Mensagens endereçadas à senadora Teresa Leitão e ao senador Humberto Costa, ambos do PT de Pernambuco, deram início ao diálogo com a sociedade civil sobre o projeto de lei que restabelece a cota de tela nas salas de cinema em todo o país, expirada há dois anos.
Os parlamentares foram citados pelo cineasta Kléber Mendonça Filho numa série de mensagens nas redes sociais em que o diretor detalha a importância de o país garantir espaço para exibição da produção audiovisual nacional com o objetivo de, entre outros benefícios, fortalecer a identidade nacional e a democracia.
A cota para salas de exibição será tratada em projeto de lei específico, conforme ficou acertado na semana passada, quando o Senado concluiu a análise da proposta (PL 3696/2023) que prorroga por 15 anos a cota para TVs por assinatura, cuja validade termina em 12 de setembro. O texto ainda precisa ser aprovado pela Câmara dos Deputados.
“Falo aqui como cineasta brasileiro que observou o abandono dessa proteção estratégica do produto nacional, já que estamos sem a cota de tela para salas de cinema há dois anos. Esse retrocesso tem as marcas inconfundíveis dos governos Temer e Bolsonaro, e fez parte do pacote de ataques desses dois governos à cultura e ao mercado audiovisual do nosso próprio país”, afirmou o cineasta, que dividiu o texto em 16 mensagens em sequência, cada uma ilustrada com a imagem de um filme nacional que marcou época, como “Pixote”, “Bye Bye Brasil”, “Cidade de Deus” e “Minha Mãe é uma Peça”.
Ao comentar o post, Humberto Costa assumiu o compromisso de atender as demandas do setor, incluindo a cota de tela nos cinemas. O senador foi relator do texto que prorroga as cotas nas TVs por assinatura.
“Entendo sua preocupação e quero dizer que estamos trabalhando para mudar este cenário”, afirmou Humberto. “Conseguimos uma importante vitória para o audiovisual. Fui o relator da proposta que prorroga cota de tela para TV paga até 2038. Agora, estamos trabalhando na proposta da cota de tela para o cinema. Vamos elaborar um projeto específico que vai incorporar outras demandas do setor”, assegurou o senador.
Teresa Leitão também se comprometeu a apoiar o novo texto, que ainda não foi apresentado. “Agradeço o seu honroso comentário sobre minha posição no projeto Cota de Tela. Essa é uma luta nossa. Se já era, depois de assistir ‘Retratos Fantasmas’, mais ainda. Obrigada e conte comigo. Viva o cinema nacional!”, exclamou a senadora, em referência ao recém-lançado filme de Mendonça Filho, também diretor de “Aquarius” e “Bacurau”.
Diversidade cultural
“Até hoje, não consegui entender como dois governos tentaram secar a indústria cultural brasileira, o audiovisual em especial. Dois governos que se afirmavam como patriotas e nacionalistas”, continua o cineasta. “Nesse momento de reconstrução, precisamos, com a ajuda de pessoas públicas como vocês [Teresa e Humberto], retomar esse mecanismo de defesa da diversidade nas telas brasileiras, nas salas de cinema e na televisão. Isso é para agora”, adverte.
Depois de lembrar que a reserva de espaço para exibição de filme nacional remonta à década de 1930, Mendonça Filho cita que a regra é adotada em vários países, como França, Itália, Austrália, Portugal e Coreia do Sul.
“É um mecanismo regulatório que defende a diversidade cultural”, resume. “Cotas são uma consequência do direito à cultura da Declaração dos Direitos Humanos e do princípio da exceção cultural. Por esse princípio, os produtos culturais não devem ser submetidos às mesmas regras do comércio dos outros produtos, pois está em jogo a identidade cultural de um país.”
O cineasta também aponta a concorrência desleal praticada por distribuidoras de filmes estrangeiros. “Garantir espaço para a nossa produção nas salas e TVs é também essencial numa época onde vemos o produto estrangeiro ter passe livre para ocupar a programação cultural de forma desigual e predatória. É a proteção de um cenário desigual”, aponta.
“Os grandes filmes de bilheteria mundial devem fazer parte das nossas escolhas nas salas de cinema, mas de forma organizada, com espaço regulado para outros filmes. É com a diversidade de oferta, incluindo obras brasileiras, que o público terá a oportunidade de escolher”, conclui.