A melhora da situação fiscal brasileira e a deterioração das contas públicas dos países europeus puseram os custos para financiamento da dívida pública brasileira e europeia em rotas contrárias. Enquanto França, Espanha, Itália, Portugal e Grécia viram suas taxas de juros crescerem ao longo do ano, o Brasil conseguiu emitir títulos públicos no exterior pagando juros menores. Os juros dos títulos do Tesouro brasileiro de dez anos emitidos em dólares caíram de 4,3% para 3,4%, num nível ligeiramente acima dos títulos alemães.
Entre os europeus, somente a Alemanha conseguiu vender títulos pagando juros menores que os emitidos no início do ano. Os papéis de dez anos do país pagavam ontem 2,2% ao ano, ante 2,9% em 3 de janeiro. Ainda assim, o valor pago pelos títulos já estava acima do 1,72% registrado em 9 de novembro. A mais recente emissão de títulos alemã, feita na quarta-feira, foi considerada uma das piores da História por causa da baixa demanda pelos papéis.
– A Alemanha ainda tem uma boa condição fiscal e atraiu parte do capital que saiu de Itália e Espanha. Mas, nas últimas semanas, a taxa de rendimento dos títulos subiu, o que já mostra uma preocupação dos mercados com o país – diz Guilherme Martins, economista do Itaú BBA.
Para Raphael Martello, economista da Tendências Consultoria, o desempenho do Brasil reflete a percepção do mercado de que o controle dos gastos públicos deve se manter no futuro.
– O Brasil deve se aproximar de diversos países que estavam tendo taxas muito baixas de juros e que agora devem ser permanentemente mais elevadas, refletindo o seu próprio risco fiscal, enquanto não houver uma união fiscal europeia.
A situação mais grave é de Portugal e Grécia, que recebem auxílio do Fundo Monetário Internacional (FMI). Os títulos gregos de dez anos passaram de uma taxa de 11,73%, no início do ano, para 28% ontem. Já os papéis portugueses saíram de 6,95% para 12,4% no mesmo período.
– Hoje não há nem mercado para esses títulos, e muitos deles se encontram em processo de renegociação – afirma Martello.
Na Itália, os juros passaram de 4,7%, em janeiro, para 7,1% ontem, e na Espanha, que amarga a maior taxa de desemprego da União Europeia, o custo do financiamento público saiu de 5,4% para 6,6% ontem. A França, que já está ameaçada de perder sua classificação “AAA”, teve uma alta mais modesta: de 3,3%, em janeiro, para 3,7%.
Na Europa, juro alto aponta risco de calote
Para João Medeiros, diretor da Corretora Pionner, se o juro alto se sustentar por muito tempo para rolagem dos títulos europeus, haverá algum tipo de default (calote) em algum momento. Na Grécia, lembra ele, os papéis perderam 50% do valor quando os juros para rolagem de seus títulos chegaram em níveis insuportáveis. Hoje, o mercado pede juros de 28% pelos papéis gregos, um “juro de default”, explica ele.
O economista da Corretora Cruzeiro do Sul Jason Vieira diz que, pelo histórico de juros baixos nesses países, taxas na casa de 6% a 7% não se sustentam a longo prazo. Esse patamar de juros, aliás, tem se tornado uma espécie de divisor de águas na atual crise. Quando os títulos de Portugal, Grécia e Irlanda superaram esse patamar, esses países precisaram recorrer à ajuda internacional.
(Paulo Justus, João Sorima Neto – O Globo)