A Agência Nacional do Petróleo (ANP) abriu consulta pública para isentar da exigência de “conteúdo local” a construção de uma plataforma prevista para operar no campo de Libra. Segundo a Petrobras, sob a presidência de Pedro Parente, a plataforma só será viável economicamente se o consórcio for liberado das obrigações previstas em lei — usar componentes fabricados no Brasil.
A consulta pública, nova porta aberta para a desnacionalização, terá duração de 30 dias, contados a partir da publicação no Diário Oficial da União, encerrando-se com audiência pública em 30 de março. Sétimo poço do bloco, Libra registra a maior coluna de óleo descoberta no pré-sal da Bacia de Santos, com 410 metros de espessura.
Além de comprometer a soberania do país, o fim da política de conteúdo nacional poderá resultar na perda de aproximadamente um milhão de empregos, apenas no setor, de acordo com a ABIMAQ (Associação Brasileira das Indústrias de Máquinas e Equipamentos).
Apenas este setor conta com cerca de 800 empresas espalhadas por praticamente todo o território nacional. Por conta da Lava Jato, apenas nos dois primeiros anos da operação, a Petrobras e suas subsidiárias demitiram 169,7 mil pessoas, ou seja, 61% da equipe de funcionários. A crise instalada no setor atinge principalmente o estado do Rio de Janeiro, mas se estende para outros estados produtores, com graves consequências sociais.
[blockquote align=”none” author=””]O governo Lula aprofundou a política de conteúdo nacional, cujo desmonte poderá resultar na perda de 1 milhão de empregos [/blockquote]
Historicamente, as exigências de conteúdo local foram implementadas com sucesso pela Petrobras como instrumento de desenvolvimento nacional.
Em meados dos anos setenta, o então presidente general Ernesto Geisel decretou uma lei garantindo à Petrobras o direito de comprar produtos nacionais por até o dobro do preço externo, de acordo com Fernando Siqueira, vice-presidente da AEPET (Associação dos Engenheiros da Petrobras). “O resultado foi a formação de uma rede de mais de 5 mil fornecedores de equipamentos e serviços para a empresa”, diz Siqueira, que participou daquele processo.
Em 1998, com o Decreto 3161, conhecido como “Repetro”, o presidente Fernando Henrique Cardoso liquidou com a politica vigente. A medida isentou as empresas estrangeiras de imposto de importação ao mesmo tempo em que manteve a cobrança de ICMS nos níveis praticados das empresas nacionais. No final dos anos noventa, a Petrobras realizava mais de 65% de suas compras de bens junto a empresas brasileiras. Antes de FHC, Collor já havia liberalizado o setor para a ação predatória estrangeira.
“A exigência de conteúdo local, mesmo sendo apenas um em meio a tantos outros fatores de decisão, tem recebido um destaque especial, como se fosse a grande causadora de todos os problemas ocorridos com a indústria do petróleo no país”, adverte a ABIMAQ. Segundo a associação, as exigências de conteúdo local foram sendo modificadas até a introdução, em 2005, da participação local por itens, que persiste até hoje. “Embora tenha falhas, a cartilha teve o mérito de permitir que o mercado supridor nacional fosse visível e tivesse oportunidade de participar”.
Durante o governo Lula, o regime de partilha na exploração do pré-sal aprofundou a política de conteúdo nacional, incentivando o desenvolvimento das empresas do setor. Ao mesmo tempo, o governo petista promoveu a recuperação dos estaleiros, que também haviam sido sucateados pelas políticas neoliberais tucanas.
Ainda de acordo com a ABIMAQ, “cabe lembrar que a crise no Brasil é generalizada e não apenas na indústria do petróleo”. Para o presidente do Clube de Engenharia, Pedro Celestino, “de 2015 para cá aplicou-se uma política de interesse do capital financeiro, que veio a se acentuar com a posse de Michel Temer, cuja visão é absolutamente descompromissada com o interesse nacional”.
“O desmonte da política de conteúdo local mínimo, que as petroleiras estrangeiras, desta vez com decidido apoio da Petrobras, querem revogar” é um exemplo dessa política lesa-Pátria. “São 60 anos de história irresponsavelmente destruídos”, denuncia o presidente do Clube de Engenharia em entrevista ao portal 247.
Não por acaso, uma das primeiras ações dos golpistas foi abolir a lei que obrigava a Petrobras ter parte não inferior a 30% em projetos de extração de petróleo na plataforma continental.
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