Gleisi: minha luta aqui e agora é pela restauração da dignidade do nome de meu companheiro, duramente atingida pelas precipitações do noticiárioA prisão do ex-ministro Paulo Bernardo, marido da senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), foi uma clara tentativa de humilhar um integrante dos governos Lula e Dilma. Foi, ainda, uma tentativa de abalar um grupo crescente de senadores que discordam dos argumentos que vêm sendo usados para afastar uma presidenta legitimamente eleita por 54 milhões de votos. Essa é a visão da senadora petista sobre a operação “Custo Brasil” – que ela classificou como ‘operação espetáculo’.
“A operação montada para a busca e apreensão em nossa casa e para a prisão do Paulo foi surreal. Até helicópteros foram usados, força policial armada, muitos carros! Pra que isso? Chamar atenção? Demonstração de força? Humilhação? Gasto de dinheiro público desnecessário, é isso!”, alertou a petista, em discurso ao plenário nesta segunda-feira (27).
Bastante emocionada, Gleisi lembrou os momentos constrangedores a que sua família foi submetida – inclusive com a apreensão do computador de um dos seus filhos. Para ela, cenas como essas serão feridas levadas pelo resto da sua vida.
“Minha indignação é profunda e sincera. Nossa família não mereceu de forma alguma o tratamento recebido de um braço do Estado do qual fazemos parte – e que ajudamos, com nosso trabalho como senadoras e senadores, a aperfeiçoá-lo, a torná-lo mais eficiente, mais justo e mais humano”, disse.
E não acharam nada
Mesmo após vasculharem incessantemente a casa da parlamentar, os policiais não encontraram nada incriminador. A parlamentar destacou que não há nada que incrimine o seu marido Bernardo, além de delações que os advogados de defesa desconhecem completamente. “Aliás, delações feitas sob a tutela de um só advogado, Figueiredo Bastos, que atendendo a vários clientes sempre dá um jeito de fechar as versões que pretende. Nunca é demais lembrar que este senhor tem militância política e exerceu cargo de confiança no governo do Paraná”, emendou.
Gleisi apontou diversas irregularidades da operação policial – que só teve a intenção de ser um espetáculo midiático, com aviso prévio à imprensa, que compareceu ao local com helicópteros e câmeras. “Por que a iniciativa judicial vinda de São Paulo, assinada por um juiz que foi orientando da mesma advogada de acusação [Janaina Paschoal] que assina o pedido de impeachment, priorizou a desmoralização pública por meio do show midiático em todos os meios de comunicação? Por que uma iniciativa judicial visa obter efeitos tão perversos? A quem interessa uma iniciativa como esta?”, questionou.
A senadora disse ainda estar “serena e humilde – mas não humilhada” e afirmou que a inocência de seu marido será provada. Isso porque, segundo Gleisi, não há contrato do Ministério do Planejamento com a tal Consist, nem vínculo do então Ministro do Planejamento com o convênio celebrado entre a empresa e a associação dos bancos, que estão nas alegações que desencadearam a operação de cunho midiático.
“Eu o conheço. Jamais se utilizaria de artimanha como esta. […] Minha luta aqui e agora é pela restauração da dignidade do nome de meu companheiro, duramente atingida pelas precipitações do noticiário”, declarou.
Ela ainda aproveitou para agradecer às inúmeras manifestações de solidariedade recebida após a operação, especialmente a bancada de senadores e senadoras do PT e do campo progressista. Gleisi se dirigiu ainda a seus eleitores, pedindo desculpas por não poder falar pessoalmente a cada um e cada uma, explicando que nada foi feito errado por seu marido.
Leia, abaixo, o discurso de Gleisi na íntegra:
Vivemos momentos difíceis para a democracia e para a política no Brasil. É um teste sem precedentes na nossa história, que vai experimentar a força de nossas instituições e a maturidade política do povo brasileiro.
Faço política desde a adolescência. Acredito nela como instrumento de transformação. Foram as ideias cristãs de igualdade, solidariedade que me impulsionaram na luta pública. Por que um mundo tão desigual? Por que tantas diferenças? Um novo mundo é possível! É preciso lutar por ele! Pessoas com esperança estão sempre na caminhada.
O PT entrou na minha vida, ou eu entrei na vida dele, em 1989, quando apoiei Lula no segundo turno das eleições. No primeiro apoiei Brizola, pra mim um libertário antes de tudo.
A teologia da libertação, as comunidades eclesiais de base, a igreja progressista, o socialismo como referência. Isso tudo tinha a ver com o que eu pensava e a forma como queria agir. Pronto, o PT era o partido no qual queria militar.
