Violência ampliada

Especialistas: mais armas ampliam riscos de feminicídio

Atlas da Violência mostra que mais da metade dos assassinatos de mulheres, em 2016, foi praticado com armas de fogo
Especialistas: mais armas ampliam riscos de feminicídio

Foto: Reprodução

Em 2016, 4.645 mulheres foram assassinadas em todo o Brasil — uma média de 12,69 casos por dia, de acordo com os dados do Atlas da Violência, estudo anual realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Quase metade desses crimes foram praticados com armas de fogo.

Para especialistas, a liberalização das regras para a posse de armas deve contribuir para o aumento dos casos de mortes de mulheres no Brasil. “Se, hoje, há casos em que as mulheres sobrevivem à tentativa de feminicídio é, em larga medida, porque o instrumento de violência foi a força física ou outros instrumentos com mais baixa letalidade, como facas ou cordas”, aponta a antropóloga Débora Diniz, professora da Universidade de Brasília.

Violência mais letal

Em caso de uso de armas de fogo, “as chances de uma mulher sobreviver são muito mais raras”, alerta a antropóloga.

“Se um homem já tem histórico de agressão à sua companheira, havendo arma de fogo dentro da residência no momento mais grave de explosão, quem vai utilizar essa arma é o agressor”, reforça a delegada da Mulher de Juiz de Fora (MG), Ione Barbosa. Uma simples discussão pode ter final trágico, alerta: “Ainda que o agressor não tenha histórico violento, muitos casos acontecem no calor do momento”.

Em artigo escrito em parceria com a cientista política argentina Giselle Carino e publicado no jornal El País, a antropóloga Débora Diniz lembra que embora os homens morram mais do que mulheres por homicídio em todo o planeta, a América Latina é a região do mundo em que as mulheres mais morrem nas mãos de maridos, namorados, pais ou filhos.

Armas intimidam denúncias

A delegada Ione Barbosa aponta mais um elemento grave que a liberalização da posse de armas acrescentará ao caldeirão da violência doméstica: a presença dessas armas de fogo nos  lares vai contribuir para intimidar a denúncia de abusos e violências.

“Sabendo que o companheiro tem uma arma dentro de casa, como essa mulher terá coragem de denunciá-lo? Ela teme pela sua vida e não quer ser morta”, avaliou a delegada em entrevista ao jornal Tribuna de Minas.

O feminicídio é considerado a última etapa do ciclo da violência. Em geral, ocorre após a mulher sofrer outros tipos de agressões, dizem os estudiosos do tema.

Armas não defendem mulheres

Os especialistas também desmontam a falácia dos defensores do liberou geral das armas segundo a qual essa seria uma alternativa para que mulheres se defendam das agressões domésticas ou estupros.

As mulheres, lembra a advogada criminalista Stela Valim, têm menor (ou nenhuma) autonomia financeira, “o que muitas vezes é um dos motivos que a impede de sair de uma situação de violência doméstica. Se ela não consegue sair de casa porque ainda não consegue bancar a si mesma e aos filhos, comprar uma arma vai ser prioridade? Claro que não.”

Em entrevista ao site jornalístico Huffington Post Brasil, a presidente da Associação de Advogadas pela Igualdade de Gênero ressalta que o tipo de violência ao qual majoritariamente as mulheres estão submetidas ocorre em situações domésticas. Usar a arma para se defender ”é uma reação que se espera de quem está pensando no caso de um furto, roubo, em no que denominamos ‘crimes da rua, e não em crimes ‘de casa’”.

No Brasil, 70% dos estupros são cometidos por parentes, namorados ou amigos/conhecidos da vítima, revela o estudo “Estupro no Brasil: uma radiografia segundo os dados da Saúde”, publicado pelo Ipea em 2014.

 

Leia mais:
El País – Armas matam mulheres
BHAZ – Especialista acredita em aumento de feminicídios após decreto de armas
Huffpost Brasil – Decreto que flexibiliza posse de arma eleva risco de feminicídios no País
Tribuna de Minas – Delegada teme que, com armas em casa, mulheres terão menos coragem para denunciar maridos

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