Quanto mais apoiadores de Jair Bolsonaro uma cidade tem, mais sua população corre risco de contrair Covid-19 e, consequentemente, morrer em decorrência da doença. É o que sugere estudo publicado pelos professores Sandro Cabral, do Insper (Instituição de Ensino Superior e Pesquisas); Nobuiuki Ito, do Ibmec (Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais); e Leandro Pongeluppe, da Universidade de Toronto, no Canadá.
A pesquisa identificou a correlação entre o número de infectados pelo novo coronavírus e os votos recebidos por Bolsonaro no segundo turno das eleições de 2018. Em outras palavras, quanto mais simpático ao atual presidente um município se mostrou no pleito presidencial, mais afetado é hoje pela Covid-19.
A 16km de Porto Alegre, Nova Pádua (RS) é um claro exemplo do que mostra a pesquisa. A cidade deu a Bolsonaro 93% dos votos válidos no segundo turno presidencial. Hoje, segundo o estudo, o município registra 11.477 casos de Covid-19 para cada grupo de 100 mil habitantes e tem ainda a maior taxa nacional de mortalidade: 351 óbitos por 100 mil habitantes, enquanto a média do Brasil é 206.
Confira o quadro com os casos de Covid-19 nas 15 cidades onde Bolsonaro foi mais votado
Como é possível ver na tabela acima, das 15 cidades onde o atual presidente teve melhor desempenho, 11 ficam em Santa Catarina, onde ele se saiu melhor, com 75,9%. E mesmo nesse estado é possível perceber a influência nefasta do bolsonarismo sobre a saúde pública.
Nos 122 municípios catarinenses em que Bolsonaro recebeu 75,9% ou mais dos votos, a média de casos de Covid-19 por 100 mil habitantes é de 13.404. Já nas 173 cidades onde o desempenho dele ficou abaixo desse índice, a média cai para 12.381.
No outro extremo, na Bahia, pior estado para Bolsonaro na eleição (27,3% dos votos válidos), o fenômeno se repete. Dos 319 municípios baianos em que a votação dele foi igual ou menor a esse índice, a média de casos por 100 mil habitantes é de 4.981. Já nas 98 cidades em que o atual presidente teve desempenho superior a 27,3%, a média salta para 8.013.
A mesma lógica é observada quando se analisa apenas as 324 cidades brasileiras com mais de 100 mil habitantes. Nos 258 municípios onde Bolsonaro obteve 50% ou mais dos votos, a média fica em 7.752. Nas 66 cidades abaixo desse percentual, o número cai para 7.053.
Outra forma de notar o risco representado pelo bolsonarismo é comparar essa segunda tabela, que traz os dados dos 15 municípios onde Bolsonaro foi menos voltado, com a primeira. Enquanto nas cidades menos simpáticas ao atual presidente, o número de casos por 100 mil habitantes varia de 1.046 a 6.562, nas localidades mais bolsonaristas esses valores vão de 6.783 a 22.579.
Em Guaribas (PI), onde Bolsonaro obteve apenas 2% dos votos válidos no segundo turno, o cenário é bem diferente do observado em Nova Pádua. Enquanto o toal de casos de Covid-19 por 100 mil habitantes na cidade gaúcha é de 11.477, no município piauiense é de 2.236.
A onda Bolsonaro
Os dados trazem fortes indícios de que o discurso de Bolsonaro tem o poder de amplificar a pandemia. Um sinal de alerta para cidades que receberam recentemente a visita do atual presidente, que nos últimos dias fez atos eleitoreiros, repletos de aglomeração e sem uso de máscara, no Nordeste e no Rio de Janeiro.
E não é exagero. Coincidência ou não, os locais por onde Bolsonaro passa costumam registrar piora nos índices de controle da pandemia. Após encontro entre o presidente e o governador do Acre, Gladson Cameli (PP), em 24 de fevereiro, a ocupação de leitos no estado saltou de 88,7% para 96,2%, em 8 de março.
Ceará, Paraná e Santa Catarina observaram algo semelhante após as visitas cheias de aglomeração. Em 26 de fevereiro, Bolsonaro esteve em Tianguá (CE). Nesse dia, 80% dos leitos de UTI estavam ocupados. Quinze dias depois, não havia mais vaga e pacientes tiveram de ser transferidos para outros municípios.
Em 4 de fevereiro, o presidente visitou Cascavel (PR). Duas semanas depois, não havia mais leitos disponíveis para internação. Mesma situação se deu em São Francisco do Sul (SC). O presidente promoveu aglomeração em 13 de fevereiro, quando a média de registros de caso estava em 12,4 por dia. Duas semanas depois, esse valor dobrou, indo a 24,5.
O curioso, para não dizer trágico, é que Bolsonaro ignora a ciência apenas no Brasil. Na segunda-feira (24), Bolsonaro desembarcou no aeroporto de Quito, no Equador, usando máscara, assim como na cerimônia de posse do presidente Guilhermo Lasso.