoriais, também previsto no mesmo texto legal. Isso acontece porque, mesmo que a oferta de energia em todo o mercado continue a mesma, a demanda no curto prazo será maior no mercado livre, pressionando os preços para cima. A pressão de demanda se dará também pelo fato de que as geradoras que concordarem em prorrogar seus contratos precisam entregar a energia já em 2013 e, por isso, terão que buscar no mercado livre lastro para honrar vendas que já tinham realizado nele mesmo. O efeito pode ser perverso e contrário à competitividade e mesmo à redução de preços, já que, segundo estudos da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), as famílias brasileiras consomem duas vezes mais energia nos bens e produtos que adquirem do que refletem as contas de luz de suas casas.

Há quem argumente que não seria possível fazer chegar ao mercado livre a energia das concessões vincendas. Mas isso não é verdade. As alternativas são múltiplas. Por exemplo, ao promover o Proinfa, programa que incentivou as fontes alternativas de energia quando elas ainda eram caras, o governo alocou esse custo alto a todos os consumidores, cativos e livres. Poderia fazer o mesmo agora com a energia barata. Outra possibilidade seria permitir que consumidores parcialmente regulados pudessem receber as quotas via distribuidoras.

A consideração desses fatos deve fazer com que, mais do que uma MP do setor elétrico, a MP 579 realmente seja uma medida em favor da competitividade do país. Assim como os Estados Unidos têm aliviado os impactos da crise econômica com a oferta de gás natural barato das reservas de xisto e a França foi buscar na eletricidade de suas usinas nucleares já amortizadas novo fôlego de competitividade para sua indústria, para dar apenas dois exemplos, é hora de fazer valer a vantagem de nosso modelo de concessões e de produção hidrelétrica em favor da sociedade e dos consumidores.

Paulo Pedrosa é presidente-executivo da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace)

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