Faço questão de deixar registrada minha homenagem a essa grande mulher, aqui no Senado. Era viúva do ex-Presidente francês François Mitterrand, mas sua importância para o mundo não se deve somente ao fato de ter sido a primeira-dama da França durante 14 anos.
Madame Danielle Mitterrand ficou conhecida por sua forte personalidade como militante de esquerda e, sobretudo, por sua luta pelos direitos humanos e por ser grande defensora do que chamamos de socioambientalismo. Foi militante da resistência aos nazistas. Fez um movimento político, na sua juventude, muito forte. E seus sonhos foram traduzidos no objetivo da entidade criada por ela com a finalidade de criar uma rede mundial para construção de uma sociedade que dê a todos suas oportunidades de vida.
Por causa desse sonho, tive o privilégio de conhecer Danielle Mitterrand. Ela veio ao Brasil e criou um projeto chamado Mensageiros da Água. Ela queria garantir que todos tivessem acesso à água; queria que a humanidade reconhecesse que a água é um bem natural que tem fim.
Ela conheceu a Amazônia e desenvolveu projetos sociais no Amapá. Depois, chegou ao Acre e ali esteve por várias vezes. Nós trabalhamos juntos, quando eu ainda estava no Governo, com o Secretário Binho Marques. Depois, no Governo de Binho Marques trabalhamos juntos, com sua fundação, na construção de novos indicadores socioambientais.
Madame Mitterrand nunca se curvou à ideia de medir a qualidade de vida de uma nação ou de um povo pelo PIB, o Produto Interno Bruto. Comemorou o surgimento do Índice de Desenvolvimento Humano, o IDB, mas não ficou satisfeita. E tinha razão, renda per capita, escolaridade e expectativa de vida não são suficientes para medir um mundo complexo e multicultural.
Com a determinação que sempre teve, o amor pela humanidade e entrega absoluta à causa dos mais fracos, vi Danielle Mitterrand chegar ao Acre várias vezes. Lembro-me especialmente de uma delas. Uma vez, já aos 84 anos, ela atravessou o oceano numa viagem só de avião de quase 12 horas até Brasília, fora o tempo de aeroporto; depois mais três horas e meia até o Acre. No dia seguinte, Madame Mitterrand embarcou num monomotor e, depois de mais de três horas de voo, desembarcou na cidade de Marechal Thaumaturgo, no extremo Oeste do Brasil, na fronteira com o Peru, e um dos menores Municípios do Brasil. De lá, Madame Mitterrand embarcou em uma canoa com motor de popa, como nós chamamos, para encontrar com o povo Ashaninka, no rio Amônia.
Vem então a pergunta: por que ela fez tudo isso, uma senhora de 84 anos?
Na verdade, ela fez tudo isso para conhecer e provar que aquele povo lá, na escondida Marechal Thaumaturgo, Município do Acre, tinha qualidade de vida, apesar de os indicadores do Unicef terem classificado o Município, em 2001, como o pior lugar do Brasil para uma criança viver.
Daí a importância de lembrarmos a vida e a perda de uma senhora, de uma mulher que fez uma luta extraordinária, fez essa luta e esse sonho atravessarem oceanos. E eu faço este registro aqui no Senado porque ela foi uma referência e um exemplo e eu tive especialmente o privilégio de conviver com ela, de se recebido na França; de recebê-la em minha casa várias vezes e de ver que era uma pessoa que tinha tudo para passar, com toda a razão, os anos finais de sua vida com tranqüilidade, com sua família, na Europa, mas seguia andando mundo afora, procurando, de alguma maneira, estimular para que o mundo fosse mais justo E pela relação que construímos e pelo respeito que sempre tive por essa vida extraordinária, é que eu trago, Sr. Presidente, e deixo aqui no Senado e vou defender, assumo aqui, vou defender as ideias
Vou defender, assumo aqui, vou defender as ideias da querida e inesquecível Madame Mitterand. Aprendi muito com ela a relativizar sempre a palavra impossível. Era uma mulher extraordinária, que trabalhava com esse propósito.
Estou certo de que Madame Mitterand sempre estará viva com seu exemplo de vida entre nós.
Peço que conste nos Anais essa minha simples fala, mas que de alguma maneira é uma homenagem às mulheres do mundo inteiro, na hora em que perdemos uma mulher extraordinária.
O outro assunto, Sr. Presidente, que trago à tribuna é que acabo de vir de uma audiência no Ministério da Justiça acompanhando o Senador Tião Viana e fomos recebidos pelo Ministro Eduardo Cardozo. O Governador apresentou um detalhado relato ao Ministro da Justiça sobre a situação dos haitianos, refugiados haitianos no Acre.
