Como a grande maioria das testemunhas, Orlando Magalhães da Cunha garantiu que medida teve amparo legalA Comissão Especial do Impeachment (CEI) ouviu, na tarde desta terça-feira (21), o analista de Planejamento e Orçamento e ex-subsecretário de Planejamento e Orçamento do Ministério da Justiça (MJ), Orlando Magalhães da Cunha, que esclareceu os senadores a respeito de um dos decretos de crédito suplementar assinados pela presidenta Dilma Rousseff em 2015 e usados pelos defensores do golpe como sustentação para o impedimento da chefe do Executivo. A testemunha é servidor de carreira e trabalha com orçamento desde 1988.
O decreto analisado pelo analista do MJ foi editado a pedido do Poder Judiciário, suplementando o orçamento da Justiça Federal, da Justiça do Trabalho e da Justiça Eleitoral. O mesmo instrumento legal tratava, ainda, da suplementação de atividades do Ministério da Justiça – especificamente da Polícia Rodoviária Federal e da Polícia Federal, permitindo a utilização de recursos oriundos do superávit de taxas, multas, doações de pessoas físicas e de instituições públicas e privadas em atividades desses dois órgãos de fiscalização.
Respondendo ao questionamento da senadora Fátima Bezerra (PT-RN), Orlando Magalhães da Cunha negou que esse decreto de crédito suplementar tenha representado elevação do limite orçamentário do Ministério previsto no decreto de programação orçamentária e financeira e afirmou que a medida teve amparo legal.
Uma das peças de sustentação do pedido de impeachment contra a presidenta Dilma baseia-se na edição de quatro decretos de crédito suplementar, totalizando valores de R$ 1,8 bilhões, que para os partidários do afastamento da presidenta teriam sido editados em descumprimento à meta fiscal, já que, segundo essa interpretação, a medida só poderia ser tomada com autorização legislativa. Essa interpretação tem sido sistematicamente negada pela maioria das testemunhas ouvidas pela CEI.
“Todas as testemunhas que já falaram à comissão — com exceção de um procurador do Ministério Público junto ao TCU e de um auditor do TCU – foram categóricas em dizer que a interpretação vigente na época era que o artigo 4º da Lei Orçamentária Anual de 2015 autorizava a edição desses decretos”, lembrou Fátima Bezerra. Só em outubro de 2015 é que o Tribunal de Contas da União viria a alterar sua interpretação sobre essa postura, mudando uma orientação vigente há 15 anos.
Orlando Cunha explicou aos senadores que no caso da Polícia Federal e da polícia Rodoviária Federal, os recursos liberados para utilização por meio do decreto só poderiam ser gastos por aquelas instituições. “Pela Lei de Responsabilidade Fiscal, recursos legalmente vinculados à finalidade específica serão utilizados exclusivamente para atender ao objeto da sua vinculação, ainda que em exercício diverso daquele em que ocorreu o ingresso”.
Ele esclareceu que a Polícia Rodoviária, por exemplo, havia feito uma previsão orçamentária do valor que arrecadaria com multas, mas essa arrecadação acabou sendo maior e, para usar esses recursos arrecadados a mais, precisava de um decreto de crédito suplementar. “Esse dinheiro só pode ser aplicado na segurança das rodovias federais e em nenhum outro lugar”.
O senador Lindbergh Farias (PT-RJ) destacou o papel que os servidores de carreira têm desempenhado durante os trabalhos da CEI, esclarecendo e desmistificando os pretextos para o pedido de impeachment. Desatrelados da nomeação política, esses técnicos têm oferecido importantes testemunhos à comissão. “Não são membros de partido, são servidores que ficam, ainda que mudem os governos”, apontou o senador. “Uma coisa da qual a gente tem de ter orgulho é do nível construído na nossa democracia”.
O advogado da presidenta Dilma Rousseff, o ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo, destacou que o decreto de crédito suplementar assinado pela presidenta Dilma em favor da Polícia Federal favoreceu exatamente o combate à corrupção—o pretexto de tantos opositores da chefe do executivo para defender sua deposição. Em 2015, o governo teve de fazer um fortíssimo contingenciamento, o maior contingenciamento da história, por respeito às metas fiscais. “O Ministério da Justiça, naquele momento, tinha uma decisão a tomar. A Lava Jato não podia parar. Se eu tivesse, ao invés de ter pedido o decreto, solicitado um projeto de lei, a Lava Jato teria parado, porque não haveria tempo, por maior que fosse a rapidez do Legislativo, nós teríamos dois ou três meses para que pudesse haver essa alocação”, explicou. “Agora querem condenar a presidenta da República por um decreto como esse, que jogou para a Polícia Federal a possibilidade de continuar normalmente as suas atividades”.