Lá se vão 26 anos de vida partidária. Muitas emoções, muitas conquistas e, com certeza, o ponto alto, as eleições presidenciais de 2002. Uma vitória única, que trazia a possibilidade de fazer mudanças concretas na vida do povo. E o fizemos.
Vencer a fome e a miséria, investir na educação, proporcionar empregos, investir em infraestrutura, reposicionar o Brasil no mercado externo e na geopolítica não é pouco resultado para 14 anos de governo.
Mas é claro que com as conquistas também vieram os erros, os equívocos. Muitos dos quais pressionados pelos que desejam a manutenção do “status quo”, ciosos por não perderem espaço e garantias. As composições políticas, o pragmatismo cotidiano, as apostas erradas hoje cobram seu preço.
É com muita dor que venho a essa tribuna hoje. Dor na alma, no coração. Dor pelo que aconteceu na última quinta-feira, por erros e equívocos na nossa história, pelas injustiças semeadas ao longo do caminho.
Acredito que todos os que se encontram no plenário e nos acompanham pelas mídias, sabem de antemão sobre o que falarei hoje. Nem em pesadelos eu teria sido capaz de supor que estaria aqui, nesta tribuna, pra defender meu marido, pai dos meus filhos e meu companheiro de caminhada política, de uma prisão. Prisão injusta, ilegal, sem fatos, sem provas e sem processo.
Mas, aqui estou para apontar uma injustiça, sentindo na própria pele o que aflige diariamente milhares de pessoas, homens e mulheres, atingidos pelo abuso do poder legal e policial. Aqui estou, serena e humilde, mas não humilhada.
A prisão de Paulo Bernardo, foi um despropósito do princípio ao fim. Prisão preventiva? Prevenir o que? Um processo iniciado em meados de 2015, sem nenhuma diligência feita, nenhuma oitiva realizada, mesmo por diversas vezes ter ele solicitado para depor? Qual risco oferecia meu companheiro à ordem pública? À instrução processual? À aplicação da lei? Sempre esteve à disposição das autoridades, em endereço conhecido, há mais de dois anos não ocupa nenhum cargo público, é aposentado pelo Banco do Brasil, depois de 38 anos de contribuição previdenciária.
Conheço o Paulo há muitos anos. Sei de suas virtudes e de seus defeitos. Sei especialmente o que não faria. E não faria uso de dinheiro alheio para benefício próprio. Não admitiria desvios de recursos públicos para sua satisfação ou da família. Tenho certeza de que não participou ou se beneficiou de um esquema como o que estão acusando-o. Ele sabe que eu nunca o perdoaria. Que sua mãe não o perdoaria!
O patrimônio que construímos ao longo de nossa vida nem de perto chega ao que estão acusando-o de ter se beneficiado. São dois imóveis adquiridos antes de 2004 e um, no qual moramos em Curitiba, adquirido em 2009, financiado junto ao Banco do Brasil, em 20 anos. É uma dívida, mais que do que um patrimônio, constantes das declarações de imposto de renda.
A imprensa noticiou nosso apartamento como uma grande cobertura. O condomínio tem 160 apartamentos, com vários prédios pequenos. O que dizem ser cobertura é o último apartamento, no oitavo andar, um pouco maior que os demais. É confortável, jamais luxuoso.
A operação montada para a busca e apreensão em nossa casa e para a prisão do Paulo foi surreal. Até helicópteros foram usados, força policial armada, muitos carros! Pra que isso, chamar atenção? Demonstração de força? Humilhação? Gasto de dinheiro público desnecessário, é isso!
Foi uma clara tentativa de humilhar um ex-ministro nos governos Lula e Dilma, que colheu muitos elogios no exercício de seu cargo. É também uma tentativa de abalar emocionalmente o trabalho de um grupo crescente de senadores que discordam dos argumentos que ora vêm sendo usados para afastar uma presidenta, legitimamente eleita por mais de 54 milhões de votos.
O que vemos é a mesma e repetida seletividade que vem marcando decisões do Ministério Público e de juízes que promovem carnavais midiáticos contra alguns políticos, ao mesmo tempo em que protegem e retardam decisões de outros, sobre os quais há provas mais do que suficientes para uma ação contundente, definitiva.
Minha indignação é profunda e sincera. Nossa família não mereceu de forma alguma o tratamento recebido de um braço do Estado do qual fazemos parte – e que ajudamos, com nosso trabalho como senadoras e senadores, a aperfeiçoá-lo, a torna-lo mais eficiente, mais justo e mais humano. Cada qual à sua maneira, de acordo com sua cor partidária e com suas próprias ideias, mas sempre em busca do melhor para a nossa gente.
