Representante sindical da Associação dos Profissionais do Correio defendeu participação na gestão do fundo PostalisA situação atual dos fundos de pensão de estatais foi tema de audiência pública na Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDH) do Senado, nesta quinta-feira (7). Os participantes enfatizaram as suspeitas de má gestão no fundo dos Correios (Postalis), cujo déficit está sendo repartido entre funcionários da estatal. Para os representantes dos trabalhadores da empresa pública, um dos principais problemas é que a gestão do Postalis não é feita pelos trabalhadores ou, pelo menos, compartilhada com eles.
Autor do requerimento para a realização da audiência, o presidente da CDH, senador Paulo Paim (PT-RS), ressaltou que possíveis prejuízos dos fundos de estatais podem comprometer a aposentadoria de milhões de brasileiros. Os problemas, segundo ele, são urgentes e é preciso encontrar uma forma de recuperar os prejuízos sofridos pelas entidades de previdência complementar sem prejudicar os trabalhadores que para elas contribuem. “O fato é que desde o final do ano passado sabia-se que a situação dos fundos era preocupante”, afirmou.
Um fundo de pensão é a fundação ou sociedade civil responsável pela administração do patrimônio de contribuições de participantes (empregados) e patrocinadora (empresa contratante), tendo como objetivo acumular reservas para complementar as aposentadorias. Cabe à entidade fazer investimentos que garantam a sustentabilidade do fundo em longo prazo. No caso do Postalis, a diretoria é formada por indicações políticas, não sendo compartilhada com os servidores dos Correios.
O representante da Federação Nacional dos Trabalhadores em Empresas de
Correios e Telégrafos e Similares (Fentect), Edson Dorta, disse que os trabalhadores da estatal avaliam entrar na justiça para sair do Postalis, reaver o dinheiro aplicado e constituir um novo fundo.
“Apesar de o patrocinador colocar a sua parte, o fundo de pensão é dos trabalhadores. Por isso, acreditamos que a única maneira de resolver o problema é colocar o fundo sobre o controle do trabalhador. E não essas farsas que são essas participações [no comando dos fundos], mesmo que seja feita de forma paritária”, criticou.
Dorta disse que os problemas no fundo da estatal remontam ao período da ditadura militar e que foram registrados déficits também durante a gestão do governo Fernando Henrique Cardoso. “Tivemos em 95 um rombo no Postalis. Queriam fazer a mesma coisa que agora, repassar a conta para o trabalhador”, disse.
A criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) também foi criticada por Dorta. Ele acredita que uma CPI não vá resolver a questão do fundo. “Existe uma caça às bruxas para dar um golpe de Estado no País. A gente sabe que a CPI é uma campanha de publicidade contra, inclusive, uma empresa pública”.
Já o representante da Associação dos Profissionais do Correio (Anapar), Jakson Luiz Mendes Gonçalves, apesar de também ser favorável à participação dos trabalhadores na gestão do fundo – de forma compartilhada –, ele defende a criação de uma CPI.
Para Gonçalves, apesar de uma comissão de inquérito não ser a única solução, é preciso investigar possíveis irregularidades. Ele afirmou que os gestores da Postalis venderam todos os imóveis do fundo.
“Se colocássemos o dinheiro debaixo do colchão seria muito melhor. Que investidores são esses [do fundo]? A empresa Correios não é especialista em investimento, mas nunca perdeu dinheiro com isso. Já no Postalis, que tem especialistas, sim. É preciso investigar”, defendeu.
Divisão da conta
O Postalis já admitiu que, no final de 2013, foi registrado um déficit técnico no valor de R$ 936,5 milhões. A justificativa para que os funcionários tenham descontos nos contracheques para cobrir eventuais prejuízos é que a legislação em vigor obriga que a medida seja adotada, sendo que os patrocinadores – no caso, os Correios – também contribuirão e de forma paritária.
O fundo da estatal têm dois planos previdenciários, o BD Saldado e o PostalPrev. Segundo a empresa, a contribuição extraordinária para cobrir o déficit é apenas para associados ao plano BD Saldado.
Os empregados admitidos após 2005 estão no plano PostalPrev, com cerca de 115 mil participantes ativos, que não têm qualquer alteração em suas contribuições. Já para os participantes do plano BD, a contribuição será menor que 6% do salário para a maioria (86,94% dos empregados ativos) por 15 anos e meio. O impacto médio, de acordo os Correios, será de 3,88% para os 71.154 empregados ativos no plano.
Na audiência da CDH, o senador Donizeti Nogueira (PT-TO) disse ser incompreensível como a divisão do déficit com os trabalhadores foi feita sem que estes tenham sido consultados. “O período de pagamento poderia ser maior, talvez de 30 anos, por exemplo. Não de 15 anos, comprometendo a renda dos trabalhadores”, disse.
Na justiça, os Correios respondem a um processo que pede o reconhecimento de uma dívida de R$ 1,15 bilhão com o fundo. A empresa já pagava parte de um déficit anterior até março do ano passado, mas interrompeu o pagamento por determinação do Ministério do Planejamento e do Tesouro Nacional. Os órgãos de controle concluíram que a estatal saldou integralmente sua parte com o término do plano definido. Segundo os Correios, uma consultoria foi contratada para avaliar o impasse.
Segundo a representante do Postalis na audiência, Maria Auxiliadora Alves da Silva, entre os motivos que levaram ao déficit estão investimentos feitos até 2011. Ela explicou que a maior parte dos recursos do plano BD deveriam estar aplicadas em títulos federais, considerados “seguros”, mas que isso não vinha ocorrendo.
“Quando a nova diretoria assumiu, em 2012, percebemos que apenas 2,2% dos R$ 5,4 bilhões de recursos do plano BD foram aplicados em títulos federais”, disse Alves. Ela disse que a nova diretoria já conseguiu redirecionar 13% do valor das aplicações do plano BD para investimentos seguros.
Em março, os Correios divulgaram uma nota responsabilizando administradores contratados pelo Postalis por parte dos investimentos ruins. “O instituto tem ações em curso na Justiça visando à recuperação de todos os ativos que deram prejuízo — entre elas, contra a gestora Atlântica e o banco BNY Mellon —, com decisões favoráveis até o momento”, diz o texto.
Exemplo
Representantes de outros fundos de estatais também participaram do encontro, como o da Petrobras (Petros), da Caixa Econômica Federal (Funcef) e do Banco do Brasil (Previ). O modelo adotado neste último, aliás, foi elogiado pelos participantes da audiência.
No Previ, por exemplo, a gestão é compartilhada com os funcionários do banco. Segundo o representante do fundo, Marcelo Coelho, a excelência na gestão permite que a Previ seja superavitária e garanta rendimentos a todos os beneficiários.
Carlos Mota