O endividamento das famílias brasileiras registrou em setembro a terceira queda consecutiva, segundo a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), da Confederação Nacional do Comércio (CNC), divulgada nesta quinta-feira (3/10). O índice caiu para 77,2%, menor que o registrado em agosto deste ano (78%) e em setembro de 2023 (77,4%). As pessoas que se consideram “muito endividadas” também diminuíram, representando 16,3%, o nível mais baixo desde dezembro de 2021.
O levantamento apurou também um aumento das dívidas em atraso e uma piora nas condições de pagamento, circunstâncias que atingem na maior parte famílias de maior renda e público masculino. As de classe média alta reduziram o endividamento, mas têm maior aumento da inadimplência. “Uma explicação é a possibilidade de os recursos não utilizados no crédito estarem sendo direcionados para apostas em cassinos online (N.R.: conhecidos como bets), que muitos vendem como investimentos, mas acabam gerando grandes perdas para seus usuários”, alertou o relatório.
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Esses dados vão ao encontro dos indicadores de uma outra pesquisa, feita pelo Instituto Data Senado e publicada nesta quarta-feira (2) pelo jornal Valor. Segundo o estudo, das 20,3 milhões de pessoas acima de 16 anos que revelaram ter apostado em maio e junho de 2024, 8,5 milhões (42%) se disseram endividadas. A maioria são homens (62%), com ensino médio completo (40%), com até 39 anos (56%) e atividade remunerada (68%).
Menor endividamento, maior atraso
Mesmo com menor endividamento, houve crescimento no percentual de famílias com débitos em atraso, o primeiro após três meses de estabilidade. Ainda assim, o número (29%) é menor do que setembro de 2023. O percentual dos consumidores que têm mais da metade dos rendimentos comprometidos com dívidas também segue em alta (20,4%), o maior desde junho de 2024.
“Os prazos mais longos das dívidas e menor endividamento não estão sendo suficientes para compensar a alta no nível de juros”, diz a análise da pesquisa, apontando que o perfil mais cauteloso do crédito e o impacto dos juros também foi percebido pelos consumidores na Intenção de Consumo das Famílias (ICF), da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC).
Cartão de crédito
O uso do cartão de crédito, principal meio de endividamento, teve retração de 1,8% em relação a setembro de 2023, sendo usado por 84,4% do total de devedores. Dentre eles, 30% declararam utilização para compras de alimentação e vestuário. Famílias que recebem até 10 salários mínimos mantiveram o patamar de gastos com o cartão. Por outro lado, as que possuem renda maior aumentaram seu uso em todos os tipos de despesas.
Embora tanto homens quanto mulheres tenham reduzido seus níveis de débito, o atraso nos pagamentos segue como um problema. “As mulheres conseguiram diminuir suas dívidas e têm se esforçado para regularizar contas atrasadas, enquanto os homens reduziram suas dívidas, mas viram as contas em atraso aumentar”, aponta o relatório. No entanto, ambos os grupos ainda enfrentam dificuldades para melhorar suas condições de pagamento.
Medidas contra a “farra das bets”
Já se sabe que as bets são uma das maiores causas do endividamento da população. Atento à falta de regulação desse setor, o governo federal abriu frentes de ação para impedir de “ter os cassinos funcionando dentro da cozinha de cada casa”, como destacou o presidente Lula na semana passada. Na última terça-feira (1), o Ministério da Fazenda divulgou os sites de apostas que poderão continuar a operar até o fim de 2024, avisando que novas regras serão estabelecidas a partir de 2025.
Além disso, um grupo de trabalho liderado pelo vice-presidente Geraldo Alckmin foi criado para combater o jogo compulsivo. Outras ações estão em andamento: a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão iniciou um processo para avaliar o impacto das apostas em pessoas em situação de vulnerabilidade, enquanto a Polícia Federal investiga possíveis esquemas de lavagem de dinheiro ligados a esse mercado.
Entre as propostas em estudo está a proibição do uso de cartões de crédito para pagamentos em plataformas de apostas e o monitoramento dos CPFs dos jogadores, visando identificar casos de vício ou práticas ilegais. No Congresso, a presidenta do PT e deputada federal Gleisi Hoffmann (PT-PR) apresentou um projeto de lei para proibir propagandas de bets, complementado por proposta do deputado Reginaldo Lopes (PT-MG).
A regulação desse mercado se torna cada vez mais essencial para reduzir o endividamento das famílias brasileiras.
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