O endereço particular e o estado civil desta senadora são conhecidos pela Polícia Federal de Brasília e do Brasil. Todos aqui sabem que meu marido sempre se colocou à disposição da justiça para responder às falsas acusações que lhe foram feitas. Todos que nos conhecem sabem
dos nossos hábitos, do nosso padrão de vida, dos bens que conquistamos após décadas de muito trabalho e dedicação.
Por essa razão, o cerco policial por terra e ar de nossa casa e a ordem judicial para entrar em nosso apartamento teve a clara intenção de constranger não só a mim, mas a todos os moradores, como se a intenção principal fosse mostrar sua onipotência contra cidadãos desarmados.
Não estou aqui a reclamar o respeito como parlamentar com mandado popular e prerrogativa de foro, sobre o qual, aliás, já me manifestei contrária e assinei uma Proposta de Emenda Constitucional para extingui-lo. Mas o respeito com que qualquer mulher ou homem deve ser tratado por agentes de estado, principalmente os que exercem a função policial.
Nas remexidas em minha casa, sequer o computador que meu filho adolescente utiliza em seus trabalhos escolares foi poupado. Agora, é prova de processo criminal. Senti naquele momento todo o mal que pode causar o controle de segmentos do Estado sem limitações. Tentei impedir. Disseram que iriam devolvê-lo no mesmo dia. O que não aconteceu. Buscavam achar dinheiro? Cofres? Documentos que pudessem nos incriminar? Não acharam nada, nada! O que provavelmente tenha frustrado a operação espetáculo.
O terror a que foi submetida minha família não estava presente apenas na entrada de estranhos em nossa casa. O terror continuaria ainda durante boa parte do dia, com Paulo sendo levado de aeroporto em aeroporto, sempre com a presença de câmeras de tevê para transmitir ao vivo sua humilhação, a nossa impotência contra a violência, a nossa incapacidade de reação perante decisões meticulosamente anunciadas com o propósito prioritário de proporcionar um espetáculo midiático, sem confirmação de provas ou indícios concretos que deveriam constar dos
autos.
Ao longo de um dia inteiro eu e meus filhos fomos submetidos ainda a outra tortura da era moderna – a da transmissão ao vivo da prisão de uma pessoa querida contra o qual não existe prova de transgressão. Sim, a tortura atualmente é prender antes, sem provas e só soltar se a pessoa falar algo que seja do interesse dos investigadores.
Nada incrimina meu marido, além de delações que os advogados de defesa desconhecem em sua totalidade e que desconhecemos em quais condições foram ditas. Aliás, delações feitas sob a tutela de um só advogado, Figueiredo Bastos, que atendendo a vários clientes sempre dá um jeito de fechar as versões que pretende. Nunca é demais lembrar que este senhor tem militância política e exerceu cargo de confiança no governo do Paraná.
Nada disso pesou para o juiz de primeira instância que ordenou a invasão policial de minha casa.
Eu pergunto, caras colegas, caros colegas: O que aconteceu com a isenção que se exige da justiça? Por que humilhar um cidadão pacato e conhecido? Por que pré-condenar em praça pública antes do julgamento? Por que a iniciativa judicial vinda de São Paulo, assinada por um juiz que foi orientando da mesma advogada de acusação que assina o pedido de impeachment, priorizou a desmoralização pública por meio do show midiático em todos os meios de comunicação? Por que uma iniciativa judicial visa obter efeitos tão perversos? A quem interessa uma iniciativa como esta?
Peço para que todos reflitam bastante sobre essas perguntas. Repito, estou aqui serena e humilde – mas não humilhada – para dizer que a inocência de Paulo Bernardo será provada. Eu o conheço. Jamais se utilizaria de artimanha como esta.
Não há contrato do Ministério do Planejamento com a tal Consist, nem vínculo do então Ministro do Planejamento com o convênio celebrado entre a empresa e a associação dos bancos. Além disso o próprio TCU, em acórdão de 2013, afirmou que o acordo com a associação dos bancos era regular e dispensava licitação. Se o Paulo participou de alguma armação criminosa, onde está seu produto? Para onde foi o dinheiro? Em que foi gasto? Volto a repetir: não temos conta no exterior, quase não viajamos, não somos dados a festas e badalações, nosso patrimônio é compatível com nossos salários. É um crime sem objeto, então?!
Minha luta aqui e agora é pela restauração da dignidade do nome de meu companheiro, duramente atingida pelas precipitações do noticiário. Sei que é uma cruzada difícil, inglória, contrariar a onda corrente.
