A Comissão Mista sobre Mudanças Climáticas do Congresso Nacional promoveu audiência pública nesta quarta-feira, 5 de abril, para discutir o Acordo de Paris e as mudanças anunciadas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, na política ambiental americana. “É o mais importante acordo internacional e é do interesse a todos que vivemos neste planeta”, lembrou o presidente da comissão, senador Jorge Viana (PT-AC). A comissão também tratou das perspectivas para a COP23, que será realizada em Bonn, na Alemanha, em novembro. Especialistas avaliam riscos no cumprimento das metas para redução da emissão de gases poluentes.
A secretária da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC), Patrícia Espinosa, lembrou que 141 nações já ratificaram o Acordo de Paris. “É um número sem precedentes de países, ainda mais levando em conta que se passaram apenas 16 meses desde a assinatura do acordo”, disse. Ex-ministra das Relações Exteriores do México, Espinosa relembrou as rodadas de negociações entre os países nos últimos vinte anos, mas evitou se pronunciar sobre a iniciativa de Trump.
Ela se mostrou otimista quanto à política global de baixa emissão de carbono. “A transformação está em marcha, já começou e não vai se modificar, e isso não significa que teremos um processo sem sobressaltos, mas é importante registrar que essa é uma tendência claramente notável”, disse Patrícia Espinosa. Ela pediu que o Brasil possa “prontamente depositar seu instrumento de ratificação da emenda de Doha sobre o segundo período de compromisso do Protocolo de Kyoto, o que significaria ‘sinal poderoso’ para a continuidade de múltiplos projetos em fase de implementação”.
A diplomata lembrou que a maior parte das nações está empenhada no cumprimento das metas estabelecidas pelo Acordo de Paris, firmado em 2015 por 195 países. O acordo estabelece como meta a redução da temperatura global a menos de 2ºC. Há temores entre especialistas de que as metas estejam ameaçadas por conta da guinada na política ambiental promovida por Trump.
Energia limpa
O presidente dos Estados Unidos deve anunciar em maio se o país permanecerá no Acordo de Paris. Em março, Trump revogou o Plano de Energia Limpa criado por seu antecessor na Casa Branca, Barack Obama, alegando que era necessário criar empregos para reativar a indústria do carvão. Com o gesto, suas intenções de atingir os compromissos assumidos por Obama no Acordo de Paris foram questionadas.
O embaixador José Antônio Marcondes de Carvalho, subsecretário-geral de Meio Ambiente do Itamaraty, disse que o Brasil vem avançando na política de redução da emissão de gases de efeito estufa. “O Acordo de Paris é um grande desafio porque há uma pressão das sociedades civis das nações para avançarmos nos compromissos assumidos perante o mundo”, disse. Em sua avaliação, a saída do Reino Unido da Comunidade Européia, o novo governo norte-americano e as eleições em alguns países europeus poderão mudar o “perfil de ação” na implementação do Acordo de Paris.
Também estiveram presentes na comissão, o ambientalista Alfredo Sirkis, diretor-executivo do Centro Brasil no Clima; o professor Eduardo Viola, do Instituto de Relações Internacionais da UnB, e André Costa Nahur, coordenador do Programa de Mudanças Climáticas e Energia do WWF-Brasil e membro do Comitê de Coordenação do Observatório do Clima.
Efeitos
Ex-deputado federal pelo Partido Verde do Rio de Janeiro, Sirkis disse que a mudança climática já está afetando as populações de todo o mundo. “Ficou muito claro que, com um grau apenas, o ecossistema planetário está fortemente alterado”, disse. “Esse aumento não é matemático, é exponencial. Dois graus, que é a meta que nós desesperadamente perseguimos, já é um horizonte absolutamente assustador no período de vida dos nossos netos”.
Ele disse que o Brasil é responsável por 2,5% das emissões de gases de efeito estufa, e foi o país que mais reduziu suas emissões. Apesar disso, Sirkis considera “gravíssimo” o corte de 51% no orçamento do Ministério do Meio Ambiente anunciado pelo governo Temer. Ele avalia que a medida vai prejudicar a retomada do combate ao desmatamento da Amazônia, que subiu para quase 8 mil quilômetros quadrados, com redução de 30% nos últimos três meses, de acordo com o próprio Executivo.
Representante do Observatório do Clima, que reúne mais de 35 organizações da sociedade civil, André Costa Nahur disse que o mundo está entrando em uma era de incerteza climática. “O aumento de temperatura e eventos extremos já ocorrem, e há processos silenciosos, com alterações que irão provocar impacto a longo prazo”, comentou.
O professor Eduardo Viola, disse que o mundo assiste a um conflito entre a tecnologia e o nacionalismo, contrário à globalização. “As forças da globalização econômica são muito mais profundas que as forças nacionalistas. Estamos muito longe da década de 30, comparar é ignorar gigantescas transformações tecnológicas e de dependência”, lembrou.
Antes do encerramento do debate, Jorge Viana comunicou a aprovação do plano de trabalho do colegiado para 2017, que prevê a realização de audiências públicas sobre o tema. O plano receberá sugestões e aperfeiçoamentos nos próximos 30 dias na comissão, que tem como relator o deputado Sérgio de Souza (PMDB-PR).