Escola sem Partido é nova versão de valores impostos pela ditadura militar

Escola sem Partido é nova versão de valores impostos pela ditadura militar

Em artigo publicado no Novo Jornal, a senadora Fátima Bezerra (PT-RN) reforça a necessidade de combate ao movimento “Escola sem Partido”. A parlamentar acredita que não seja coincidência o avanço da ofensiva conservadora neste momento, quando o País vê a democracia ameaçada por uma tentativa de golpe de Estado.

“Derrotar o projeto ‘Escola sem partido’ é fundamental para conter a onda conservadora que tenta inundar a nossa sociedade. Não se trata de defender qualquer tipo de doutrinação nas escolas, mas o exercício do livre pensamento e da liberdade de ensino”, diz a senadora.

Veja, abaixo, a íntegra do artigo:

 

A educação como ato de amorFátima Bezerra

Projetos extremamente nocivos à educação brasileira tramitam na Câmara dos Deputados e no Senado Federal. Refiro-me ao PL 7180/2014, ao PL 867/2015 e ao PL 1411/2015, que tramitam na Câmara dos Deputados, mas também ao PLS 193/2016, que tramita no Senado Federal. Todos esses projetos se vinculam à ideologia do movimento “Escola sem partido”, que na verdade defende uma escola com partido único: ultraliberal na economia e ultraconservador no que diz respeito aos direitos humanos.

Trata-se de uma nova versão da educação moral e cívica, através da qual a ditadura civil-militar buscou sustentar seus valores e práticas, esvaziando o conteúdo crítico do currículo brasileiro e censurando o livre exercício do processo de ensino e aprendizagem. Aliás, o fato desta ofensiva conservadora estar sincronizada com o golpe de Estado em curso no Brasil não é mera coincidência. Quando o Estado Democrático de Direito é violentado, as correntes ultraconservadoras adormecidas se sentem à vontade para abandonar seus esconderijos e disputar os rumos da nação.

O projeto “Escola sem partido”, denominado pelos meus colegas professores como “Lei da Mordaça”, é apenas mais um sintoma do avanço do conservadorismo na sociedade brasileira, conservadorismo que é fomentado pela grande mídia empresarial, por um Congresso Nacional hegemonicamente conservador e por um governo ilegítimo, edificado sobre um golpe parlamentar que, se consumado, tende a anular todas as conquistas civilizatórias consagradas na Constituição de 1988.

Não é por acaso que estamos testemunhando atentados contra as sedes de partidos progressistas; agressões físicas contra militantes de esquerda; violência arbitrária e gratuita contra gays, lésbicas, travestis, bissexuais e transexuais; estupros coletivos; militarização das escolas; criminalização geral e irrestrita da política.

Derrotar o projeto “Escola sem partido” é fundamental para conter a onda conservadora que tenta inundar a nossa sociedade. Não se trata de defender qualquer tipo de doutrinação nas escolas, mas o exercício do livre pensamento e da liberdade de ensino, consagrada no artigo 206 da Constituição Federal e no artigo 3° da Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Não se trata de defender uma suposta ideologia de gênero, mas de educar para a cidadania, para o respeito às mais diversas identidades de gênero e orientações sexuais. Não se trata de defender a partidarização do currículo, mas de promover a formação de sujeitos críticos, capazes de se posicionar diante da realidade que os cerca.

Juristas como Lenio Streck, Nina Beatriz Ranieri, Daniel Sarmento, Pedro Estevam Serrano e Marcus Vinícius Furtado Coêlho já se posicionaram contra a proposta. Para Furtado Coêlho, além de se tratar de um projeto inconstitucional, seria “desumano exigir que o professor seja um autômato dentro da sala de aula”.

Já o professor Leandro Karnal (UNICAMP) considera que “a demonização da política é a pior herança da ditadura militar, que além de matar seres humanos, ainda provocou na educação um dano que vai se arrastar por mais algumas décadas”.

 

Estamos em pleno século XXI, mas parece que retornamos ao século XIX, pois ainda há quem defenda jornada de trabalho de 80h semanais, escola sem pluralismo e governo sem voto. Em homenagem ao legado de Paulo Freire, Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro, lutaremos com todo nosso empenho em defesa da pedagogia da autonomia, da liberdade de ensino e da educação como ato de amor.

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