Além de não ampliar o número de beneficiários nem aumentar o poder de compra de quem recebe o Bolsa Família, o Auxílio Brasil, proposto por Jair Bolsonaro, destrói a base do sistema de proteção social do país, algo que a população não pode aceitar.
Ex-ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Tereza Campello explica que o sucesso do Bolsa Família não é o simples fato de ele distribuir renda. “O programa funciona porque é muito mais que a transferência de renda em um cartão, e o governo Bolsonaro quer destruir os pilares que garantem o sucesso do Bolsa Família”, alerta. Vejamos quais são esses pilares:
1. O Bolsa Família é simples e com objetivo muito bem definido
O primeiro segredo do sucesso do Bolsa Família é sua simplicidade. Ele é um programa com objetivos claros: aliviar a pobreza, manter as crianças na escola e garantir a elas a assistência médica básica. É essa simplicidade que permite ao Bolsa Família ter escala, chegar a milhões de famílias e ter abrangência nacional, ou seja, funcionar bem em todo o país, seja na Amazônia, seja na periferia de uma grande cidade.
O que Bolsonaro quer fazer: Bolsonaro quer acabar com o Bolsa Família e colocar no lugar um programa cuja medida provisória não estabelece sequer o valor a ser pago e também não diz quantas pessoas receberão o benefício, porque os critérios estão indefinidos. Além disso, a proposta inclui uma série de penduricalhos, como auxílios extras para diferentes situações, o que deixa tudo mais complicado e difícil de administrar. “Em vez de manter um edifício sólido, o governo Bolsonaro quer colocar no lugar um monte de puxadinho amontoado”, resume Tereza Campello.
2. O Bolsa Família foi construído e pactuado com todos os prefeitos e governadores
O Bolsa Família só está em todo o território nacional porque foi construído coletivamente com todos os mais de 5 mil prefeitos e os 27 governadores do país. Foi por isso que ele começou a funcionar em todo o Brasil sem nenhum problema.
O que Bolsonaro quer fazer: Sem discutir com prefeitos e governadores, quer acabar com o Bolsa Família e colocar no lugar um programa mal feito e indefinido, colocando as famílias em risco de enfrentar as mesmas dificuldades que tiveram para receber o auxílio emergencial. Desrespeita assim o pacto federativo e deixa os prefeitos inseguros sobre o que ocorrerá.
3. O Cadastro Único
Diferentemente do que muitos pensam, o Cadastro Único não é apenas uma plataforma digital ou um banco de dados, mas uma ferramenta construída de forma humanizada. Ele deve ser utilizado por um gestor público que conhece os beneficiários e suas vulnerabilidades para construir a trajetória de inclusão das famílias, dentro do conceito “conhecer para incluir”.
O que Bolsonaro quer fazer: transformar o CadÚnico em um aplicativo. Ao fazer isso, desumaniza o processo de inclusão das pessoas no programa e impede o acompanhamento permanente dos beneficiários. Além disso, dificulta o acesso das pessoas com pouco ou nenhum acesso à internet e opta pela mesma estratégia que resultou em problemas e atrasos com o auxílio emergencial. “Quem ganha com isso são as big techs. Quem perde é a população pobre”, analisa Tereza Campello.
4. O Sistema Único de Assistência Social (Suas)
“O sucesso do Bolsa Família não existiria se o programa não fosse integrado com outros, especialmente ao Sistema Único de Assistência Social (Suas), especialmente por meio dos Cras (Centros de Referência da Assistência Social)”, explica o deputado federal Patrus Ananias (PT-MG), também ex-ministro do Desenvolvimento Social e do Combate à Fome. É essa rede de assistência social que permite às famílias beneficiárias cumprir com suas contrapartidas e receberem apoio para saírem do estado de dependência do programa e não precisarem mais do Bolsa Família.
O que Bolsonaro quer fazer: Na medida provisória que entregou ao Congresso, o governo não demonstra que o Suas terá um papel importante no Auxílio Brasil. Fica claro que o objetivo é escantear o Suas, que não foi sequer ouvido na confecção do programa e tem sido desmontado nos últimos anos. Assim, mais que acabar com o Bolsa Família, Bolsonaro ataca toda uma rede de proteção fundamental para o combate à desigualdade no país.