Debatedores manifestaram preocupação com o teor punitivo do projeto de lei (PL 88/2023) que trata da responsabilidade educacional na garantia de oferta e de padrão de qualidade na educação básica pública. A audiência pública foi realizada pela Comissão de Educação (CE) nesta quinta-feira (22/6).
Essa foi a quarta audiência para debater o projeto de autoria do presidente da CE, senador Flávio Arns (PSB-PR), relatado pelo senador Confúcio Moura (MDB-RO). Pelo texto, os prefeitos que não cumprirem as metas governamentais na área da educação estariam sujeitos a ação civil pública e poderiam ser enquadrados em crimes de responsabilidade.
Para a senadora Teresa Leitão (PT-PE), proponente da série de debates, é preciso uma lei que vá além da simples punição. “Não queremos uma lei meramente punitiva, mas queremos uma lei pedagógica”, explicou.
O vice-presidente de Assuntos Jurídicos da Frente Nacional dos Prefeitos (FNP), Izaias Santana, prefeito de Jacareí (SP), pediu cuidado com a criação de normas que atingem toda a Federação. Segundo ele, a forma como o projeto trata o crime de responsabilidade para prefeitos foge do padrão das leis e da Constituição de 1988. O prefeito também chamou a atenção para “o risco da hipernomia”, quando muitas leis tratam de um mesmo assunto, às vezes até com divergências entre os textos.
“No projeto, tipificamos prefeitos e governadores, mas excluímos o responsável pelo financiamento da educação, que é o presidente. Estamos criando uma discriminação não tolerada pela Constituição, já que o ensino é responsabilidade compartilhada”, argumentou.
A vice-presidente de Educação da FNP, Margarida Salomão, prefeita de Juiz de Fora (MG), classificou a iniciativa como importante, por tratar da qualidade da educação. Porém, afirmou que a Frente vê risco de criminalizar os gestores municipais, que são a “parte mais fraca da Federação”. Para a prefeita, é fundamental implementar as disposições de controle que já existem.
“Há insuficiência crônica e estrutural de meios para assegurar alguns objetivos, como a universalização do acesso à creche. Cadê os recursos para isso?”, questionou a prefeita.
O secretário de Articulação Intersetorial do Ministério da Educação (MEC), Maurício Holanda Maia, tem impressão semelhante. Ele manifestou preocupação com a forma como projeto trata o controle externo para os prefeitos. Maia disse que a presença dos órgãos de controle é importante para o país, mas pediu o que chamou de racionalidade política sobre a gestão pública. Informou que já enviou sugestões de emendas para o senador Arns.
Resultados e parcerias
O professor Fernando Luiz Abrucio, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), disse que é importante ter uma lei que pense a qualidade da educação no país. Segundo o professor, há avanços desde a Constituição de 1988, mas há ainda muito a fazer para conseguir “a revolução da educação”. Ele reconheceu que é meritório ter uma gestão voltada para resultados, entretanto apontou alguns problemas no texto do projeto.
Para o professor, é um erro vincular resultado e punição. Ele sugeriu parcerias com os órgãos de controle na busca da qualidade do ensino e mais insumos para que os resultados sejam alcançados. “Os que tiverem melhores resultados vão ganhar mais recursos. Isso é ótimo. Mas quem não tiver grandes resultados não deveria ser preso. Nenhum país com educação de qualidade avançou com punição, mas com parceria”, alertou Abrucio.
Para o secretário-extraordinário para a Transformação do Estado do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, Francisco Gaetani, as leis mais rigorosas não garantem necessariamente o aumento da qualidade da educação pública. Gaetani disse que a responsabilização é apenas um elemento em favor dos resultados e defendeu mais investimentos na capacitação dos servidores da educação.
“Estamos tão preocupados com a responsabilização que estamos esquecendo os meios para que os governos funcionem”, ponderou o secretário.