No Senado Federal, inclusive por iniciativa minha e do Senador Anibal, apresentamos proposição que foi aprovada de criar uma comissão para acompanhar a situação dos haitianos no Acre. Todos nós acompanhamos e lamentamos os problemas gravíssimos vividos por aquele País, por aquele povo quando do terremoto, aquele trágico terremoto de janeiro de 2010. Um país que é referência extremamente negativa, do ponto de vista dos indicadores sociais e da saúde pública, sofreu uma tragédia, inclusive perdemos a D. Zilda Arns e mais alguns outros brasileiros que foram vítimas daquele desastre natural, mas que vitimou um povo já vítima. De lá para cá, Sr. Presidente, para que V. Exª tenha uma ideia, mais de três mil haitianos entraram no Brasil, boa parte deles via Equador, a metade desse número passou pelo Acre,na fronteira do Brasil com o Peru, na cidade de Assis Brasil.
Denunciamos esse assunto, porque não é um assunto que esteja nas condições de um governo estadual enfrentar. Estamos falando de refugiados , estamos falando e vimos no mundo inteiro a todo tempo que quando acontece algo parecido são os organismos multilaterais, ONU com seus instrumentos, que imediatamente assume a condução de um processo tão delicado. Imaginem chegar crianças, mulheres, homens, às centenas, no Estado, sem nenhuma condição. Os indícios deixam claro que tem um comércio internacional por trás disso, pessoas usando e se utilizando do sofrimento
Usando e se utilizando do sofrimento de pessoas que já estão sofrendo muito na sua terra e que querem melhor sorte em outra parte do mundo. Essas pessoas chegam em situação de absoluta calamidade na fronteira com o Peru.
A Prefeita Leila, de Brasiléia, o Governador Tião Viana têm sido incansáveis através da Secretaria de Direitos Humanos do Estado, na época com o Secretário Henrique, agora com o Secretário Nilson Mourão, e acolhendo cada um deles, dando de comer, dando assistência à saúde e procurando dar um encaminhamento adequado e legal a esses refugiados. Mas a situação chegou a um ponto insustentável. Neste momento, para que se tenha idéia, até o começo de novembro tínhamos 332 haitianos em Brasiléia, na fronteira Peru e Bolívia; no dia de hoje, são 550, numa situação de absoluto improviso, o Governo do Estado fazendo o possível e o impossível e hoje o Governo do Estado foi pedir, solicitar – e eu estou aqui da tribuna cobrando – que o Governo Federal, através do Ministério da Justiça e do Ministério das Relações Exteriores assumam essa situação.
É inaceitável que um governo do Estado tenha que lidar com um tema tão delicado que não cabe a governos estaduais, inclusive por acordos internacionais, a questão dos refugiados, pois diz respeito ao Governo Central.
Primeiro, eu queria cumprimentar o Governador Tião Viana pelo gesto humanitário, ele como médico, ele como ex-senador que sempre demonstrou aqui dessa tribuna amor pelo próximo. Já foram gastos mais de Rid=”mce_marker” milhão por parte do Governo do Estado dando hospedagem, alimentação e acolhida digna para essas pessoas.
Mas a situação é insustentável. O Brasil não pode permitir que essa situação fique nas costas do Governo do Estado e eu peço aqui que a Presidência do Senado possa solicitar as providências imediatas do Palácio do Planalto, do Ministro das Relações Exteriores e do Ministro da Justiça para que o Brasil não tenha que lamentar situações mais graves que possam decorrer dessa situação tão vexatória que irmãos nossos estão passando.
Então, o Governo do Estado não tem condições de tratar de um tema que extrapola os limites do País, que tem que ser tratado com o Peru, que tem que ser tratado com o Equador
com o Equador, por onde passa, e com o próprio Haiti.
O Brasil está liderando a força de paz no Haiti e não tem sentido nenhum que esse tráfico de seres humanos fique acontecendo. Há indícios fortes de que há um comércio por traz desse sofrimento e dessa situação de miséria que este povo vive.
Venho à tribuna do Senado para solicitar providências por parte do Governo Federal, como fez hoje um pedido ao Ministro da Justiça o Governador Tião Viana, acompanhado do secretário de direitos humanos do Estado, Secretário Nilson Mourão, que é também meu suplente aqui no Senado.
São esses os meus pedidos e essa cobrança do Governo Federal para que o Brasil possa dar um tratamento adequado a esse povo que já viveu uma tragédia em janeiro do ano passado, por conta do terremoto, e agora vive essa tragédia que fere os princípios elementares dos direitos humanos consagrados pela Organização das Nações Unidas.
Sei que o Brasil é um país que respeita os direitos humanos e precisa imediatamente dar um tratamento adequado a esse problema que é tão grave e que extrapola os limites do Governo do Estado do Acre.
Muito obrigado, Sr. Presidente.