Ainda não encontrei alívio pra a minha dor, pra dor dos nossos filhos, apesar do testemunho de amigos e companheiros que, mesmo na adversidade, não perdem a fé e ousam falar com coragem, o melhor instrumento de combate que temos.
Quero agradecer aqui, publicamente, minha bancada de senadores e senadoras, que na primeira hora me fez uma linda nota de solidariedade. Muito obrigada! Jamais esquecerei esse ato. Em nome dos senadores Paulo Rocha, Lindbergh Farias, Fatima Bezerra, Vanessa Grazziotin, que estiveram comigo nas primeiras horas, agradeço a todos os demais que manifestaram solidariedade e apoio, por telefone ou mensagem.
Agradeço também ao presidente do Senado, senador Renan Calheiros, e ao vice-presidente, senador Jorge Viana, pela pronta intervenção junto ao Supremo Tribunal Federal.
Agradeço as inúmeras manifestações de solidariedade que recebi de companheiros e companheiras, militantes, amigos, conhecidos e pessoas que me acompanham nas redes sociais.
Há situações e acontecimentos na nossa vida que são tão incompreensíveis, tão violentos e traumáticos que, como descreveu o poeta argentino Jorge Luiz Borges, vão ficar acontecendo de forma repetida para sempre. Esta será a marca da prisão de Paulo Bernardo na minha vida e na vida dos nossos filhos. São acontecimentos cuja natureza é de uma permanência que ultrapassa o tempo. Essa será a sequela que vamos para sempre carregar.
Além de impiedosa e injusta, uma prisão ilegal, abusiva e desnecessária. O processo é, por si, uma condenação definitiva que vale para sempre. Uma sentença irrecorrível. A foto de uma pessoa presa, em todos os jornais e tevês, repetidas inúmeras vezes, durante dias e dias, não se apaga. A absolvição, quando vier, não terá jamais a mesma força.
Nós, os que somos lançados nesses processos, precisaremos ser absolvidos depois, todos os outros dias de nossa vida. Ou desertamos e nos refugiamos no anonimato ou teremos de passar a vida nos defendendo, pedindo sempre a todos a nossa nova absolvição.
É com essa clara e terrível percepção que enfrento esse julgamento, com a triste certeza de que o processo manchou de modo injusto, definitivo e irrevogável, a minha vida pública e a vida do Paulo Bernardo.
A realidade é que os dados da acusação são ampla e multiplicadamente difundidos, mas a nossa defesa recebe atenção pequena e quase desapercebida. Ninguém vê.
Temos um passado de luta e de dificuldades. Não é do nosso feitio cometer infração de qualquer natureza, nem penal, nem eleitoral, nem fiscal. Nós temos vida de origem modesta. Paulo sempre lutou, estudou com dificuldades; teve de trabalhar cedo para ajudar os pais. Passou no concurso do Banco do Brasil, como vossa excelência, senador José Pimentel.
Não há justiça em um processo como o que estou vivendo ao lado de Paulo Bernardo. Mas se tivermos apenas um dever com o povo brasileiro, ele será o de considerar, para todos os efeitos práticos, o caráter absoluto da justiça, seu valor civilizatório absoluto.
Não é correta, nem justificável, uma prisão como esta. Não é certo para o Paulo, para o Pedro, para o José e para ninguém. Não é correto, porque este é um processo sem justiça. Os políticos sabem por experiência que tudo tem sempre um propósito. A quem interessa um processo sem justiça?
Eu acredito no Brasil, na sua capacidade de vencer os desafios e de crescer. Apesar de tudo, o País precisa caminhar. Com Justiça para todos.
Tenho imenso orgulho de ser política e de ser senadora da República. Procuro, sempre, honrar a escolha dos eleitores do meu Estado, do Paraná.
Desde pequena, sempre senti grande disposição para a vida pública, mas nunca manifestei apreço pela riqueza ou a fortuna. Por isso, o fato de ver meu nome associado a uma investigação sobre irregularidades e corrupção, é uma ironia cruel que me causa imensa dor e enorme pesar.
Com Paulo Bernardo, também ocorre situação semelhante. A vida, felizmente, continua tendo encantos. No caminho sempre podemos recolher bondades. Sou eternamente grata aos amigos de ontem que estão comigo. Eles são a luz que não deixa escurecer a vida. Sou grata aos que cruzaram o rio das diferenças e vieram aqui, na outra margem, me abraçar.
Finalmente quero registrar um abraço apertado aos que me desejam força, coragem e Justiça. Preciso mesmo de Justiça.
Muito obrigado aos que se solidarizaram comigo e com todas as pessoas da minha família. Tudo que tenho para oferecer de volta é a minha a amizade. Podem contar comigo. Hoje e sempre.