Consumo da classe D irá superar R$ 400 bilhões

Este é o cálculo do Brasil Econômico para o potencial de compra desta parcela da população, que já supera a da classe B, no Brasil em 2012, um avanço de 15% ante 2010

Os próximos dois anos devem apontar para uma condição inédita de aumento do consumo no Brasil: pessoas que há pouco mais de uma década viviam em condições de privação quase completa poderão sustentar boa parte do crescimento da atividade econômica no país.

Hoje, com o aumento da renda a classe D, pessoas que ganham entre R$ 705 a R$ 1.126 – pouco mais de dois salários mínimos, segundo a Fundação Getulio Vargas (FGV) – ganha espaço e deve ser o próximo estrato social a mostrar grande poder de compra já a partir do ano que vem, superando inclusive a classe B.

Cálculos do Brasil Econômico apontam que o potencial de consumo desta fatia de brasileiros irá ultrapassar a marca de R$ 400 bilhões no Brasil em 2012. Isso representa um avanço de 15% em relação a 2010.

Se levarmos em conta os R$ 2,5 trilhões consumidos pelos brasileiros neste ano, segundo cálculos da IPC Marketing, o valor já se aproxima de um quinto do total.

Uma das razões é que, em 2012, o salário mínimo – referência de renda para boa parte dessa parcela social – terá reajuste de mais de 13%.

A população já percebe essa realidade no bolso.
Moradora de Paraisópolis, zona sul de São Paulo, a diarista Maria Madalena da Silva Reis fica satisfeita ao perceber que atualmente consegue ter acesso a muito mais itens do que há dez anos. “Antes a gente ganhava para comer e agora dá para comprar um sapato, uma roupinha. Ficou possível comprar muita coisa com o nosso salário”, diz.

A facilidade trazida com o uso de meios de pagamento como cartão de crédito também contribui. “Costumo pagar o mercado em duas vezes para criar oportunidade de quitar logo e poder comprar de novo”.

Com quatro filhos, ela conta que só o mais novo ainda não tem seu próprio cartão. Mas, para todos eles, quitar a fatura em dia é sagrado. “Se eu perceber que não vou conseguir pagar, nem compro”.

Para Renato Meirelles, sócio-diretor do instituto de pesquisas Data Popular, esse processo de erradicação da miséria permite prever que até 2014 é possível que o Brasil realmente veja a classe E ser extinta. Além disso, as possibilidades de ascensão social, segundo ele, também têm sido cada vez mais ampliadas nos estratos mais baixos da população. “Há cerca de 800 mil novos universitários na classe D. Há muita gente entrando no mercado de trabalho com empregos formais. E a proporção desses dois indicadores cresce mais na classe D no que nas demais”

Em razão dessas e de outras evoluções, Cláudio Silveira, sócio-diretor da Quorum Brasil, prevê que daqui a dois anos esse estrato social terá um desenho completamente diferente do atual. Para ele, trata-se de um perfil de consumo muito divergente do da classe C, tanto em relação às preferências de aquisição quanto aos hábitos de pagamento.“Parece que eles aprenderam com a classe C o que não devem fazer. Enquanto mais da metade da classe C tem o rendimento comprometido com financiamentos ou está endividada, a classe D tem a preocupação constante de ter o nome limpo”, diz. Além disso, em vez de procurarem produtos eletrônicos portáteis, CDs, DVDs ou fazerem compra pela internet, os brasileiros da classe D tendem a dar prioridade a bens que aumentem o conforto de suas casas. Mesmo assim, segundo Silveira, 60% deles já conseguiram comprar um carro novo e 72% querem adquirir um imóvel. “Eles têm muitas necessidade a serem supridas e sabem que não podem errar nas suas aquisições, pois não terão dinheiro suficiente para outra compra.Por isso, não querem porcaria.”

