Jorge Viana: “Não compreendo como o parlamento brasileiro, que perde prestígio e respeito a cada pesquisa, não faz o que lhe cabe como contribuição para que o Brasil fique melhor”Ao se eximir de aprovar uma reforma política que efetivamente aperfeiçoe os mecanismos de representação popular, o parlamento brasileiro está perdendo a oportunidade de resgatar sua imagem perante a opinião pública. Esta foi a avaliação do senador Jorge Viana (PT-AC), vice-presidente do Senado, em pronunciamento ao plenário nesta terça-feira, quando expressou sua frustração com as notícias mais recentes vindas sobre o projeto de reforma da Câmara dos Deputados. “Não compreendo como o parlamento brasileiro, que perde prestígio e respeito a cada pesquisa, não faz o que lhe cabe como contribuição para que o Brasil fique melhor”, lamentou.
Para o senador petista, as regras vigentes na disputa política, especialmente a permissão legal para que empresas participem das eleições financiando candidatos, vêm desmoralizando o processo cada vez mais. “Todos falam que a popularidade da Presidenta caiu muito. É verdade. Mas ninguém se pergunta qual é a popularidade do Senado e a Câmara perante o povo brasileiro. É muito pior do que a da presidenta Dilma”, apontou o senador, para quem o desprestígio de ocupantes de cargos eletivos, hoje, nasce em grande parte nos escândalos de corrupção vinculados ao financiamento de campanhas.
Jorge Viana fez duras críticas ao arremedo de “reforma política” em curso na Câmara dos Deputados, onde uma decisão do presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ameaça impor medidas que não só não reformam o atual modelo como aprofundam suas distorções. “É o pior dos mundos. Não fazer nada no caminho da reforma política é dizer, por outras palavras ou por esse gesto, que defendemos a situação em que nos encontramos. É dizer que defendemos uma situação que está levando à desmoralização da atividade político-partidária”, protestou Viana.
Esquema para constitucionalizar doações privadas
O mais grave na movimentação em curso na Câmara, aponta o senador petista, é um esquema que teria sido montado para institucionalizar o financiamento empresarial de campanha, apontado por amplos setores como a principal raiz da corrupção na política. As contribuições de pessoas jurídicas a partidos e candidaturas estão em análise no Supremo Tribunal Federal, com a maioria dos votos dos ministros apontando para a vedação do financiamento privado, por ser inconstitucional. Entretanto, um pedido de vistas do ministro Gilmar Mendes feito em abril do ano passado travou a conclusão do julgamento. E setores da Câmara correm para aprovar uma emenda constitucional que legitime as doações de empresas.
“As pessoas não sabem, não lembram mais, mas quem liberou geral o financiamento de empresa em campanha foi o governo do PSDB em 1997, durante a presidência de Fernando Henrique Cardoso”, ressaltou Viana. “Empresário – o nome já diz – é quem empreende, quem visa ao lucro, quem tem que ter retorno. E assim a política passou a ser algo muito parecido com um negócio – um negócio muito ruim”, afirmou o senador. “Não tem sentido, depois dessa crise envolvendo corrupção e financiamento de partidos políticos, nós não discutirmos financiamento de campanha. Não tem sentido o caixa dois estar presente nas campanhas em todos os Estados e não o criminalizarmos”.
Piorar o que já está ruim
Os equívocos da movimentação em curso na Câmara, porém, não param por aí, como apontou o senador petista. “Algumas soluções parecem que vêm no sentido de piorar o que já está muito ruim”. A proposta que tende a ser aprovada naquela Casa, por exemplo, mantém as coligações partidárias, a criar o voto distrital puro, o chamado “distritão” — acabando com o voto proporcional e transformando a eleição para cada cadeira do Legislativo em um pleito majoritário. “Imagine a carnificina que vai ser, não mais entre quem é de uma visão ideológica com outra, mas dentro do próprio partido. Um dando cotovelada no outro para estar no primeiro lugar da escada”, criticou Viana.
Ele apontou ainda outras “barbaridades”, como o prolongamento dos mandatos executivos para cinco anos, com o fim da reeleição. “O interessante é que o PSDB se envolveu – lamentavelmente numa época em que não se investigava nada – no maior esquema de compra de voto para passar a emenda da reeleição [beneficiando Fernando Henrique Cardoso]. E agora eles querem o fim da reeleição. Será que é com medo da candidatura do Lula? Que nem está posta?”.
Propostas para melhorar
Jorge Viana é autor de pelo menos quatro projetos voltados para o aperfeiçoamento do processo político eleitoral. O PLS 129/2011, em tramitação no Senado, permite que todos os partidos, até mesmo aqueles que não alcançaram o coeficiente eleitoral participem da distribuição dos lugares não preenchidos pelo coeficiente partidário. “Um partido que tem ideologia, que tem líder, que quer disputar vai lá, chega bem pertinho do coeficiente, mas aqueles votos são perdidos hoje, porque só entram nas sobras os partidos que atingiram o coeficiente”.
Também de 2011, o PLS 146 fixa limites de gastos para os candidatos, obrigando-os a apresentar também uma estimativa de orçamento de campanha. “Candidato não pode fazer campanha sem tornar público quanto vai gastar. E deve haver um teto, criando regras para uma disputa mais equânime”, explicou Viana. Essa proposta já foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado.
O PLS 264/2013, rejeitado no Senado, pretendia proibir o financiamento de campanhas eleitorais por empresas. Foi apresentado com apoio da Ordem dos Advogados do Brasil e dos movimentos de combate à corrupção eleitoral, mas isso não foi suficiente para levar a proposta adiante. “Se nós não dermos esse passo e tirarmos o poderio econômico das eleições, nós não vamos resgatar a credibilidade que buscamos perante a sociedade”, enfatizou Viana. Já o PLS 282/2013 criminaliza o caixa dois nas campanhas eleitorais e está em tramitação.
Prazo curto
Viana concluiu seu pronunciamento fazendo um chamamento aos senadores para que a Casa se dedique a aprovar alterações na legislação eleitoral capazes de contribuir efetivamente para o resgate da credibilidade da atividade política. “Estamos próximos de um prazo fatídico, que é outubro [limite para a aprovação de regras eleitorais que possam valer em 2016]. Temos mais uma vez a oportunidade de trabalhar para que a democracia representativa possa ter de volta o prestígio perdido. Se fizermos algumas modificações, como um sinal, como uma atitude no sentido de fazer da atividade política uma atividade limpa, nós vamos começar nesse processo”, conclamou.
Cyntia Campos