PARA ONDE VAI O DINHEIRO
Classe D tem 52% da renda comprometida com despesas básicas, enquanto gastos com cartão de crédito e prestações chegam a 23% dos ganhos  

PREVISÃO DE AMPLIAÇÃO DE GASTOS
Moradia merece maior atenção, seguida de pagamento de dívidas atuais, mas 24% declararam interesse em comprar mais

DESAFIO AOS BANCOS
Público emergente poupa 35% da renda mensal

A linguagem adotada pelas financeiras para oferecer crédito às classes C, D e E – mais próxima da realidade dessas pessoas – também pode ser um dos fatores que afastam esse público dos grandes bancos. “Eles tendem a perceber que investimento é uma coisa que só rico faz, mas não associam o ato de investir com o hábito que têm de poupar. Isso ocorre muitas vezes porque o mercado financeiro costuma usar a mesma linguagem para todos os públicos e acaba afastando alguns”, avalia Paulo Cunha, professor da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM).

Em média, 35% das pessoas da classe D fazem poupança.
Pesquisa da Quorum Brasil, divulgada no fim de setembro, mostra que 23% da renda é destinada a prestações, sendo que 12% para cartão de crédito e 11% para prestações de lojas.

Assídua usuária de cartão de crédito e ocasionalmente de crédito rotativo, Angela Bonavita orgulha-se dos bens que tem conseguido adquirir com o acesso facilitado a esses produtos financeiros. “Dei um videogame de presente para o meu filho de 17 anos, parcelado em 12 vezes”.

ASCENSÃO
19 milhões – Este é o total que deixou as classes DE em 2010, enquanto 12 milhões chegaram às classes AB.

Em termos relativos, em 2005, AB e C juntas eram 49% da população e em 2010, somavam 74%, segundo a Cetelem.

Sorocred quer ampliar crédito e virar banco
Focada em classe popular e emissão de cartões, empresa mira outros financiamentos.  

Há cerca de um ano, a Sorocred, que atua focada no atendimento das classes populares, abriu uma financeira para ampliar a oferta de produtos para esse público e prevê que em pouco tempo terá condições de se tornar um banco voltado para esse estrato social.

Antes restrita à emissão de cartões de crédito, a companhia agora se embrenha também em financiamento para aquisição de bens de valores mais altos, como eletrodomésticos e carros. “Enquanto a indústria se mobiliza para gerar novos produtos para as classes C, D e E, nós nos organizamos para oferecer a outra ponta, o crédito para que eles tenham acesso a esses produtos”, informa Wilson Justo, diretor da Sorocred.

A Sorocred emitiu cerca de 700 mil cartões neste ano e credita boa parte de seu crescimento à flexibilidade nas negociações que oferece. Mas os planos para a expansão da atuação em cartões continuam.

Neste ano, a empresa já fechou acordo com a Redecard para aumentar a aceitação de seus cartões e, para o ano que vem, já tem um acordo com a Cielo na mesma linha, com pretensão de chegar a cerca de 2 milhões de estabelecimentos no Brasil até o fim de 2012.

Hoje a Sorocred tem parceria com 150 mil pontos de venda no país. “O que percebemos é que nossos clientes, que antes praticamente só circulavam em seus próprios bairros, compraram carros, conquistaram mais mobilidade, e hoje querem que seu cartão seja aceito em qualquer lugar”, afirma Justo.

A instituição financeira não divulga a taxa de juro cobrada por seus financiamentos – muitos feitos diretamente pelos lojistas com os quais têm parcerias.

Segundo dados do Banco Central (BC), a taxa média cobrada pelo crédito pessoal no país é de cerca de 50% ao ano e o cheque especial das pessoas físicas custava 186,7% ao ano em setembro.

Em geral, analistas avaliam que os custos cobrados por financeiras como a Sorocred se aproximam mais das taxas do cheque especial do que da média de crédito pessoal. “O crédito cresceu em todas as categorias, mas na classe D esse crescimento chama mais atenção porque houve uma parcela grande da população que começou a conseguir comprovar renda e endereço, o que a insere na formalidade”, afirma Miguel de Oliveira, vice-presidente da Associação Nacional dos Executivos de Finanças (Anefac).

Segundo ele, justamente em razão da ampliação desse volume de movimentação de crédito os grandes bancos também começam a atender a esse público. “Passaram a oferecer um produto como o crédito consignado (financiamento com desconto direto em folha de pagamento e juros baixos), porque o volume valia a pena”, diz.

De modo geral, contudo, Oliveira destaca que o crédito no Brasil ainda tem muito a crescer. Não só nas camadas populares. “É muito pouco o crédito representar apenas 48% do PIB brasileiro”.

Fonte: Brasil Econômico

Foto: ICNews.com.br

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